quinta-feira, 17 de maio de 2012

NEM OS GREGOS SABEM MAIS O QUE DESEJAM: FICAR OU SAIR DA ZONA DO EURO?

Políticos gregos debatem o desastre eleitoral: "Se sairmos do euro, tudo ficará pior"
Der Spiegel
A Grécia está à beira do colapso econômico, mas mesmo assim a esquerda do país quer eliminar as medidas de austeridade. Isso deixaria alguma alternativa fora a saída do euro? A “Spiegel Online” convidou o líder do partido Drasi pró-negócios da Grécia e uma parlamentar do Syriza antiausteridade para debater as questões.
Imagine: um país se vê atolado em uma crise existencial e partidos políticos diametralmente opostos são encarregados de formar um governo.
Esse é exatamente o desafio enfrentado atualmente pela Grécia. O partido conservador Nea Dimokratia (Nova Democracia) e o socialista PASOK tentaram em vão convencer o esquerdista radical Syriza a se juntar na formação de um governo viável. Todas as tentativas de negociação com o segundo partido mais forte do país fracassaram e a Grécia agora enfrenta uma nova eleição em junho.
A maior questão na votação será sobre se o povo grego deseja que o país continue implantando as medidas rígidas de austeridade que aceitaram em troca do dinheiro de resgate da União Europeia e do Fundo Monetário Internacional, ou se querem simplesmente sair da zona do euro.
A “Spiegel Online” convidou representantes dos dois campos políticos na Grécia que estão nos dois extremos do debate da questão. Stefanos Manos, que lidera o partido Drasi (Ação) pró-negócios, e Despoina Charalambidou, parlamentar pelo partido radical de esquerda Syriza, se encontraram pelo Skype para expressar suas opiniões.
Vestido em traje de negócios, Manos fez o login em seu elegante apartamento em Atenas, enquanto Charalambidou se conectou em seu escritório em um dos bairros operários de Thessaloniki. Os políticos discutiram amargamente, mas se mostraram surpreendentemente unidos em vários pontos.
Spiegel Online: Sra. Charalambidou, sr. Manos, aproximadamente 80% dos gregos querem permanecer no euro. Ao mesmo tempo, a maioria é contra as medidas de austeridade impostas pela União Europeia. Seria possível para a Grécia permanecer na zona do euro caso renegue seus contratos com a União Europeia e com o Fundo Monetário Internacional (FMI)?
Manos: Se amanhã dissermos, “Olá, queremos voltar atrás em nosso acordo”, então sairíamos do euro. Nós poderíamos, é claro, tentar mudar o pacote de austeridade e suas condições. Mas para isso precisamos de pelo menos um superávit primário –isto é, superávit orçamentário após a dedução dos juros dos empréstimos. Para isso, nós temos que primeiro implantar reformas drásticas.
Charalambidou: No Syriza nós dizemos que os acordos com a chamada tróica (a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional) devem ser imediatamente dissolvidos. O plano de resgate condena o povo grego à miséria, desemprego e o estimula a emigrar. As dívidas não foram criadas pelos trabalhadores comuns e, portanto, também não devem ser pagas por eles. Nem um único euro do dinheiro da ajuda será usado para salários, aposentadorias, para o sistema de saúde ou para a educação. O dinheiro está sendo usado para rolagem da dívida e para o pagamento de juros extorsivos. O alerta “medidas de austeridade ou a dracma” serve apenas para assustar os gregos.
Manos: A sra. Charalambidou prova o quanto os desejos e realidade estão distantes na Grécia. A montanha ilegal de dívida da qual o Syriza fala surgiu quase que exclusivamente porque os gregos viviam um padrão de vida acima do que ganhavam. Apenas quando admitirmos isso é que começaremos lentamente a reconstruir nossa economia. Se condenarmos nossas obrigações junto aos europeus que nos ajudaram, então estaremos enganando e prejudicando a nós mesmos. E então sairemos do euro e da União Europeia.
Charalambidou: Mas por que devemos sempre depender dos mesmos credores? Nós vivemos em um mundo globalizado e poderíamos obter empréstimos com condições melhores junto a outros parceiros. E quanto à Rússia e a China, por exemplo?
