Com ataque, Obama fará arriscada aliança com radicais
IGOR GIELOW - FSP
Entre os diversos sortilégios oriundos do pandemônio sírio, um se destaca
pela incrível ironia.
Se realmente atacarem com mísseis, como aparentemente irão após o fim do
teatro no Conselho de Segurança, os EUA terão feito enfim uma aliança com seu
mais longevo inimigo, a rede terrorista Al Qaeda.
Um Barack Obama beligerante contra o regime de Bashar al-Assad irá favorecer
não só alas mais laicas do Exército Livre da Síria, mas também milícias
jihadistas.
O americano parece impelido pela inabilidade de ter estipulado a tal "linha
vermelha". E também pela tentação de enfraquecer o Irã, principal potência
regional a apoiar Assad, objetivo que move a Arábia Saudita, a Turquia e o Qatar
a apoiar os rebeldes.
De quebra, interessa aos EUA esvaziar a posição russa, que tem uma base naval
na Síria e a apoia há décadas.
Se na Líbia Obama utilizou fantoches europeus para fazer o serviço (seu
embaixador pagou a conta depois, sendo morto em um atentado em Benghazi, em
2012), atacar a Síria o colocará ao lado de gente como a Frente al-Nusra.
São membros da Al Qaeda, siameses ideológicos dos perpetradores dos atentados
de 11 de setembro de 2001.
Há também estimados 6.000 combatentes estrangeiros em solo, "mujahedin" que
vêm tendo acesso a mísseis antiaéreos portáteis russos fornecidos pelos inimigos
de Assad. Parece questão de tempo para isso gerar manchetes de outra natureza.
LIMITES
Também os limites da "expedição punitiva" com mísseis são duvidosos. Sem ação
terrestre, não há como eliminar as armas químicas --se é que foi Assad quem
ordenou seu uso; a história de cinismo e pragmatismo de sua dinastia parece não
condizer com algo tão primário, politicamente, quanto o ataque da semana
passada.
Um "aviso" a Assad seria inócuo se apenas simbólico. Algo maior poderia
enfraquecê-lo a ponto da deposição? Quem assume?
As fileiras rebeldes são fracionadas em linhas sectárias e políticas (curdos
contra sunitas, seculares contra religiosos etc.) que se odeiam. O precedente
líbio assombra.
Isso tudo sem contar o pior cenário de escalada, com a Síria envolvendo
Israel, com a ajuda do Hizbullah libanês e do Hamas palestino, ambos apoiados
pelo Irã.
Assad é um ditador brutal com seu povo. Mas se os humanistas de Facebook
correm a pedir ajuda dos mesmos EUA que demonizam como Grande Satã, é bom
lembrar que alianças com diabos de outras espécies podem gerar efeitos ainda
mais deletérios.
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