C.J. Chivers e Eric Schmitt - NYT
Manu Brabo/AP
Soldado do Exército Livre da Síria carrega sua arma no norte da província de Aleppo, na Síria
A Arábia Saudita financiou uma grande compra de armas de infantaria da Croácia e as enviou discretamente para os combatentes antigoverno na Síria, em um esforço para romper o impasse sangrento que permitiu ao presidente Bashar Assad se manter no poder, segundo autoridades americanas e ocidentais familiarizadas com as compras.
As armas começaram a chegar aos rebeldes em dezembro, através da Jordânia, disseram as autoridades, e foram um fator para os pequenos ganhos táticos dos rebeldes nos últimos meses contra o exército e as milícias leais a Assad.
As transferências de armas parecem sinalizar uma mudança de postura entre vários governos para uma abordagem mais ativa no auxílio à oposição armada na Síria, em parte como um esforço para responder aos envios de armas do Irã para as forças de Assad. A distribuição de armas foi feita principalmente para os grupos vistos como nacionalistas e seculares, e parece contornar os grupos jihadistas, cujo papel na guerra alarmou as potências regionais e ocidentais.
Por meses, as capitais regionais e do Ocidente evitaram armar os rebeldes, em parte pelo temor de que as armas caíssem nas mãos de terroristas. Mas as autoridades disseram que a decisão de enviar mais armas visa tratar de outro temor no Ocidente, o do papel dos grupos jihadistas na oposição. Esses grupos eram vistos como mais bem equipados do que muitos combatentes nacionalistas e, potencialmente, mais influentes.
A ação também sinaliza o reconhecimento entre os apoiadores árabes e ocidentais dos rebeldes de que o sucesso da oposição em afastar os militares de Assad de grande parte do norte da Síria até meados do ano passado, deu lugar a uma campanha lenta, desgastante, na qual a oposição continua em inferioridade de armas e os custos humanos continuam aumentando.
O papel de Washington no envio de armas, se é que há algum, não está claro. Autoridades na Europa e nos Estados Unidos, incluindo as da CIA, citaram a sensibilidade do envio de armas e se recusaram a comentar publicamente.
Mas um alto funcionário americano descreveu os envios como "um amadurecimento dos canais logísticos da oposição". O funcionário notou que a oposição continua fragmentada e operacionalmente incoerente, e acrescentou que a compra recente pelos sauditas "não representa um ponto de virada".
"Eu continuo convencido de que não estamos próximos desse ponto de virada", disse o funcionário.
O funcionário acrescentou que o Irã, com seus envios de armas para o governo sírio, ainda supera o que os países árabes enviaram aos rebeldes.
As transferências de armas iranianas alimentam preocupações entre os países árabes sunitas sobre perderem terreno para Teerã, no que se tornou uma disputa regional pela primazia na Síria entre os árabes sunitas e o governo Assad e o Hizbollah no Líbano apoiados pelo Irã.
Outra autoridade americana disse que o Irã envia aviões carregados de armas para a Síria de modo tão rotineiro a ponto de se referirem a eles como "entrega de leite". Vários voos foram feitos por um Boeing da força aérea iraniana usando o nome de Maharaj Airlines, ele disse.
Apesar dos países do Golfo Pérsico enviarem equipamento militar e assistência adicional aos rebeles há mais de um ano, a diferença entre os envios é, em parte, de escala. As autoridades disseram que múltiplos voos carregados de armas partiram da Croácia desde dezembro, quando muitas armas iugoslavas, antes não vistas na guerra civil síria, começaram a aparecer nos vídeos postados pelos rebeldes no YouTube.
Muitas das armas –que incluem um tipo específico de arma sem recuo de fabricação iugoslava, assim como fuzis de assalto, lançadores de granada, metralhadoras, morteiros e lançadores portáteis de foguetes para uso contra tanques e outros veículos blindados– foram extensamente documentadas por um blogueiro, Eliot Higgins, que escreve sob o nome de Brown Moses e mapeou a disseminação das novas armas no conflito.
Ele começou a notar as novas armas no início de janeiro, nos choques na região de Daraa, próxima da Jordânia, mas em fevereiro ele passou a vê-las nos vídeos postados pelos rebeldes combatendo nas regiões de Hama, Idlib e Aleppo.
