Hollande e as sanções contra o Irã
John Vinocur - Herald Tribune
Às vésperas da eleição presidencial francesa, o jornal iraniano Tehran Emrooz escreveu que “é preciso enfatizar as vantagens de uma vitória de François Hollande”.
Amplamente noticiado na imprensa francesa e na blogosfera, o comentário partiu de uma publicação que é descrita como sendo comandada pelo prefeito de Teerã, que é notoriamente próximo do líder supremo, aiatolá Ali Khamenei.
Alguns blogueiros franceses trataram isso como uma loucura. Mas o editoral teve um tom pragmático, nada histérico. “Uma vitória levará a uma flexibilização das políticas de Paris para com o Irã”, dizia. “A França de Sarkozy era a voz forte contra o Irã na União Europeia. A vitória de Hollande mudará sutilmente esta abordagem.”
Isso está exatamente correto em relação a Sarkozy.
Ele foi a mão que impulsionou a Europa a impor sanções sobre o petróleo iraniano, que devem entrar em vigor em 1º de julho. E se orgulhou dessas políticas, cutucando repetidas vezes a atitude do governo Obama, considerada pela França como iludida e lenta em relação ao ímpeto iraniano em direção às armas nucleares.
Enquanto Sarkozy era presidente, um relatório bipartidário da Assembleia Nacional francesa criticou o presidente Obama por perder tempo durante um ano inteiro na contagem regressiva nuclear com sua fracassada iniciativa de “mãos estendidas”. Os franceses propuseram um embargo sobre o petróleo iraniano na ONU e acabaram tendo seu projeto engavetado e substituído por uma proposta mais branda, sem embargo, dos Estados Unidos.
Nenhum país teve uma posição mais dura. A França acreditava que a melhor maneira de evitar um ataque israelense sobre as instalações nucleares do Irã era intensificar as sanções, ter cautela na diplomacia, e uma interpretação rígida das restrições impostas pelo Conselho de Segurança da ONU sobre as ambições atômicas dos mulás.
Mas e Hollande? Será que haverá atenuações nesta abordagem --exatamente o que o comentário iraniano espera-- que diluirão a linha dura francesa quanto à não-proliferação e às sanções?
A França considerou o passado de mentiras e irresponsabilidade do Irã como algo tão enraizado que estava disposta a ficar sozinha ao dizer que não poderia haver concessões ao barganhar com Teerã. Como resultado das conversas com os iranianos, ela rejeitou qualquer desvio possível dos pedidos do Conselho de Segurança pela suspensão de todo o enriquecimento de urânio do Irã, e o acesso “sem demora” dos inspetores da Agência Internacional de Energia Atômica a todos as instalações designadas como suspeitas pela agência.
Agora, o assunto vêm rapidamente à tona com um novo governo francês. Em 23 de maio, os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança e a Alemanha se encontrarão com o Irã em Bagdá. A questão de se a França continuará encabeçando as iniciativas de sanções e continuará sendo uma barreira de descrença em relação às intenções iranianas de renunciar ao programa nuclear desafia a importância dos latidos de Hollande em relação à renegociação da dívida da UE e ao programa de consolidação de déficit.
Você pode acreditar que os europeus se juntarão (tarde demais e de forma insuficiente) para produzir algumas medidas de crescimento sem destruir seu pacto de austeridade. Mas o fato de a França concordar em oferecer ao Irã o direito de manter a produção de urânio enriquecido em 3,5% ou 5% --o governo Obama quer propor isso como uma isca na busca de um acordo com o Irã, dizem relatos-- pode ser visto como uma capitulação francesa em relação à sua tradicional cultura anti-proliferação.
Poucas pessoas aqui acreditariam que o Ocidente pode conseguir como retribuição uma concessão iraniana para que as equipes de inspeção da AIEA tenham total liberdade. Além disso, durante o governo de Sarkozy, os franceses também disseram que será quase impossível controlar as cinco toneladas estocadas de urânio enriquecido a 3,5% do Irã (teoricamente passíveis de serem transformadas em armas nucleares com um processamento adicional).
As contradições da situação e suas implicações para a credibilidade e a ação independente francesa são grandes. Jean-Yves Le Drian, que é aparentemente a escolha de Hollande para ministro da defesa, disse a pequenos grupos em Washington há mais de um mês que um presidente socialista significaria que não haveria nenhuma mudança básica na política francesa em relação ao Irã. Mas esta semana conversei com um homem que havia acabado de falar com Hollande sobre o Irã. A impressão inequívoca de meu amigo foi que o presidente socialista estaria mais próximo da linha de Obama do que da de Sarkozy.
O futuro de Obama pode depender da questão do Irã até o dia das eleições em novembro, mas o de Hollande não, ele pode preferir um amigo consciente na Casa Branca a um republicano.
Isso não foi confirmado de forma alguma numa primeira entrevista com Hollande sobre o Irã feita por Jean-Marie Colombani, um ex-editor do Le Monde, para o site político Slate.fr. Nela, Hollande disse que não tinha críticas contra a “posição firme” de Sarkozy sobre a proliferação iraniana. Na verdade, ele disse que “a confirmaria com a mesma força e vontade”, e que as sanções “deveriam ser reforçadas pelo tempo que forem necessárias”. E acrescentou: “acredito que ainda é possível atingir o objetivo desejado através de negociações”.
Considerando as circunstâncias, esta é uma posição vaga por parte de um homem experiente numa imprecisão digna dos negociadores dos mulás. Qualquer que seja a posição final de Hollande, será impossível para os franceses, que foram tão claros por tanto tempo quanto ao Irã, esconderem uma mudança de política com um spray de ambiguidade que alteraria fundamentalmente --ou atenuaria, como disse o editorial do Tehran Emrooz-- a forma como o mundo lida com a ameaça nuclear do Irã.
Tradutor: Eloise De Vylder
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