Depois de boas intenções, choque de realidade pode ser
implacável
SAMY
ADGHIRNI - FSP
A conversa por telefone entre os presidentes Barack Obama e Hasan Rowhani é o
ponto culminante do ensaio de reaproximação entre Irã e EUA, formalizado na
órbita da Assembleia-Geral da ONU.
O esperado aperto de mão não aconteceu, mas a fala de voz a voz, mesmo
atravancada pela tradução simultânea, derruba o tabu do contato direto entre
dirigentes de Estados rompidos há 34 anos.
É hora de pôr em prática as boas intenções. O choque de realidade, contudo,
ameaça ser implacável. O primeiro teste ocorrerá no próximo mês, em Genebra,
onde representantes do Irã e das potências, incluindo os EUA, retomarão
conversas sobre o programa nuclear iraniano, epicentro das hostilidades.
Rússia, China, França, Reino Unido e Alemanha não passam de coadjuvantes. A
chave para romper o impasse está no diálogo EUA-Irã.
As partes sinalizam concordar com o objetivo: obter um acordo pelo qual
iranianos aceitem frear radicalmente seu enriquecimento de urânio e submeter
todas as suas instalações nucleares a monitoramento intrusivo, em troca do
alívio das sanções.
Mas um pacto dependerá da disposição, até agora incerta, em fazer concessões.
Mesmo que o Irã diminua seu grau de enriquecimento de atuais 20%
(tecnicamente próximo do nível necessário à fabricação da bomba) para menos de
5%, não se sabe se Teerã aceitará se desfazer de seu estoque já enriquecido.
Também não está claro o que será feito de Fordow, a central nuclear iraniana
que é, em tese, à prova de bombardeio por ter sido construída dentro de uma
montanha.
Será que o Irã assinará o Protocolo Adicional do Tratado de Não Proliferação,
que supõe inspeções muito mais rigorosas? Teerã voltará a abrir aos inspetores
as portas de Parchin, base militar onde há suspeitas de ter havido teste de
explosão atômica?
O Ocidente está pronto para formalizar o reconhecimento do "direito
inalienável" de o Irã enriquecer urânio para fins civis?
Os EUA se comprometerão a suspender as principais sanções, ou manterão a
estratégia de "pequenos passos", que irrita Teerã?
Às discussões técnicas se somam obstáculos internos.
Rowhani tem apoio do líder supremo, aiatolá Ali Khamenei, chefe máximo da
teocracia iraniana. Mas Khamenei não conseguirá segurar por muito tempo a fúria
dos militares, clérigos e deputados que se beneficiam do status quo e torcem
pelo fracasso das negociações.
Obama tem mãos atadas. Mesmo que seus negociadores encontrem denominador
comum com Teerã, ele precisará do Congresso para levantar sanções. Boa parte dos
parlamentares americanos defende o fim do regime islâmico como precondição para
o diálogo.
A expectativa precisa surtir efeito. Caso contrário, corre-se o risco de
ruptura definitiva, com consequências potencialmente catastróficas.
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