Autoridades familiarizadas com as transferências disseram que as armas fazem parte de um excedente não declarado na Croácia das guerras dos Bálcãs dos anos 90. Uma autoridade ocidental disse que os envios incluem "milhares de fuzis e centenas de metralhadoras", assim como uma quantidade desconhecida de munição.
O Ministério das Relações Exteriores da Croácia e a agência exportadora de armas negaram a ocorrência de qualquer envio. As autoridades sauditas recusaram os pedidos de entrevista sobre os envios por duas semanas. Autoridades jordanianas também se recusaram a comentar.
Danijela Barisic, uma porta-voz do Ministério das Relações Exteriores croata, disse que desde o início da Primavera Árabe, a Croácia não vendeu nenhuma arma nem para a Arábia Saudita e nem para os rebeldes sírios. "Nós não fornecemos armas", ela disse por telefone.
Igor Tabak, um analista militar croata, disse que após um período em que muitos países da antiga Iugoslávia vendiam armas das guerras nos Bálcãs no mercado negro, a Croácia, que deverá ingressar neste ano na União Europeia, agora cumpre rigidamente as regras internacionais para transferências de armas.
"Eu não consigo imaginar a transferência de grandes quantidades de armas sem aprovação do Estado", ele disse. "Não é impossível, mas é bastante improvável." Ele acrescentou que é possível que as armas possam ter sido transferidas por meio dos serviços de inteligência, apesar dele não dispor de evidência de que se trata disso.
Os rebeldes na Síria adquiriram suas armas de várias formas, incluindo contrabando pelos países vizinhos, captura no campo de batalha, compras junto a oficiais e autoridades sírias corruptas, patrocínio por governos e empresários árabes, e fabricação local de foguetes e bombas rudimentares. Mas eles permanecem pouco equipados em comparação às forças armadas convencionais do governo, e são propensos a escassez.
Uma autoridade em Washington disse que a possibilidade de transferências dos Bálcãs foi apresentada no ano passado, quando um autoridade croata visitou Washington e sugeriu às autoridades americanas que a Croácia dispunha de muitas armas caso alguém estivesse interessado em transferi-las para os rebeldes sírios.
Na época, os rebeldes estavam avançando lentamente em partes do país, mas tinham dificuldade em manter o momento em meio à escassez de armas e munição.
Washington não demonstrou interesse na ocasião, disse o funcionário, apesar de na mesma época já haver sinais de assistência militar árabe e estrangeira limitada.
Tanto cartuchos de fuzil de fabricação ucraniana comprados pela Arábia Saudita quanto granadas de fabricação suíça fornecidas pelos Emirados Árabes Unidos foram encontrados pelos jornalistas entre os rebeldes.
E fuzis de fabricação belga, de um tipo não conhecido, foram comprados pelas forças armadas da Síria e foram repetidamente vistos em mãos rebeldes, sugerindo que um dos compradores anteriores dos fuzis belgas transferiu as armas populares para os rebeldes.
Várias autoridades disseram não ter visto um afluxo tão visível de novas armas como viram nas últimas semanas.
Em dezembro, enquanto os refugiados atravessavam a fronteira síria para a Turquia e Jordânia, em meio a crescentes sinais de uma crise humanitária no inverno, as armas croatas voltaram a aparecer, disse uma autoridade familiarizada com as transferências.
Uma autoridade ocidental familiarizada com as transferências disse que os participantes hesitam em discuti-las porque a Arábia Saudita, que a autoridade disse ter financiado as compras, insiste no sigilo.
O "Jutarnji list", um jornal croata, noticiou no sábado que nos últimos meses foi visto um número incomumente elevado de aviões de carga jordanianos no Aeroporto Pleso, em Zagreb, a capital da Croácia.
O jornal disse que os Estados Unidos, os principais aliados políticos e militares da Croácia, possivelmente foram os intermediários, e mencionou a presença por quatro vezes do avião Ilyushin 76, de propriedade da Jordan International Air Cargo, no Aeroporto Pleso. Ele disse que o avião foi visto em 14 e 23 de dezembro, em 6 de janeiro e 18 de fevereiro. Ivica Nekic, diretor da agência encarregada pelas exportações de armas na Croácia, negou a reportagem croata como sendo especulação.
