domingo, 29 de setembro de 2013

Privatizações de Dilma: Se a presidente se surpreende com a fuga das grandes empresas, é porque nem sequer lê jornais!
Ricardo Setti - VEJA
"Que empresa privada gostaria de ter no seu calcanhar uma sócia, a nova estatal criada para o pré-sal, que não investirá um mísero dólar no consórcio, mas terá total poder de veto nas decisões estratégicas?" (Foto: Ag. Petrobras)
"Que empresa privada gostaria de ter no seu calcanhar uma sócia, a nova estatal criada para o pré-sal, que não investirá um mísero dólar no consórcio, mas terá total poder de veto nas decisões estratégicas?" (Foto: Ag. Petrobras)
PRIVATIZAÇÕES: OS FATOS E AS VERSÕES – 1
Do blog Política & Economia Na Real - José Márcio Mendonça/Francisco Petros
A primeira versão é que a presidente Dilma Rousseff está irritada como o que classifica como insucesso dos primeiros leilões de privatização de rodovias Federais em seu governo e de exploração do primeiro campo de pré-sal, o de Libra, colocado em hasta pública.
Insucesso porque o governo acreditava que haveria uma enxurrada de concorrentes nas duas ofertas — e o que se viu foi:
1) a ausência de qualquer proposta para a rodovia BR-262;
2) um consórcio vencedor da disputa pela BR-050 formado por nove empresas de porte médio, o que agitou outro fantasma que já assombrou a presidente, os resultados dos leilões do aeroportos de Guarulhos, Viracopos e Brasília;
3) e, na disputa do pré-sal, o aparecimento de apenas onze companhias – incluída a Petrobras, uma estatal! - e não as 40 imaginadas, ainda mais com a desistência de cinco gigantes petrolíferas.
Privatizações: os fatos e as versões – 2
Foi demais para Dilma – ela reagiu como se não soubesse que isto poderia ter acontecido. Ou não lê jornais, uma vez que não conversa com quem não pensa como ela e aceita suas ideias, ou não foi bem informada por seus assessores.
Especialistas nesses setores, de diversos matizes ideológicos, alertaram para esse risco, em função dos modelos que foram elaborados para as concessões (palavra que o governo prefere à privatização), não dessas duas áreas agora, mas também do que vem por aí como os aeroportos, portos e ferrovias.
O governo demorou anos para aceitar a necessidade de chamar o setor privado para ajudá-lo a atacar nossos problemas de infraestrutura. Havia um ano e meio de gestão quando a presidente lançou o Programa de Investimentos em Logística (PIL), em agosto de 2013.
Entre a descoberta dos primeiros campos de pré-sal, as mudanças no modelo de concessão para partilha e o anúncio da oferta do campo de Libra, passaram-se seis anos.
Privatizações: os fatos e as versões – 3
Quando o livro foi aberto percebeu-se que o governo queria conceder sem conceder de fato, mantendo interferências e controles sobre o processo que tornavam, para o capital privado, o negócio pouco atraente.
Várias correções foram feitas, já comentadas aqui, com o objetivo de aumentar a rentabilidade nas concessões rodoviárias e reduzir os correspondentes riscos. Mesmo assim a coisa não pegou. E não pegou tanto nas estradas como nos poços de petróleo por uma coisa que está sendo chamada de “risco-governo”.
O Palácio do Planalto procurou encontrar agentes externos de variadas conotações para explicar o insucesso. Empresários chegaram a ser chamados a Brasília para receber um “pito” da ministra Gleisi Hoffmann. A presidente, enquanto isso, ordenou a seus auxiliares uma revisão de todo o processo, para ver onde estão os gargalos.
É incrível que, depois de tanto tempo, o governo ainda precise fazer ajustes no seu programa. É sinal da soberba palaciana, de ouvir pouco e ordenar muito. Faltou o chamado “juízo crítico”, normalmente uma mercadoria escassa nos palácios governamentais.
Que empresa privada gostaria de ter no seu calcanhar uma sócia, a nova estatal criada para o pré-sal, que não investirá um mísero dólar no consórcio, mas terá total poder de veto nas decisões estratégicas?
Se não olhar para dentro e fizer um mea culpa, se não perceber que o Brasil não é o único lugar no mundo onde há bons negócios para o capital privado, a presidente Dilma pode colher outros frutos amargos na sua “privatização envergonhada” – “que nem jiló”, como diz a música de Luis Gonzaga.

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