quinta-feira, 29 de agosto de 2013

STF rejeita por maioria os recursos do ex-ministro José Dirceu
Mais cedo, ministros acolheram de forma parcial embargos de declaração do publicitário Cristiano Paz, ex-sócio de Marcos Valério, para fazer pequena correção no acórdão
Ao analisar os recursos de João Claudio Genú, ex-assessor parlamentar do PP, o ministro Luís Roberto Barroso pediu vistas e adiou a decisão para a semana que vem
Bruno Góes, Cibelle Brito e Cristina Tardáguila - O GloboO presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa Foto: André Coelho/ O Globo
O presidente do STF, ministro Joaquim BarbosaAndré Coelho/ O Globo
RIO - Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitaram por maioria na tarde desta quinta-feira os embargos de declaração apresentados à Corte pelo ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, condenado no julgamento do mensalão e considerado o mandante do esquema de compra de apoio parlamentar no governo do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva. Fica assim mantida em dez anos e dez meses de prisão mais multa de R$ 676 mil a pena aplicada ao ex-ministro.
Na mesma sessão, os magistrados acolheram parcialmente os recursos do publicitário Cristiano Paz, ex-sócio de Marcos Valério, reconhecendo a existência de um pequeno erro material na transcrição do acórdão (texto que reúne todos os votos proferidos no julgamento do ano passado). Neste caso, a Corte solicitou que o texto fixe de forma definitiva a pena de prisão que havia sido imposta a Paz em 25 anos, onze meses e vinte dias mais multa de R$ 2,53 milhões.
Ao avaliar os recursos de João Claudio Genú, a Corte chegou a rejeitar os embargos por maioria, mas o ministro Luís Roberto Barroso pediu vistas do caso para selecionar um questionamento em relação à pena aplicada ao ex-assessor parlamentar. Com isso, a decisão sobre seus recursos ficou para a próxima semana.
Os ministros rejeitaram os embargos por maioria, sendo parcialmente vencidos os ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio de Mello.
Debate sobre pena de Dirceu
Durante a votação, Toffoli foi o primeiro a abrir divergência, acolhendo parcialmente os recursos de Dirceu. Deu razão ao réu no ponto em que ele enxergou problema na fixação da pena de formação de quadrilha, que teria sido agravada duas vezes pelo mesmo motivo e estabelecida em dois anos e onze meses. Em seu voto, Toffoli propôs que a pena de formação de quadrilha fosse revista para 2 anos, 5 meses e 22 dias de reclusão, ou seja, seis meses a menos do que o previsto no acórdão.
— A meu ver, tenho neste ponto que as circunstância que justificaram a valoração negativa guarda assimetria aos motivos que levaram a agravação da pena — defendeu Toffoli.
O ministro Ricardo Lewandowski seguiu o mesmo caminho:
— A corte elevou (a pena por formação de quadrilha) em 75% do intervalo possível. O que não se mostra razoavél nem proporcional. A meu ver configura um claro erro — destacou Lewandowiski. — Tendo em vista essas distorções todas e as dúvidas, vou me filiar à divergência.
O ministro Marco Aurelio Mello foi o terceiro a enxergar a suposta falha na dosimetria. Ao votar, destacou que a majoração da pena de quadrilha ficou em cerca de 75% enquanto a dos demais crimes de Dirceu em torno de 25%.
Joaquim Barbosa pediu a palavra e se posicionou contrariamente:
— Dirceu se valeu de sua posição de proeminencia — disse ele. — Essa posição de força no plano partidário, político e adminstrativo foi fundamental para a outorga de cobertura política aos integrantes da quadrilha — destacou ele, defendendo a manutenção da pena imposta a Dirceu no ano passado.
O ministro Celso de Mello somou-se ao presidente do STF, rejeitando os embargos num discurso inflamado.
— Aqui não se está a empregnar a atividade política, mas a punir aqueles que, como o ora embargante, não conseguiram fazê-lo com integridade e honestidade — disse ele. — Ao contrário do que se busca afirmar, o STF ateve-se com absoluta fidelidade a seu próprio magistério jurisprudencial. Não há nem houve nada de novo na discussão desse tema.
Para o ministro, os réus do mensalão agiram como “conspiradores”, “à sombra” e que aqueles que foram condenados por formação de quadrilha ameaçaram “a paz pública”.
— A conduta desse réu voltou-se contra a própria ordem democrática — afirmou ele sobre Dirceu.
Considerado o mandante do esquema de compra de parlamentares, Dirceu foi condenado a dez anos e dez meses de prisão mais multa de R$ 676 mil pelos crimes de corrupção ativa e formação de quadrilha. Homem forte do governo Lula e do PT, Dirceu era quem dava ordens para o pagamento de propina a parlamentares em troca de apoio em votações no Congresso Nacional. Dessa forma, garantia uma base aliada fiel ao governo federal.