Tradutor: George El Khouri Andolfato
Soldado do Exército Livre da Síria carrega sua arma no norte da província de Aleppo, na Síria
A Arábia Saudita financiou uma grande compra de armas de infantaria da Croácia e as enviou discretamente para os combatentes antigoverno na Síria, em um esforço para romper o impasse sangrento que permitiu ao presidente Bashar Assad se manter no poder, segundo autoridades americanas e ocidentais familiarizadas com as compras.
As armas começaram a chegar aos rebeldes em dezembro, através da Jordânia, disseram as autoridades, e foram um fator para os pequenos ganhos táticos dos rebeldes nos últimos meses contra o exército e as milícias leais a Assad.
As transferências de armas parecem sinalizar uma mudança de postura entre vários governos para uma abordagem mais ativa no auxílio à oposição armada na Síria, em parte como um esforço para responder aos envios de armas do Irã para as forças de Assad. A distribuição de armas foi feita principalmente para os grupos vistos como nacionalistas e seculares, e parece contornar os grupos jihadistas, cujo papel na guerra alarmou as potências regionais e ocidentais.
Por meses, as capitais regionais e do Ocidente evitaram armar os rebeldes, em parte pelo temor de que as armas caíssem nas mãos de terroristas. Mas as autoridades disseram que a decisão de enviar mais armas visa tratar de outro temor no Ocidente, o do papel dos grupos jihadistas na oposição. Esses grupos eram vistos como mais bem equipados do que muitos combatentes nacionalistas e, potencialmente, mais influentes.
A ação também sinaliza o reconhecimento entre os apoiadores árabes e ocidentais dos rebeldes de que o sucesso da oposição em afastar os militares de Assad de grande parte do norte da Síria até meados do ano passado, deu lugar a uma campanha lenta, desgastante, na qual a oposição continua em inferioridade de armas e os custos humanos continuam aumentando.
O papel de Washington no envio de armas, se é que há algum, não está claro. Autoridades na Europa e nos Estados Unidos, incluindo as da CIA, citaram a sensibilidade do envio de armas e se recusaram a comentar publicamente.
Mas um alto funcionário americano descreveu os envios como "um amadurecimento dos canais logísticos da oposição". O funcionário notou que a oposição continua fragmentada e operacionalmente incoerente, e acrescentou que a compra recente pelos sauditas "não representa um ponto de virada".
"Eu continuo convencido de que não estamos próximos desse ponto de virada", disse o funcionário.
O funcionário acrescentou que o Irã, com seus envios de armas para o governo sírio, ainda supera o que os países árabes enviaram aos rebeldes.
As transferências de armas iranianas alimentam preocupações entre os países árabes sunitas sobre perderem terreno para Teerã, no que se tornou uma disputa regional pela primazia na Síria entre os árabes sunitas e o governo Assad e o Hizbollah no Líbano apoiados pelo Irã.
Outra autoridade americana disse que o Irã envia aviões carregados de armas para a Síria de modo tão rotineiro a ponto de se referirem a eles como "entrega de leite". Vários voos foram feitos por um Boeing da força aérea iraniana usando o nome de Maharaj Airlines, ele disse.
Apesar dos países do Golfo Pérsico enviarem equipamento militar e assistência adicional aos rebeles há mais de um ano, a diferença entre os envios é, em parte, de escala. As autoridades disseram que múltiplos voos carregados de armas partiram da Croácia desde dezembro, quando muitas armas iugoslavas, antes não vistas na guerra civil síria, começaram a aparecer nos vídeos postados pelos rebeldes no YouTube.
Muitas das armas –que incluem um tipo específico de arma sem recuo de fabricação iugoslava, assim como fuzis de assalto, lançadores de granada, metralhadoras, morteiros e lançadores portáteis de foguetes para uso contra tanques e outros veículos blindados– foram extensamente documentadas por um blogueiro, Eliot Higgins, que escreve sob o nome de Brown Moses e mapeou a disseminação das novas armas no conflito.
Ele começou a notar as novas armas no início de janeiro, nos choques na região de Daraa, próxima da Jordânia, mas em fevereiro ele passou a vê-las nos vídeos postados pelos rebeldes combatendo nas regiões de Hama, Idlib e Aleppo.
