Fazendo o diabo
O Estado de S.Paulo
A composição do primeiro escalão de governo objetiva
colocar na administração pública os melhores quadros disponíveis para
que o Executivo se desincumba, da maneira mais eficiente possível, de
suas enormes responsabilidades de planejamento e execução de projetos e
programas em todas as áreas. Assim, habilitação para o planejamento
técnico, capacidade de gestão e um mínimo de representatividade e
habilidade políticas são as qualificações necessárias para qualquer
candidato a um cargo de ministro de Estado. E, nas condições de
temperatura e pressão em que vivemos, é extremamente desejável que o
candidato preencha também o quesito honestidade, que não pode ser
considerada qualidade, mas obrigação.
É o que o senso comum parece recomendar. Mas não é o que a presidente Dilma Rousseff tem em mente, segundo informam os jornais.
Com a troca de ministros necessária para substituir aqueles que se
desincompatibilizarão para serem candidatos em outubro, o governo
petista pretende contemplar com Ministérios quatro novos partidos que
aliciou mais recentemente para a base aliada, que contaria com 12
legendas. Isso garantirá um aumento de 50% no tempo de exposição no
rádio e na TV que a candidatura petista à Presidência já tem assegurado.
Com as novas adesões, PT e aliados disporão de quase metade (48,9%) do
tempo em todos os blocos da propaganda dita gratuita. Esses blocos têm a
duração de 25 minutos. Se conseguir o que almeja, Dilma disporá de 12
minutos em cada um. Um recorde na história das eleições presidenciais.
Nessas condições, a reforma ministerial esperada no máximo até março
levará para o primeiro escalão do governo petista - como, na verdade, em
grande medida já ocorre - não exatamente homens públicos técnica,
gerencial e politicamente credenciados a bem exercer sua missão, mas,
prioritariamente, pessoas que carreiam segundos e minutos para a
propaganda eleitoral da presidente candidata. Isso pode vir a se tornar
um problema maior para um governo que já enfrenta enormes dificuldades
técnicas e gerenciais para cumprir as metas de suas iniciativas
prioritárias. É praticamente impossível encontrar obras federais em
andamento dentro do prazo, o que implica, quase sempre, revisão de
custos para cima.
Além do prejuízo para o andamento das realizações governamentais
provocado pela incompetência técnica e gerencial de uma máquina
partidariamente aparelhada, outro enorme ônus que recai diretamente
sobre os ombros de todos os brasileiros, indistintamente, é o altíssimo
custo de uma corrupção endêmica que só não é encontrada onde não é
procurada. É claro que a corrupção no governo não é invenção do PT, que
se criou politicamente combatendo-a com dureza e prometendo moralizar a
prática da política no dia em que chegasse ao poder. Em recente evento
em São Paulo, Dilma deixou-se fotografar tendo como papagaio de pirata
um sorridente Paulo Maluf ali mesmo vaiado todas as vezes em que teve
seu nome mencionado. É a melhor ilustração daquilo em que o pragmatismo
petista transformou uma praga que se comprometera a dizimar.
Mas a montagem desse novo Ministério pró-eleitoral não deverá criar
problemas de consciência para a chefe do governo, que não se pejou, logo
em seu segundo ano de governo, de anular quase que completamente a
"faxina" com a qual, um ano antes, havia aliviado o primeiro escalão
governamental dos principais alvos de denúncias de corrupção - todos
eles, sugestivamente, herdados de seu antecessor. Como esse expurgo era
um perigoso ponto fora da curva na trajetória de pragmatismo político
imposto ao País pelo novo PT de Lula, este mesmo se incumbiu de fazer
ver à sucessora desobediente que as novas diretrizes petistas deveriam
ser respeitadas por todos, sem exceção. E não se falou mais nisso.
Essa próxima reforma ministerial poderá dar uma boa ideia do que
Dilma queria dizer quando admitiu que, na hora da eleição, faz-se "o
diabo".
Nenhum comentário:
Postar um comentário