quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Conflitos agravam crise da produção de gás e petróleo no norte da África
Stanley Reed - IHT
Louafi Larbi/Reuters

Soldados argelinos fazem guarda ao lado de carros danificados que eram usados por militantes extremistas, perto do campo de gás de In Amenas, no sudeste da Argélia. O campo foi sequestrado por rebeldes em janeiro deste anoSoldados argelinos fazem guarda ao lado de carros danificados que eram usados por militantes extremistas, perto do campo de gás de In Amenas, no sudeste da Argélia. O campo foi sequestrado por rebeldes em janeiro deste ano
O ataque mortal desferido por militantes em uma unidade produtora de gás natural na Argélia, no mês passado, provocou um grande revés para um grupo de países do norte da África cujas perspectivas como produtores de petróleo e gás já se mostravam nebulosas.
Alguns anos atrás, Argélia, Líbia e Egito pareciam representar grande parte da solução para a decrescente produção de gás natural da Europa e sua dependência desconfortável da Rússia em relação ao fornecimento de um combustível amplamente utilizado na indústria, na geração de energia elétrica e no aquecimento doméstico.
Mas, bem antes de dezenas de invasores atacarem, nas primeiras horas da manhã, a instalação de gás de In Amenas – localizada nas profundezas do Saara –, a difícil realidade política da região já provocava dúvidas sobre a dimensão do papel que a África do Norte poderia desempenhar na equação energética mundial.
A produção de petróleo e gás natural está em declínio na Argélia, país que é o maior produtor de gás da região, desde meados da década de 2000. Na Líbia, a insurreição que derrubou o coronel Muammar Gaddafi, seguida por seu resultado caótico, tem atrapalhado a exploração de petróleo e gás. No Egito, o aumento do consumo interno, estimulado por políticas governamentais, reduziu as exportações do país.
"Até o final desta década haverá uma grande dúvida sobre o quanto a Europa poderá contar com o gás proveniente do norte da África", disse Jonathan P. Stern, presidente do programa de gás no Instituto Oxford para Estudos sobre Energia, referência no campo de pesquisa. "A Europa certamente não poderá contar com a expansão do fornecimento de gás por parte do norte da África. O mais provável é que ocorra uma contração".
Durante o ataque dos militantes às instalações de In Amenas e a ação das Forças Armadas argelinas para retomar a planta, 40 trabalhadores e 29 insurgentes foram mortos. A unidade – que pertence às empresas BP, Statoil, da Noruega, e Sonatrach, empresa estatal de energia da Argélia – ainda não retomou suas atividades. O campo de gás e o centro de processamento da planta respondiam por cerca de 10% da produção da Argélia, mas até agora a paralisação teve pouco efeito sobre as exportações do país.
"A Argélia ainda tem capacidade para aumentar ou diminuir sua produção durante curtos períodos de tempo", disse Femi Oso, analista da Wood Mackenzie, empresa de consultoria para o setor de energia de Edimburgo, na Escócia.
A Argélia reinjeta uma parte substancial do gás que explora em seus campos de petróleo e de gás para manter a pressão. Oso disse que atualmente a Sonatrach já estava desviando parte desse gás para as exportações, mas, segundo ele, isso era apenas uma correção de curto prazo.
A Sonatrach está pressionando para que a planta que foi danificada durante a explosão seja reparada e reaberta.
Mas se grande parte da planta permanecer fechada durante muito tempo, ou se houver outro ataque à infraestrutura de produção de energia da Argélia, as exportações vão ser prejudicadas e isso possivelmente gerará uma alta nos preços praticados na Europa, dizem analistas.
"O que verificamos em regiões geopolíticas problemáticas é que a infraestrutura de gasodutos e oleodutos são os alvos mais vulneráveis", disse Rob West, analista da Bernstein Research de Londres. "Dutos são muito difíceis de proteger".
A principal preocupação para a Argélia e para outros países do Norte da África é que o ataque em In Amenas, ocorrido após dois anos de instabilidade política, continue desestimulando os investimentos estrangeiros de que os países da região precisam para manter sua posição de exportadores de petróleo e de gás.
As empresas ocidentais do setor de energia já estavam torcendo o nariz para as duras cláusulas contratuais praticadas pela Argélia, que concedem ao governo do país mais de 90% das receitas de produção de petróleo e gás natural e exigem que a Sonatrach tenha uma participação majoritária em todos os projetos.
No mais recente leilão para a concessão de blocos de exploração de petróleo e gás na Argélia, em 2011, apenas 2 dos 10 blocos de exploração encontraram compradores – e um deles ficou com a Sonatrach.
"Os termos fiscais são tão duros que as petrolíferas internacionais não acreditam que serão capazes de ganhar dinheiro", disse Oso, analista da Wood Mackenzie.
Chakib Khelil, ex-ministro da Energia da Argélia, tentou transformar os investimentos nos campos de petróleo e gás de menor porte do país mais atraentes para as empresas internacionais, permitindo que elas obtivessem participações maiores nesses projetos de produção de energia.
