Dilma em Cuba
O Estado de S.Paulo
Sem entrar no mérito das negociações diplomáticas e
comerciais do governo brasileiro com o de Cuba, que resultam no momento
em decisiva contribuição dos cofres públicos nacionais para a
implantação da Zona de Desenvolvimento Especial do Porto de Mariel na
ilha dos irmãos Castro, este mais recente afago à ditadura cubana
reitera o carinho de Dilma Rousseff pelo dogmatismo ideológico que o
lulopetismo compartilha com os Castros e só não logrou ainda consagrar
plenamente entre nós por duas razões. Primeiro, porque, pragmaticamente,
sua prioridade passou a ser manter-se no poder a qualquer custo;
depois, pela razão histórica de que a superação de dois regimes
discricionários no século passado, o getulista e o militar, teve o dom
de fortalecer nossas instituições democráticas e dificultar a escalada
de aventuras autoritárias, especialmente a partir da promulgação da
Carta Magna de 1988 - a cujo texto, aliás, o PT fez ferrenha oposição.
A conquista do poder e seu exercício por onze anos converteram o
lulopetismo, nunca é demais repetir, em um pragmatismo que hoje o
identifica com as piores práticas políticas que são, desde sempre, a
principal característica do patrimonialismo. Mas, principalmente para
efeito externo - mas também para satisfazer a militância que ainda
imagina pertencer ao velho PT -, o discurso "libertário" do "socialismo
do século 21" mantém-se inalterado e foi para exercitá-lo que Dilma
Rousseff decidiu encerrar na ilha dos Castros seu último périplo
internacional. Pois precisava de algum modo exorcizar eventuais fluidos
negativos remanescentes de sua passagem por Davos, o covil do
capitalismo, onde foi praticamente implorar por investimentos
estrangeiros no Brasil.
Ao lado de Raúl Castro e no indispensável beija-mão de Fidel, Dilma
esteve perfeitamente à vontade. Não se poupou de reafirmar que tem
"muito orgulho" da boa relação que mantém com a dupla que há mais de
meio século domina a ilha com mão de ferro e nenhum apreço pelas
liberdades democráticas. Derreteu-se em agradecimentos ao favor que Cuba
presta ao Brasil ao fornecer, para o programa Mais Médicos, a um custo
altíssimo só parcialmente repassado aos profissionais, os doutores que
aqui desembarcam para suprir a deficiência de atendimento básico nos
grotões que a incompetente política nacional de saúde não tem conseguido
alcançar. Para conferir maior brilho a esse tópico de sua agenda em
Havana, Dilma levou a tiracolo o ministro da Saúde, Alexandre Padilha,
que brevemente será o candidato do PT ao governo de São Paulo.
Mas foi no Porto de Mariel, no qual o nosso Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) já havia investido mais de
US$ 800 milhões e agora vai colocar outros US$ 290 milhões - menos mal
que com a condição de serem gastos com fornecedores brasileiros de bens e
serviços -, que Dilma escancarou sua admiração pela mítica ilha dos
sonhos da esquerda inconsequente. Chegou mesmo a enaltecer o fato de que
"Cuba gera um dos três maiores volumes de comércio do Caribe", algo
assim tão relevante e extraordinário para a economia globalizada quanto,
para o futebol mundial, saber que o Confiança Futebol Clube, de
Aracaju, é uma das três maiores forças do ludopédio sergipano.
A presidente foi a Havana também para bater ponto na 2.ª Cúpula da
Comunidade de Estados Latino-Americanos (Celac), preciosa oportunidade
para mais uma manifestação de simpatia pela ideologia "libertária" que
irmana o lulopetismo aos Castros e a outros aventureiros bolivarianos do
continente.
Ao procurar sua turma, Dilma Rousseff deixa no ar uma questão
fundamental para o futuro da democracia brasileira, que a tão duras
penas tenta se consolidar: o que o PT planeja para o Brasil é o mesmo
que, para ficar apenas no continente, os amigos de fé de Lula e Dilma
oferecem a cubanos, nicaraguenses, venezuelanos, bolivianos,
equatorianos e argentinos? Sonho por sonho, melhor acreditar que tudo é
apenas jogo de cena.
Nenhum comentário:
Postar um comentário