quarta-feira, 31 de julho de 2013

A Justiça e a queda do PIB
O Estado de S.Paulo
Ao discursar na sessão de abertura do Simpósio de Altas Cortes de Justiça, realizado em Haia, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, afirmou que o declínio do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, em 2013, levará a uma queda nas receitas governamentais em 2014, obrigando os diversos tribunais do País a se ajustar a uma nova realidade orçamentária.
Entre outros temas, o encontro discutiu o impacto das crises econômicas sobre a Justiça e as medidas tomadas pelos tribunais do mundo inteiro para compensar a redução de seus orçamentos. Nos Estados Unidos, por exemplo, o orçamento da Justiça Federal para 2013 sofreu um corte de US$ 350 milhões. Dos 50 Estados americanos, 42 também promoveram cortes orçamentários e reduziram os horários de atendimento à população. Só a Justiça estadual da Califórnia fechou 25 varas e exonerou 175 servidores judiciais. No Reino Unido, discutiu-se a possibilidade de privatizar os serviços administrativos dos tribunais. Muitos dirigentes de cortes supremas reconheceram que, em alguns casos, os cortes orçamentários podem pôr em risco a autonomia administrativa e a independência dos tribunais.
No discurso, o ministro Joaquim Barbosa reconheceu, realisticamente, que a redução de verbas pode afetar a independência da magistratura. Mas lembrou que, para afastar esse risco, o Judiciário tem de ser menos perdulário na gestão de seus recursos e mais responsável na definição de suas prioridades. Segundo o ministro, desde que as estimativas de crescimento do PIB foram sendo reduzidas pelas autoridades econômicas os tribunais superiores foram obrigados a reduzir seu orçamento em R$ 166 milhões.
No Conselho Nacional de Justiça, que também é presidido por ele, o corte orçamentário foi de R$ 16,6 milhões. No Supremo, que tem um orçamento anual de R$ 500 milhões, a redução foi menor, de R$ 2,5 milhões. As maiores distorções estão nas Justiças estaduais, afirmou Barbosa. Enquanto o orçamento da Justiça Federal equivale a cerca de 2% do Orçamento da União, a Justiça de Rondônia recebe quase 9% do orçamento estadual.
O ministro Joaquim Barbosa sempre criticou os gastos excessivos dos tribunais brasileiros com a construção de palácios faraônicos e o uso de expedientes administrativos para aumentar os vencimentos de juízes, por meio de benefícios como auxílio-alimentação. No primeiro semestre, ele se opôs veementemente contra a aprovação, pelo Congresso, da Emenda Constitucional (EC) 73, que aumentou de cinco para nove o número de Tribunais Regionais Federais (TRFs). Segundo o ministro, a emenda amplia os gastos da Justiça Federal com a contratação de servidores e aquisição de frotas para desembargadores, sem que a demanda justifique a criação desses TRFs. Recente pesquisa do Ipea confirma o argumento, lembrando que um dos TRFs praticamente não terá trabalho por falta de processos.
Há algumas semanas, o presidente do STF acolheu um recurso impetrado por uma associação de procuradores federais e concedeu liminar suspendendo a criação dos quatro TRFs. A associação lembra que, pela Constituição, só o Judiciário pode propor projetos que alterem sua estrutura administrativa. A EC 73 foi de autoria de um senador.
Por coincidência, no mesmo mês em que discursou em Haia, propondo que a Justiça seja realista e responsável na gestão de recursos orçamentários, a imprensa divulgou uma nota de protesto de uma associação de juízes federais, afirmando que Barbosa não teria "isenção" para conceder a liminar. Também foi noticiado que o TJSP pagou R$ 191 milhões a seus juízes em 2013, a título de "quitação de vantagens eventuais". Os recursos vieram de um fundo originariamente criado para financiar a modernização administrativa da Corte. Isso mostra que setores da Justiça ainda não se deram conta de que o quadro econômico está em rápida mudança e de que terão de se adequar a um contexto de baixo crescimento, queda de receita e corte de despesas.

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