Mas as alterações implementadas por ele foram revertidas, e um imposto sobre lucros extraordinários foi estabelecido para a produção de petróleo e gás. No final da década passada, a Sonatrach foi abalada por uma investigação relacionada a corrupção, que levou à saída de seu principal executivo, Mohamed Meziane, e de vários de seus principais assessores.
Recentemente, a investigação se disseminou para a Saipem, subsidiária de serviços petrolíferos da Eni, a petrolífera estatal italiana. Promotores italianos e argelinos estão investigando para descobrir se a Saipem pagou propina (na forma de contratos de bilhões de dólares) aos executivos da Sonatrach. Executivos de empresas petrolíferas dizem que a burocracia argelina para o setor foi paralisada pelo inquérito.
A produção de gás da Argélia diminuiu cerca de 12% desde 2005, enquanto o consumo interno cresceu rapidamente graças, em parte, aos preços subsidiados. Isso ajudou a corroer as exportações do país. A Argélia viu a sua fatia do mercado mundial de gás natural liquefeito, no qual foi pioneira em 1960, recuar para menos de 5%, de acordo com a PFC Energy, empresa de pesquisa de energia de Washington. Esse percentual é bem inferior aos 19% registrados em 2002.
A fatia da Argélia nas importações de gás da Europa também caiu para 9% em 2012, a partir de cerca de 12% em 2002. Os maiores clientes da Argélia são a Itália e a Espanha, cujas debilitadas economias minaram a demanda por gás.
Depois de assistir a Primavera Árabe varrer do mapa regimes de países vizinhos, o governo argelino está fazendo um exame de consciência. O novo primeiro-ministro do país, Abdelmalek Sellal, está tentando reconstruir a reputação do país diante dos investidores estrangeiros. Ele conseguiu aprovar mudanças no regime de tributação de petróleo e gás para aliviar seus aspectos mais punitivos.
"Até os acontecimentos registrados em In Amenas, 2013 parecia que seria um bom ano", disse Geoffrey D. Porter, da North Africa Risk Consulting, empresa de Nova York que assessora companhias que atuam no Norte da África.
A Líbia também tem sido uma decepção para a preocupação ocidental relacionada à oferta de petróleo. Os executivos do setor acreditam que o país pode ter enormes reservas de petróleo e gás, mas eles ficaram decepcionados com os resultados das explorações realizadas nos anos anteriores à queda de Gaddafi, em 2011.
Atualmente, a produção do país está em um patamar que equivale a 90% da produção pré-revolução, mas há uma atmosfera de desconforto no ar. A BP adquiriu o direito de explorar enormes faixas de deserto em 2007, mas recentemente decidiu adiar a perfuração de seu primeiro poço exploratório em uma área não muito distante da planta de In Amenas. Quatro empregados da BP foram mortos em In Amenas.
O Egito, país localizado a leste da Líbia, com a qual faz fronteira, entrou forte na produção de gás em meados da década de 2000. Mas as exportações egípcias atingiram seu pico em 2009 e, em seguida, caíram rapidamente.
Mas a política do governo, e não a segurança, é a principal preocupação no Egito. O preço do gás para a venda no mercado interno, estipulado pelo governo, corresponde a cerca de 20% do preço praticado na Europa. Isso incentiva o consumo interno, deixando pouco disponível gás para a exportação.
Alguns executivos acreditam que há reservas abundantes nas águas mais profundas do Mar Mediterrâneo, mas dizem que o regime de preços do Egito não lhes oferece retorno suficiente.
Consideradas em conjunto, essas circunstâncias "solidificam o ponto de vista da Europa de que o Norte de África não vai ser uma fonte confiável e barata para o fornecimento (de combustíveis)", disse Mariam Al-Shamma, analista da PFC Energy.
Os Estados Unidos agora estão próximos da autossuficiência em gás, como resultado do boom do gás de xisto, mas a Europa depende fortemente das importações. Essa dependência tende a aumentar nos próximos anos, à medida que a produção doméstica diminuir e – quando a economia do continente se recuperar – a demanda começar a subir novamente. A Agência Internacional de Energia prevê que, em 2030, a União Europeia terá que importar 80% das suas necessidades de gás natural, contra cerca de 60% atualmente.
Se a Europa não puder recorrer ao norte de África, poderá buscar combustível em outro lugar.
O mercado mundial de gás natural liquefeito tende a crescer, pois os Estados Unidos e o Canadá devem se tornar grandes exportadores. Grandes e novos campos foram encontrados no mar de Israel, e a exploração na costa do Chipre está começando.
Mas a fonte mais óbvia é a Rússia, que já detém 54% do mercado europeu de importação de gás.
A Gazprom, gigante do setor de gás controlada pelo governo russo, está sendo investigada pela Comissão Europeia, que pretende verificar se a empresa impõe preços abusivos a clientes da Europa Central e Oriental. Mas a capacidade da Gazprom de influenciar o mercado só deve aumentar.
"A Rússia terá, durante um períodos de tempo significativos, poder substancial para impactar os preços caso decida fornecer ou reter volumes de combustível para o mercado", disse Stern, do Instituto Oxford.
Tradutor: Cláudia Gonçalves

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