quarta-feira, 31 de julho de 2013

Conselheiro de Obama diz ser hipócrita indignação da Europa com espionagem
Gregor Peter Schmitz - Der Spiegel
Em entrevista à Spiegel, o conselheiro de Obama John Podesta chamou de hipócrita a indignação da Europa por conta do escândalo de espionagem da NSA, mas disse que os EUA também precisam de um debate nacional sobre as leis de vigilância.
Spiegel: De acordo com uma pesquisa recente, cerca de três quartos dos americanos acreditam que a espionagem da Agência de Segurança Nacional (NSA) está infringindo seus direitos de privacidade. Uma proposta para restringir programas como este foi rejeitada por uma estreita margem de votos no Congresso. Os norte-americanos estão começando a temer um estado de vigilância?
Podesta: Estamos em território desconhecido, enfrentando uma rápida mudança tecnológica que simplesmente inundou o regime jurídico existente. O foco da mídia nas últimas semanas tem girado quase que exclusivamente em torno da tentativa de Edward Snowden de conquistar o recorde mundial de escala mais longa num aeroporto. Mas o foco em Snowden distrai a atenção da problemática mais importante sobre as informações que ele forneceu para a mídia.
Spiegel: E qual é essa problemática?
Podesta: Ao contrário da última vez que tivemos um debate nacional sobre a vigilância doméstica da NSA na época das "escutas telefônicas ilegais", em 2005, hoje existe uma estrutura jurídica para apoiar o Prism e os outros programas. Portanto, o desafio não está enraizado no fato de a NSA ter ultrapassado seus limites legais. Em vez disso, novos produtos e serviços, um maior poder de processamento, e o custo decrescente de armazenar enormes quantidades de dados significam que a vigilância numa escala sem precedentes já não é apenas tecnologicamente possível, mas também é financeiramente viável pela primeira vez. Já passou da hora de iniciarmos um novo debate nacional sobre o que queremos que nossas leis de vigilância permitam, particularmente à luz da velocidade com que a tecnologia e a sociedade estão mudando.
Spiegel: E você acredita que esse debate continuará apesar do fracasso da proposta no Congresso?
Podesta: O povo norte-americano tem o direito de conhecer e compreender as leis sob as quais vivem. E a tendência é que ele exija respostas cedo ou tarde. Veja os debates sobre os ataques dos aviões teleguiados: temos visto uma aliança entre a esquerda e a direita contra os teleguiados por medo de que eles possam ser usados para fins domésticos. Obama teve de se pronunciar publicamente sobre sua política de segurança nacional e conseguiu acalmar grande parte desses críticos. Em retrospecto, a única questão foi por que ele esperou tanto tempo para fazer aquele discurso.
Spiegel: Então você quer que o presidente Obama faça um discurso semelhante sobre a espionagem?
Podesta: Seria um bom conselho para que ele se envolvesse num debate público. Mas ele também deve estabelecer uma comissão nacional para examinar esses problemas a fundo. As comissões presidenciais têm um longo histórico de investigar de forma ampla e imparcial muitos assuntos de segurança nacional, de Pearl Harbour ao 11 de setembro. A comissão deve se encarregar de oferecer recomendações para um quadro jurídico flexível que possa facilmente acomodar avanços tecnológicos e manter o respeito pelas liberdades civis. Ela também poderia examinar as atividades do setor privado.
Spiegel: Que atividades, por exemplo?
Podesta: Ao mesmo tempo em que a nova tecnologia permite que os governos se envolvam numa vigilância que antes não era tecnicamente viável, os consumidores estão divulgando voluntariamente pilhas de dados pessoais para empresas privadas – e essa divulgação é regida por aqueles longos acordos de termos e condições – aqueles que as pessoas clicam no botão "concordo" sem pensar duas vezes. Toda vez que postamos algo pessoal no Facebook, estamos ajudando essa empresa a construir um perfil sofisticado sobre nós que ela usa para vender anúncios direcionados. Enquanto isso, nossos smartphones com tecnologia GPS integrada monitoram onde estamos e as empresas de telefonia e provedores de Internet coletam metadados em cada ligação que fazemos e cada e-mail que mandamos. Nos Estados Unidos, as decisões judiciais da época anterior à Internet sugerem que a informação que é dada voluntariamente a essas empresas pode ser obtida facilmente pelo governo. Essa regra legal podia fazer sentido numa época anterior ao Facebook e aos iPhones, mas precisamos de uma análise séria para ver se isso ainda faz sentido hoje.
Spiegel: Você fala muito sobre os direitos dos norte-americanos. Mas os europeus estão furiosos porque a NSA pode espioná-los com quase nenhuma restrição.
Podesta: Precisamos de uma melhor fiscalização das nossas agências de vigilância e precisamos de mais transparência no Tribunal de Vigilância de Inteligência Estrangeira. Certamente podemos satisfazer nossas necessidades de segurança nacional sem sacrificar o respeito à privacidade pessoal, valor que por muito tempo foi um ícone da vida norte-americana. O presidente poderia acalmar alguns dos críticos internacionais se explicasse melhor o que os EUA estão fazendo.
Spiegel: Em vez disso você ouve em Washington que os europeus são "chorões" e "hipócritas".
Podesta: Bem, eu concordo que a raiva europeia é em grande parte hipócrita. A maioria dos governos de lá já sabiam há muito tempo o que os EUA vinham fazendo e muitas vezes cooperaram estreita e voluntariamente. Eu entendo por que os líderes da Europa precisam falar publicamente contra o Prisme outros programas, mas eles ainda agem como hipócritas.
Tradutor: Eloise de Vylder

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