Hasnain Kazim - Der Spiegel
Marcelo Negromonte/UOLLoja de luminárias no Grande Bazar em Istambul: risco de desabamento por conta do mau uso
Ele é um dos maiores e mais populares mercados cobertos do mundo – mas agora os administradores alegam que os vendedores enfraqueceram a estrutura do Grande Bazar de Istambul ao ponto de que ela pode ruir. Os comerciantes veem a situação de forma diferente.
O Grande Bazar de Istambul é um antigo labirinto: o gesso está caindo das abóbadas do teto; em muitos lugares a tinta está descascando; os padrões coloridos precisam desesperadamente ser redesenhados. "Faz muito tempo que foram feitos", diz o comerciante de roupas Mehmed. "Talvez 30 ou 40 anos."
Este mercado coberto de séculos de existência – uma das maiores atrações turísticas de Istambul, atraindo milhares de pessoas todos os dias – corre o risco de desmoronar e precisa urgentemente de uma reforma. Pelo menos é o que a administração do mercado está dizendo. Os administradores afirmam que muitos dos vendedores alteraram paredes sem permissão para criar mais espaço para suas lojas. Em vários casos, eles teriam quebrado paredes e criado porões ilegais. Isso, dizem eles, coloca em risco a estabilidde do prédio.
Uma investigação realizada em nome da administração do mercado revelou que 135 vendedores haviam retirado e 926 haviam reduzido a espessura de paredes para ganhar mais espaço para os seus produtos. E até o teto está instável, porque eles têm de suportar o peso de um número cada vez maior de aparelhos de ar condicionado, caixas d'água e antenas parabólicas. De acordo com o jornal turco Zaman, os vendedores responsáveis podem ser penalizados.
O relatório de inspecção, que saiu na semana passada, faz parecer que as abóbadas do edifício – que fica localizado em Eminönü, o velha parte europeia da cidade – correm o risco de ruir; como se o bazar, no qual as pessoas barganham e vendem, fofocam e bebem chá há meio milênio, está ameaçado se nada for feito em breve.
"Isso não vai ruir amanhã"
Mehmed, que faz parte da terceira geração de vendedores de tecidos de sua família, está na frente de suas prateleiras, cheias de toalhas de sauna, desconsidera a ideia. "Isso é absurdo. Sim, está na hora de fazer algo a respeito – mas isso aqui não vai ruir amanhã." Aydin comanda o tenda ao lado, vendendo cortes de algodão e utensílios tradicionais para o hammam (banh turco). Ele tampouco acredita numa catástrofe iminente. "Na verdade, isso diz respeito a decidir quem deve pagar pela reforma", diz ele – é para colocar os vendedores sob pressão. "Eu não aceito que devemos arcar com todos os custos sozinhos."
O problema é a complexa situação dos proprietários. Algumas das instalações pertencem aos vendedores, outras à prefeitura, e muitas outras ao estado ou a fundações. "A própria prefeitura contribuiu para que as coisas estejam caindo aos pedaços", disse Aydin. A prefeitura, diz ele, retirou o revestimento do telhado porque ele aparentemente continha chumbo, e o substituiu por telhas. "Agora os corredores ficam úmidos – sempre estão fazendo gambiarras", afirma o empresário.
Vários vendedores afirmam que as penalidades e os anúncios de obras de reforma são apenas ameaças. "Trabalho aqui há mais de 20 anos", diz um senhor mais velho que vende canos da Anatólia. "Quantas vezes já ouvi falar que os corredores do mercado estavam prestes a ruir? Quantas vezes eles ameaçaram retirar as construções ilegais? Nada aconteceu." Mas ele vê um perigo: "se um dia houver outro terremoto grave – como os que Istambul sofria frequentemente no passado – tudo isso de fato vai ruir."
Outros apontam para a longa história do mercado, de que ele sobreviveu a todos os terremotos, todos os incêndios e todas as crises políticas. O sultão Mehmed 2º encomendou a construção do mercado coberto em 1461, depois da conquista de Constantinopla.
Ao longo dos séculos, cada vez mais pessoas chegaram, até que num determinado momento, o bazar se tornou o mario mercado coberto do mundo. Os turcos o chamam de Kapali Carsi, que significa "mercado coberto". Comerciantes e membros da associação do bazar dizer que ele contém até 4 mil negócios em 64 ruas e alamedas, e que 20 mil a 25 mil pessoas trabalham no local.
Tesouros e lixo
Antigamente, o mercado era um ponto de encontro para moradores, um lugar para congregar depois de uma visita às mesquitas próximas e, é claro, um lugar de comércio, onde vendedores ofereciam ouro, pedras preciosas ou tecidos finos. Cada vez mais vendedores chegam, e agora há uma ampla variedade de mercadorias: de antiguidades e pretensas antiguidades, até móveis, caligrafias e livros. "Infelizmente, também tem muito lixo", diz Aydin. "Roupas baratas do oriente distante e brinquedos de plástico." Há bancos, casas de câmbio, casas de chá e café, a polícia e os serviços de correio.
"Os turistas têm sido nossa fonte econômica mais importante já há algum tempo", diz Mehmed. Os vendedores ganham um bom dinheiro com os visitantes, porque todos os guias de turismo dizem que é preciso barganhar no bazar, e eles incluem uma dica: não tenha vergonha de começar oferecendo um terço do preço proposto pelo vendedor – dessa forma, você terminará na metade do valor da oferta inicial dele.
Como os vendedores sabem disso, eles começam com preços altos fora da realidade, e dessa forma, os dois lados ficam satisfeitos com a venda: os turistas acreditam que conseguiram uma barganha graças a suas habilidades de negociação e o vendedor tem um lucro alto.
Os vendedores dizem que a possibilidade de colapso dos corredores prejudica seu bem-estar econômico. "No final, os turistas não virão mais porque têm medo", diz Mehmed.
Tradutor: Eloise de Vylder
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