terça-feira, 27 de agosto de 2013

Refugiados em busca de asilo encontram risco e fraude na Austrália
Joe Cochrane e Matt Siegel - NYT                                          
Ed Wray/International Herald Tribune
Abdulkadir Abdi (à direita), refugiado somali em foto tirada em 16 de agosto em Jacarta. De acordo com uma nova política australiana, qualquer um que chegar de barco sem visto ao país será enviado para um centro de processamento de refugiados na vizinha Papua-Nova Guiné e impedido de se estabelecer na Austrália
Abdulkadir Abdi (à direita), refugiado somali em foto tirada em 16 de agosto em Jacarta. De acordo com uma nova política australiana, qualquer um que chegar de barco sem visto ao país será enviado para um centro de processamento de refugiados na vizinha Papua-Nova Guiné e impedido de se estabelecer na Austrália
Em janeiro, Naqsh Murtaza deu um basta ao Afeganistão arrasado pela guerra. Naqsh, um afegão de 27 anos, fugiu com sua mãe e dois irmãos menores pela fronteira para o Paquistão, a primeira parada de uma jornada arriscada cujo destino final seria a Austrália.
Ele não tinha dinheiro para levar toda a família para lá, de modo que esperava chegar à Austrália sozinho, pedir asilo e então enviar dinheiro para eles assim que se estabelecesse.
Chegar até a Indonésia ou Malásia é relativamente fácil para muçulmanos como Naqsh. Restrições frouxas de vistos facilitam a entrada nos países e redes de contrabando bem estabelecidas lotam barcos com requerentes de asilo para enfrentar a travessia do oceano até solo australiano.
Como muitas das embarcações frágeis, o barco que levava Naqsh naufragou no meio do caminho e ele teve que ser resgatado pelas autoridades indonésias. Ele nunca chegou à Austrália. Mas poderia não ter importado se tivesse conseguido.
Segundo uma nova política anunciada pelo primeiro-ministro Kevin Rudd em 19 de julho, antes de uma eleição nacional acirrada no mês que vem, qualquer um que chegar de barco sem visto, da forma como Naqsh tentou, será enviado para um centro de processamento de refugiados na vizinha Papua-Nova Guiné e impedido de se estabelecer na Austrália. É a política mais excludente já tentada pelo país, na esperança de conter o afluxo de requerentes de asilo, que se transformou em uma questão política polêmica.
O governo anunciou a nova política intensamente nos jornais e na televisão australiana, para que a mensagem chegasse às populações imigrantes e a notícia se espalhasse até seus países de origem, e a amigos e parentes com a intenção de fugir para a Austrália.
Mas a história da Austrália de reversão de políticas deixa muitos imigrantes confusos sobre quais são as regras no momento e aumenta as esperanças de outros de que esta mais recente política também seja revertida. Informações erradas, ainda mais por parte dos contrabandistas, também mina o esforço de divulgação da notícia.
No Paquistão, disse Naqsh, ele tentou pedir asilo no Reino Unido, Canadá ou nos Estados Unidos, mas foi informado que poderia levar de 5 a 10 anos. Outros afegãos no Paquistão lhe disseram que a Austrália era uma opção mais rápida. Então ele partiu de Islamabad para Kuala Lumpur, Malásia, em junho, pagou aos contrabandistas US$ 2 mil para ser levado para Jacarta e mais US$ 3.200 para ser colocado em um barco com destino a Christmas Island, um território australiano no Oceano Índico.
Ele soube da nova política australiana enquanto aguardava em um albergue para mochileiros em Jacarta por um lugar em um barco. Mas o contrabandista com o qual ele estava tratando lhe assegurou que a nova política só entraria em vigor em 14 de agosto, e que não havia risco dele ser transferido para Papua-Nova Guiné desde que chegasse em Christmas Island antes disso.
"Obviamente ele mentiu", disse Naqsh.