Autoridades familiarizadas com as transferências disseram que as armas fazem parte de um excedente não declarado na Croácia das guerras dos Bálcãs dos anos 90. Uma autoridade ocidental disse que os envios incluem "milhares de fuzis e centenas de metralhadoras", assim como uma quantidade desconhecida de munição.
O Ministério das Relações Exteriores da Croácia e a agência exportadora de armas negaram a ocorrência de qualquer envio. As autoridades sauditas recusaram os pedidos de entrevista sobre os envios por duas semanas. Autoridades jordanianas também se recusaram a comentar.
Danijela Barisic, uma porta-voz do Ministério das Relações Exteriores croata, disse que desde o início da Primavera Árabe, a Croácia não vendeu nenhuma arma nem para a Arábia Saudita e nem para os rebeldes sírios. "Nós não fornecemos armas", ela disse por telefone.
Igor Tabak, um analista militar croata, disse que após um período em que muitos países da antiga Iugoslávia vendiam armas das guerras nos Bálcãs no mercado negro, a Croácia, que deverá ingressar neste ano na União Europeia, agora cumpre rigidamente as regras internacionais para transferências de armas.
"Eu não consigo imaginar a transferência de grandes quantidades de armas sem aprovação do Estado", ele disse. "Não é impossível, mas é bastante improvável." Ele acrescentou que é possível que as armas possam ter sido transferidas por meio dos serviços de inteligência, apesar dele não dispor de evidência de que se trata disso.
Os rebeldes na Síria adquiriram suas armas de várias formas, incluindo contrabando pelos países vizinhos, captura no campo de batalha, compras junto a oficiais e autoridades sírias corruptas, patrocínio por governos e empresários árabes, e fabricação local de foguetes e bombas rudimentares. Mas eles permanecem pouco equipados em comparação às forças armadas convencionais do governo, e são propensos a escassez.
Uma autoridade em Washington disse que a possibilidade de transferências dos Bálcãs foi apresentada no ano passado, quando um autoridade croata visitou Washington e sugeriu às autoridades americanas que a Croácia dispunha de muitas armas caso alguém estivesse interessado em transferi-las para os rebeldes sírios.
Na época, os rebeldes estavam avançando lentamente em partes do país, mas tinham dificuldade em manter o momento em meio à escassez de armas e munição.
Washington não demonstrou interesse na ocasião, disse o funcionário, apesar de na mesma época já haver sinais de assistência militar árabe e estrangeira limitada.
Tanto cartuchos de fuzil de fabricação ucraniana comprados pela Arábia Saudita quanto granadas de fabricação suíça fornecidas pelos Emirados Árabes Unidos foram encontrados pelos jornalistas entre os rebeldes.
E fuzis de fabricação belga, de um tipo não conhecido, foram comprados pelas forças armadas da Síria e foram repetidamente vistos em mãos rebeldes, sugerindo que um dos compradores anteriores dos fuzis belgas transferiu as armas populares para os rebeldes.
Várias autoridades disseram não ter visto um afluxo tão visível de novas armas como viram nas últimas semanas.
Em dezembro, enquanto os refugiados atravessavam a fronteira síria para a Turquia e Jordânia, em meio a crescentes sinais de uma crise humanitária no inverno, as armas croatas voltaram a aparecer, disse uma autoridade familiarizada com as transferências.
Uma autoridade ocidental familiarizada com as transferências disse que os participantes hesitam em discuti-las porque a Arábia Saudita, que a autoridade disse ter financiado as compras, insiste no sigilo.
O "Jutarnji list", um jornal croata, noticiou no sábado que nos últimos meses foi visto um número incomumente elevado de aviões de carga jordanianos no Aeroporto Pleso, em Zagreb, a capital da Croácia.
O jornal disse que os Estados Unidos, os principais aliados políticos e militares da Croácia, possivelmente foram os intermediários, e mencionou a presença por quatro vezes do avião Ilyushin 76, de propriedade da Jordan International Air Cargo, no Aeroporto Pleso. Ele disse que o avião foi visto em 14 e 23 de dezembro, em 6 de janeiro e 18 de fevereiro. Ivica Nekic, diretor da agência encarregada pelas exportações de armas na Croácia, negou a reportagem croata como sendo especulação.
Tradutor: George El Khouri Andolfato
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