Manos: Essa é outra ilusão. Nós não receberíamos um único rublo ou yuan desses países antes da Grécia implantar reformas. Além disso, com a ajuda europeia nós estamos recebendo dinheiro em condições que o mercado nunca concederia. Se não cumprirmos nossas obrigações de austeridade, então nem mesmo (o presidente da Venezuela) Hugo Chávez nos dará dinheiro.
Spiegel Online: Mesmo assim, a estratégia dura de economia da tróica não parece estar funcionando. Ela deveria ser alterada?
Manos: Fora o pagamento de juros, nós temos que arrecadar mais do que gastamos. Aí poderemos reduzir impostos, revogar acordos – e fazer tudo o que o líder do Syriza, Alexis Tsipras, e a sra. Charalambidou sonham. E como podemos fazer isso? Cortando tudo o que não precisamos e não faz nada por nós.
Charalambidou: Eu concordo com você que precisamos primeiro obter ordem. Mas isso não muda o fato de que, no momento, a Grécia tem mais de 1 milhão de desempregados. Eu sou um deles. No ano passado, eu perdi meu emprego na indústria de vestuário. Por um ano eu recebi o seguro desemprego de 460 euros por mês. Isso foi recentemente reduzido para 360 euros. Eu tenho procurado desesperadamente por trabalho –mas simplesmente não há. Meu filho se mudou para a Alemanha após dois anos procurando emprego sem sucesso. Minha filha trabalha meio expediente –12 horas por semana– apesar de ter ensino superior e dominar língua estrangeira. Você, sr. Manos, juntamente com outros apoiadores das medidas de austeridade, estão apoiando a destruição da vida de trabalhadores e aposentados, assim como a partida de gregos do país e apoiando empresas que pagam muitos poucos impostos.
Manos: Eu estou ciente de que essas questões são problemas, mas também acredito que posso representar melhor os interesses dos trabalhadores do que Tsipras, o líder do Syriza. Muitos desses problemas surgiram porque os socialistas não quiseram realizar cortes no setor público. E Tsipras insiste nas mesmas ideias. O setor público é um monstro que está devorando o dinheiro do contribuinte. Enquanto isso, as pequenas empresas são forçadas a fechar suas portas porque estão pagando impostos demais.
Spiegel Online: Muitas pessoas agora estão dizendo que não faz diferença se a Grécia tem o euro ou a dracma, já que de qualquer forma ainda permanecem pobres e desempregadas. Elas citam os economistas que dizem que a Grécia poderia melhorar suas exportações e ficar em pé mais rapidamente com a dracma mais fraca. Qual é a opinião de vocês?
Manos: Se deixarmos o euro, tudo piorará. A Grécia dificilmente conseguiria mais crédito. Tudo ficaria bem mais caro com a desvalorização da dracma. Pense nisso: quase tudo que consumimos é importado. E o que temos para exportar? Nós sempre fomos fracos nas exportações. Nós perdemos nossa competitividade e essa é a triste verdade. Não basta –como pede a tróica– que cortemos salários. Por que os alemães e suíços estão se saindo tão bem? Por que eles produzem produtos desejáveis. Nós não temos produtos de ponta. Nós precisamos de uma mudança de cultura e essas mudanças são o que há de bom nas políticas de austeridade.
Charalambidou: Não se trata do euro para nós. Nós estamos interessados em tornar possível uma vida digna para as pessoas. Nós não queremos que a Grécia volte a ser como era nos anos 60, quando as pessoas emigravam para a Alemanha por uma chance de um futuro melhor.
Manos: Eu concordo 100% com você nesse ponto. E como você planeja conseguir isso?
Charalambidou: Nós precisamos de justiça tributária – especialmente quando se trata de cobrar impostos das empresas de navegação e dos empresários ricos.
Manos: Com o Syriza, vocês têm uma chance realista de participar do governo. Vocês deveriam ajustar suas ilusões à realidade.
Spiegel Online: Vocês apostariam que a Grécia ainda estará na zona do euro daqui um ano?
Manos: Se o povo grego continuar por esse caminho de negação da realidade, governado por ilusões, então nós estaremos fora do euro daqui um ano.
Charalambidou: Eu não ouso fazer uma previsão a respeito. Nós queremos uma Europa diferente, na qual as pessoas exerçam o papel principal – não as elites políticas e econômicas.
Tradução: George El Khouri Andolfato

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