O barco de pesca que levava Naqsh e mais de 70 iranianos, paquistaneses e outros afegãos partiu em 28 de julho. Alguns refugiados levavam celulares pré-pagos e números de emergência de autoridades australianas obtidos em sites na Internet. Poucos dias após a partida, uma forte tempestade danificou o barco, que começou a afundar lentamente em águas internacionais. Os emigrantes e cinco tripulantes foram resgatados pela Agência Nacional Indonésia de Busca e Resgate após 17 horas de chamadas desesperadas para as autoridades australianas, que informaram seus pares indonésios.
Os emigrantes foram levados de volta para a Indonésia, onde foram autorizados a permanecer até que o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados determine se eles se qualificam como refugiados de boa fé e não como emigrantes econômicos.
Naqsh disse que não tentará outra viagem marítima e espera ser transferido para algum lugar legalmente por meio da agência de refugiados da ONU.
Ele agora enfrenta uma longa espera até que seu caso seja ouvido. Ele não pode trabalhar legalmente na Indonésia, onde já existiam mais de 10 mil requerentes de asilo e refugiados oficiais aguardando para serem processados quando ele chegou, disse a agência. A transferência de um indivíduo pode levar de dois a três anos, segundo a Organização Internacional de Migração em Jacarta. Desde 2000, aproximadamente 2.500 refugiados registrados na ONU na Indonésia foram reassentados.
Para ajudar a espalhar e reforçar a mensagem de que candidatos a refugiados não devem tentar cruzar o mar, o Departamento de Imigração e Cidadania australiano postou suas propagandas de rádio e televisão em seu site em pelo menos oito línguas, e divulgou fotos de recém-chegados transtornados em Christmas Island ao serem informados de que seriam deportados para Papua-Nova Guiné.
Sandi Logan, um porta-voz do departamento, disse que se trata de uma batalha colina acima. "Francamente, a mudança constante das políticas deixa muitos na diáspora e, particularmente, muitos para os quais o inglês é a segunda, terceira ou quarta língua muito perplexos", ele disse.
Não está claro quanto a nova política dissuadirá os imigrantes a longo prazo. O que está claro é que teve pouco efeito até o momento.
Segundo as autoridades australianas, nas quatro semanas após o anúncio de Rudd, 2.784 imigrantes chegaram, ou tentaram chegar, a Austrália saídos da Indonésia e de outros lugares, quase o dobro da média mensal de 1.434 em 2012. Elas disseram que 356 que chegaram a Christmas Island foram enviados para um campo na Ilha Manus, em Papua-Nova Guiné.
Alguns dos que chegaram após o anúncio disseram que não ouviram nada a respeito, incluindo alguns sobreviventes de uma embarcação que partiu da Indonésia em 23 de julho, com mais de 200 pessoas do Irã e do Sri Lanka, que afundou além da costa da província de Java Ocidental na Indonésia, matando pelo menos 20 pessoas.
Outros que estavam cientes da nova política partiram assim mesmo. Abdulkadir Abdi, um refugiado somali de 28 anos no aguardo na Indonésia, viu uma reportagem sobre a política na televisão. Ele disse que alguns compatriotas que também sabiam a respeito dela partiram do porto indonésio de Makassar na noite de 31 de julho, com destino a Christmas Island, e que não teve mais notícias deles.
Abdi, que chegou na Indonésia em janeiro de 2011 esperando cursar uma universidade, apenas para descobrir que tinha sido enganado por um "agente de ensino" na Somália, disse que queria ter se juntado ao grupo na tentativa, mas não podia pagar o preço do contrabandista.
"Na mente dos refugiados, há duas opções: você morre no barco ou irá para a Austrália", disse Abdi. Quanto ao risco de ser transferido para Papua-Nova Guiné, ele disse, o pensamento é "talvez eles não me enviem; políticas podem mudar".
Tradutor: George El Khouri Andolfato

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