França sente saudades dos tempos gloriosos
Francisco G. Basterra - El País
Uma França menor, superada pela Alemanha, que está prestes a passar pelas urnas sem encontrar na política um horizonte que reconforte os franceses, convencidos de ser vítimas da globalização e de uma Europa à deriva. O segundo país da UE e a quinta potência econômica mundial não se livrou da crise existencial que arrasta há tempo. O que a França quer ser? A estadista, protegida, conservadora, que não deseja perder o adquirido, temerosa das reformas, com um Estado que dispõe de 56% da riqueza nacional, ou uma nação criativa, aberta ao mundo, mais competitiva embora menos segura?
Ainda sente saudade dos "Trente Glorieuses", as três décadas felizes e prósperas transcorridas desde o final da última Guerra Mundial, que nem mesmo foram empanadas pelos acontecimentos de maio de 1968. Os tempos em que a França, nas palavras de Charles de Gaulle, o fundador da Quinta República, tinha "uma certa ideia de si mesma", a França da grandeza.
O mal-estar é a mistura de uma nostalgia do passado que não voltará e a incerteza diante do futuro derivada da certeza de que os filhos não terão as mesmas oportunidades que seus pais. A França, apesar de um déficit público de 90% do PIB, ainda oferece um nível invejável de vida a seus cidadãos. Com um problema: seu modelo de bem-estar social é sueco, mas o país não cria riquezas suficiente para pagá-lo.
É insustentável, mas resiste a fazer as reformas necessárias para adequá-lo à realidade, com uma fiscalidade também nórdica. O economista Jacques Attali descreveu assim na "The New Yorker" a vertigem que sofrem os franceses: "Estamos como em alguns desenhos animados onde a gente vê alguém que ainda corre, sem saber que já ultrapassou o precipício. Esse é o presidente".
A França, de certa maneira, é um estranho país. Vive encantada por ter-se conhecido, sob um regime democrático nascido de um golpe de Estado brando há 54 anos, que estabeleceu uma República hiperpresidencialista cujo titular não só governa como também reina: não entendê-lo assim custou caro a Sarkozy, que se portou mais como um primeiro-ministro à britânica, "degradando" a função presidencial; candidatos trotskistas concorrem regularmente nas eleições presidenciais; seus socialistas são os mais antigos da Europa e ainda creem na luta de classes: seu candidato, François Hollande, afirma que os ricos são seu principal inimigo, enquanto Sarkozy, que chegou ao poder com o objetivo de reconciliar a França com o dinheiro, constata seu fracasso em moralizar o capitalismo; os franceses desconfiam do livre mercado. Só 31% acreditam que é o melhor sistema econômico. Uma nação na qual os políticos preferem dizer que a riqueza é um escândalo e que a pobreza é inaceitável.
Sarkozy, "um pequeno francês de sangue misturado", como se define a si mesmo, o filho desclassificado de um imigrante judeu húngaro, fracassou em sua tentativa de modificar a França eterna. Prometeu uma ruptura liberal com as velhas estruturas, uma certa anglossaxonização do país agrícola e industrial dos mais de 300 queijos; "trabalhar mais para ganhar mais". Mas o presidente agitado só conseguiu, com muito esforço, aumentar a idade de aposentadoria de 60 para 62 anos e liberalizar as universidades.
Sua projetada ruptura foi laminada pela crise e por suas próprias contradições; caiu em sua luta com Merkel pela primazia europeia; a França perdeu a classificação estrela do AAA; patina seu lema eleitoral, Uma França Forte; exporta menos que sua poderosa vizinha, enquanto paga mais que Berlim para se financiar.
Ao ambicioso equilibrista político que ocupa o Eliseu não faltou audácia no exterior. Decidiu reintegrar a França na estrutura militar da Otan, enterrando o princípio da independência sancionado por De Gaulle, e encabeçou a guerra contra Gaddafi na Líbia, a primeira disputa ganha por um chefe de Estado francês desde Napoleão. A resistência passiva de uma grande nação como a França é muito grande.
Hollande, homem prudente, criado na burocracia do aparelho socialista, vende uma mudança tranquila para uma sociedade que no fundo resiste a mudar. E sobretudo que não é Sarkozy. Seria um candidato em branco e preto, como o filme mudo francês vencedor em Hollywood, "O Artista", o anti-herói, diante dos efeitos especiais a toda cor de Sarkozy, segundo a sugestiva imagem do jornal "Le Devoir" de Quebec. É o que acontece na Europa: voltamos ao branco e preto.
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
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