O Estado de S.Paulo
As manifestações populares de junho tiveram o dom de despertar, por um lado,
uma insuspeitada aplicação de parlamentares, governantes e partidos políticos e,
por outro, a livre imaginação dos cidadãos em geral, todos voltados para a busca
de novos meios e modos para o aperfeiçoamento da representação popular e dos
mecanismos de captação da vontade das ruas. Descontados os inevitáveis exageros
e impropriedades, é muito bom que assim seja. A democracia é um processo que
exige participação ativa e permanente de todos, governantes e governados.
Principalmente quando a cidadania descobre que esse processo está muito longe de
atender às exigências mínimas do bem comum.
Chama a atenção em particular uma proposta de emenda à Constituição (PEC),
oriunda do Senado, onde foi relatada, na Comissão de Constituição e Justiça
(CCJ), pelo senador Lindbergh Farias (PT-RJ). Essa PEC, aprovada por aclamação
na CCJ, reduz pela metade (de 1% para 0,5% do eleitorado nacional) a exigência
de assinaturas para a apresentação de projetos de lei de iniciativa popular e
abre a possibilidade de que essas assinaturas sejam colhidas também pela
internet.
A conveniência ou não de reduzir pela metade o número de assinaturas exigidas para a apresentação de projetos de lei de iniciativa popular é uma questão que ainda divide opiniões de políticos e especialistas. Os que são a favor argumentam - em muitos casos, com indisfarçável inspiração demagógica e populista - que a redução de cerca de 1,5 milhão de assinaturas para aproximadamente 700 mil é um importante estímulo para a multiplicação das desejáveis iniciativas dessa natureza. Em sentido oposto, há quem acredite que essa redução poderá facilitar, isso sim, a manipulação de grupos de interesses específicos - religiosos, por exemplo -, já que induzir 700 mil cidadãos a subscrever um projeto de lei é tarefa obviamente muito mais exequível do que ter que arregimentar o dobro desse número.
Por outro lado, pode ser proveitosa a ideia de permitir que a subscrição de projetos de iniciativa popular seja feita também pela internet. Tratar-se-ia de colocar um notável desenvolvimento tecnológico a serviço do processo democrático. A internet já tem cumprido esse papel ao potencializar a comunicação entre os cidadãos e, consequentemente, a discussão de temas e pleitos de interesse comum, conforme ficou evidente nas manifestações de junho. Seria, portanto, desejável que essa conquista tecnológica, que amplia enormemente o eco popular, fosse colocada também a serviço dos procedimentos eleitorais e legislativos.
Deve-se tomar cuidado, contudo, com o açodamento com que muita gente já vislumbra no uso da internet um atalho para a implantação da chamada democracia direta. É certamente ainda muito cedo para saber com precisão em que medida, e exatamente de que forma, a internet contribuirá para o exercício da democracia. Se informação é poder - e um paradigma importante que a internet está quebrando é o do controle da informação pela mídia tradicional -, não há dúvida de que ela poderá ser cada vez mais um instrumento essencial para o aperfeiçoamento da convivência democrática.
Mas é preciso ir devagar com o andor. Até porque no caso do Brasil, como no da esmagadora maioria dos países, apesar da crescente expansão de seu uso, a internet é ainda ferramenta ao alcance apenas da população que desfruta de renda suficiente para pagar por ela. É uma mídia ainda privativa de segmentos privilegiados da população. Isso não impede, é claro, que a internet seja usada para vocalizar os anseios e necessidades das camadas da população economicamente menos favorecidas ou mesmo marginalizadas da atividade econômica. Basta que o façam os cidadãos que a ela têm acesso e que também têm consciência das mazelas sociais que o mundo ainda não conseguiu resolver.
Mas aí a questão extrapola para o âmbito da educação, sem a qual é impossível desenvolver consciência cívica e solidariedade social. Também nisso a internet pode, é claro, ser extremamente útil. Mas ela é apenas meio, não fim - e jamais uma panaceia para as questões superiores da política.
A conveniência ou não de reduzir pela metade o número de assinaturas exigidas para a apresentação de projetos de lei de iniciativa popular é uma questão que ainda divide opiniões de políticos e especialistas. Os que são a favor argumentam - em muitos casos, com indisfarçável inspiração demagógica e populista - que a redução de cerca de 1,5 milhão de assinaturas para aproximadamente 700 mil é um importante estímulo para a multiplicação das desejáveis iniciativas dessa natureza. Em sentido oposto, há quem acredite que essa redução poderá facilitar, isso sim, a manipulação de grupos de interesses específicos - religiosos, por exemplo -, já que induzir 700 mil cidadãos a subscrever um projeto de lei é tarefa obviamente muito mais exequível do que ter que arregimentar o dobro desse número.
Por outro lado, pode ser proveitosa a ideia de permitir que a subscrição de projetos de iniciativa popular seja feita também pela internet. Tratar-se-ia de colocar um notável desenvolvimento tecnológico a serviço do processo democrático. A internet já tem cumprido esse papel ao potencializar a comunicação entre os cidadãos e, consequentemente, a discussão de temas e pleitos de interesse comum, conforme ficou evidente nas manifestações de junho. Seria, portanto, desejável que essa conquista tecnológica, que amplia enormemente o eco popular, fosse colocada também a serviço dos procedimentos eleitorais e legislativos.
Deve-se tomar cuidado, contudo, com o açodamento com que muita gente já vislumbra no uso da internet um atalho para a implantação da chamada democracia direta. É certamente ainda muito cedo para saber com precisão em que medida, e exatamente de que forma, a internet contribuirá para o exercício da democracia. Se informação é poder - e um paradigma importante que a internet está quebrando é o do controle da informação pela mídia tradicional -, não há dúvida de que ela poderá ser cada vez mais um instrumento essencial para o aperfeiçoamento da convivência democrática.
Mas é preciso ir devagar com o andor. Até porque no caso do Brasil, como no da esmagadora maioria dos países, apesar da crescente expansão de seu uso, a internet é ainda ferramenta ao alcance apenas da população que desfruta de renda suficiente para pagar por ela. É uma mídia ainda privativa de segmentos privilegiados da população. Isso não impede, é claro, que a internet seja usada para vocalizar os anseios e necessidades das camadas da população economicamente menos favorecidas ou mesmo marginalizadas da atividade econômica. Basta que o façam os cidadãos que a ela têm acesso e que também têm consciência das mazelas sociais que o mundo ainda não conseguiu resolver.
Mas aí a questão extrapola para o âmbito da educação, sem a qual é impossível desenvolver consciência cívica e solidariedade social. Também nisso a internet pode, é claro, ser extremamente útil. Mas ela é apenas meio, não fim - e jamais uma panaceia para as questões superiores da política.
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