Mais realismo
BC indica maior preocupação com pressões sobre preços e reforça cenário desanimador, de baixo crescimento do PIB com inflação no teto da meta
FSP - Editorial
Na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária, divulgada na semana passada, o Banco Central emitiu claro sinal de incômodo com a inflação e afastou a hipótese de novas reduções na taxa básica de juros, que deverá ficar em 7,25% por longo período.
O BC reconheceu a piora das expectativas inflacionárias no curto prazo, mas manteve o diagnóstico otimista de que a taxa de aumento de preços se aproximará, na segunda metade do ano, do patamar de 4,5%, o centro da meta de inflação (de 2,5% a 6,5%). O tom da análise da autoridade monetária começa a mudar, contudo.
A novidade surgiu com a ressalva de que uma recuperação aquém da esperada na atividade econômica se deve essencialmente a gargalos como logística cara e insuficiência de mão de obra qualificada, entre outros fatores que restringem a oferta e impulsionam os preços.
Tais problemas não podem ser resolvidos pelos instrumentos usuais de política monetária (controles sobre juros e crédito), que influenciam os preços ao aquecer ou esfriar a demanda. Ao explicitar que está de mãos atadas, o BC deixa ao governo federal toda a responsabilidade pelo crescimento.
A despeito da redução recente dos preços agrícolas e das tarifas de energia elétrica (esta de no mínimo 18% para domicílios e até 32% para consumidores industriais), que arrefecerá pressões inflacionárias no curto prazo, o quadro está longe de ser tranquilizador.
Era inevitável, por exemplo, o reajuste da gasolina. Também não tardarão as correções de preços nos transportes públicos. Os esforços federais para represar essas tarifas -um flerte com velhas práticas dos anos 1980- demonstram uma preocupante disposição para o artificialismo.
A desvalorização do real no segundo ano do governo Dilma Rousseff e a esperada reversão, ainda que gradual, dos cortes do IPI para alguns bens duráveis também devem pressionar os preços industriais. A redução do tributo barateou produtos nacionais e o real desvalorizado encareceu importados, cuja concorrência ajuda a refrear a alta no mercado doméstico. Os preços de serviços seguem subindo mais de 7% ao ano.
Diante da ameaça inflacionária, o BC mostra inclinação para tolerar alguma valorização do real. Nos últimos dias, o dólar voltou a ser cotado abaixo de R$ 2, pela primeira vez em muitos meses.
Com isso tudo, a inflação deve ficar entre 6% e 6,5% no primeiro semestre e cair um pouco no segundo. Desapareceu o espaço para absorver altas e tentar atingir o centro da meta.
Daqui para frente, um crescimento mais robusto do PIB dependerá de medidas que destravem a produção e reduzam o custo Brasil. Mas seus resultados demoram anos, não meses, para surgir.
A inação custará caro, ao perenizar a péssima combinação de baixo crescimento com inflação perigosamente próxima do teto da meta.
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