Análise da FGV
Enquanto assistiam ao julgamento do mensalão com O GLOBO, a equipe de especialistas da Fundação Getúlio Vargas (FGV) fez os seguintes comentários:
“O ministro Dias Toffoli rejeitou a maioria dos embargos de José Dirceu, mas reconheceu um dos argumentos apresentados pela defesa. O STF teria utilizado o argumento de que José Dirceu coordenava e tinha papel proeminente na organização da quadrilha para aumentar a pena na primeira fase da dosimetria. Posteriormente, o STF teria usado o mesmo motivo para aumentar a pena de José Dirceu de acordo com um agravante previsto no Código Penal para quem promove ou dirige a atividade criminosa. Como o Direito não admite o aumento da pena duas vezes pelo mesmo motivo, o STF deveria abrir mão do aumento na primeira fase para aplicar apenas o agravante. Assim a pena cairia de 2 anos 11 meses para 2 anos e 4 meses.
O ministro Joaquim Barbosa explicou que não se trata do mesmo motivo sendo usado para duas finalidades diferentes. Na primeira fase, o tribunal teria levado em conta o papel proeminente que José Dirceu tinha no governo federal - ou seja, a sua posição pública na vida política do país. Na segunda fase, em contraste, o fator considerado foi o papel proeminente que ele teria no funcionamento da quadrilha, isto é, o seu papel interno. Não há ligação necessária entre as duas coisas - o réu pode ser um ativo dirigente da quadrilha, sem ocupar posição pública de destaque, por exemplo. Dessa forma, segundo o ministro Barbosa, não teria havido a dupla utilização do mesmo conjunto de fatos na fixação da pena neste ponto. A posição de Barbosa prevaleceu. Foram vencidos Toffoli, Lewandowski e Marco Aurélio”.
Os embargos de Cristiano Paz
Em seus recursos, Paz pediu que fosse anulada a publicação do acórdão, alegando que o documento suprimia alguns trechos dos debates. Paz reclamou também de uma suposta falta de proporcionalidade entre as multas e as penas de reclusão que lhe foram aplicadas.
Os ministros reconheceram a existência de um pequeno erro material no acórdão e solicitaram a retificação da informação. A mudança, no entanto, não altera nem a pena de prisão — de 25 anos, 11 meses e 20 dias — nem a multa de R$ 2,53 milhões que foram aplicadas a Paz pelos crimes de corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.
Ex-sócio de Marcos Valério e Ramon Hollerbach, Cristiano Paz assinou os empréstimos simulados e os documentos contábeis considerados fraudulentos no processo do mensalão. Também firmou cheques no valor de R$ 326.660 que beneficiaram o ex-diretor de marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato.
Os embargos de Genú
Em seus recursos, João Claudio Genú pediu a nulidade do voto do ex-ministro Ayres Britto, a alegação de omissão do voto do ministro Gilmar Mendes e a revisão na dosimetria das penas. Ele também enxergou vícios em votos vogais.
Os embargos de declaração serão analisados por Barroso, e a Corte só se posicionará de forma definitiva na semana que vem.
Genú foi assessor do ex-líder do PP na Câmara José Janene, já falecido. Recebia pessoalmente no Banco Rural os recursos do valerioduto destinados ao partido. O STF refutou o argumento da defesa de que ele cumpria ordens e que não sabia que o dinheiro era ilegal. O papel de Genu era maior, tendo participado de reuniões com Valério para acertar os repasses de recursos ao PP. Por isso foi condenado a cinco anos de prisão por lavagem de dinheiro e ao pagamento de 200 dias-multa.
Balanço
Depois de seis sessões plenárias, o Supremo já julgou os embargos de declaração de 20 condenados na ação penal 470. Acolheu parcialmente dois deles — os de Enivaldo Quadrado, que teve pena de prisão trocada por serviços comunitários mais multa, e os de Marcos Valério, que teve o valor da multa fixado em R$ 3,06 milhões, no lugar dos valores que apareciam de forma equivocada no acórdão.
Ainda precisam ser analisados os recursos movidos pela defesa de Genú, do deputado João Paulo Cunha (PT-SP), do advogado Rogério Tolentino, do dono da corretora Bônus Banval, de Breno Fischberg, de Henrique Pizzolato, funcionário de carreira do Banco do Brasil, e do ex-presidente do PP Pedro Corrêa.
Na atual fase de apreciação dos recursos, a maioria dos integrantes da Corte já indicou que não vai rediscutir condenações (que apenas poderá corrigir erros cometidos em casos de obscuridade ou contradição do acórdão). Após a análise de todos os embargos de declaração, aí sim haverá esta possibilidade, caso os embargos infringentes sejam aceitos.

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