O segundo lance do Fed
O Estado de S.Paulo
Depois de uma semana de tensão nos mercados financeiros e
cambiais, uma surpresa positiva: o dólar caiu no Brasil, apesar da nova
redução dos estímulos monetários nos Estados Unidos, anunciada no dia
anterior. A injeção de dinheiro para reanimar a economia americana
passará de US$ 75 bilhões para US$ 65 bilhões em fevereiro. Será o
segundo corte de US$ 10 bilhões, no intervalo de um mês. O dólar
continuou em alta em alguns mercados e caiu em outros, enquanto as ações
se valorizavam nas principais bolsas do Ocidente. Na Argentina, um dos
países mais vulneráveis à mudança da política monetária americana, o
dólar ficou estável no mercado oficial, cotado a 8,01 pesos por dólar,
enquanto se observava uma depreciação moderada no paralelo. Segundo
analistas, em todo o mundo houve realização de lucros, depois da grande
especulação cambial dos dias anteriores, e também alguma acomodação.
No caso do Brasil, a disputa pela fixação da taxa final de câmbio do
mês também ajudou a derrubar a cotação da moeda americana. De toda
forma, continuam no horizonte os riscos associados à redução gradual da
emissão de dólares. Os financiamentos já se tornaram mais escassos e
tanto as empresas quanto os governos terão de se adaptar às novas
condições internacionais de crédito e de investimento.
Nenhum cronograma foi anunciado pelo Federal Reserve (Fed) para a
alteração de sua política. O ritmo dependerá das informações coletadas
entre as reuniões do Comitê Federal de Mercado Aberto, responsável pela
estratégia monetária. Por enquanto, as informações indicam recuperação
firme da economia americana e a redução do desemprego.
No ano passado o Produto Interno Bruto (PIB) dos Estados Unidos
cresceu 1,9%, segundo cálculo divulgado com a estimativa preliminar da
atividade no quarto trimestre. Entre o terceiro e o último trimestre de
2013 a produção aumentou em ritmo equivalente a 3,2% ao ano. Houve uma
certa desaceleração, mas o resultado é bom e tem sido sustentado tanto
pelo consumo das famílias quanto pelo investimento privado. Mas os novos
números ainda serão revistos com base em informações mais amplas.
O crescimento da maior economia do mundo prenuncia novas
oportunidades para negócios internacionais, mas nem todos os países - e
isso inclui o Brasil - estão preparados para aproveitá-las. Além do
mais, a normalização da política monetária americana, com diminuição dos
incentivos e, mais tarde, uma elevação dos juros, já afeta os mercados e
impõe desafios a economias desenvolvidas e em desenvolvimento.
A desaceleração da economia chinesa também complica o cenário,
principalmente para os parceiros muito dependentes - também é o caso do
Brasil - das vendas de produtos básicos.
Ninguém pode acusar os dirigentes do banco central americano de ter
agido de surpresa. Em maio de 2013 todos sabiam do plano. Houve muita
especulação, enquanto se esperava o início dos cortes. A palavra
tapering, usada para indicar a diminuição progressiva das injeções de
dólares, tornou-se corrente nos mercados. As mudanças nas condições de
financiamento - crédito mais seletivo e preferência mais acentuada por
ativos em dólares - começaram bem antes da execução da nova política. Os
governos tiveram tempo razoável para se preparar.
No Brasil, só o Banco Central mudou de orientação, mas a motivação
inicial para a alta de juros foi a piora considerável da inflação. Com o
início efetivo do tapering, será arriscado evitar uma nova elevação da
taxa básica. Vários outros bancos centrais, incluídos os da Turquia e da
Índia, aumentaram os juros, nos últimos dias, para conter a fuga de
dólares e a depreciação de suas moedas.
O Executivo brasileiro nada fez para melhorar suas contas e para
reduzir mais prontamente as vulnerabilidades do País. O recém-divulgado
superávit primário do governo central, de R$ 77,07 bilhões em 2013, foi
menor que o do ano anterior. As perspectivas de crescimento econômico
permanecem ruins, assim como as das contas externas. Mesmo sem tapering o
Brasil estaria muito mal na foto.
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