sábado, 2 de fevereiro de 2013

Russos nostálgicos querem a volta de Stálin
Marie Jego - Le Monde
David Mdzinarishvili/Reuters
Retrato de Josef Stalin é levado a igreja em celebração que lembrou o 59º aniversário da morte do ex-líder russo
Retrato de Josef Stalin é levado a igreja em celebração que lembrou o 59º aniversário da morte do ex-líder russo
Aos 90 anos de idade, Konstantin Duvanov lembra como se tivesse sido ontem da rendição do marechal alemão Friedrich Paulus, que saiu de um subterrâneo de Stalingrado em ruínas para render-se ao Exército Vermelho, em 31 de janeiro de 1943.
O episódio marcou o fim da ofensiva da Wehrmacht contra a "Cidade de Stálin". Defendida até o último sopro dos "frontoviki", os soldados do exército soviético, a cidade mártir na margem oeste do Volga demonstrou ao resto do mundo que o avanço das tropas marrons não era incontível.
Instalado na sala de seu pequeno apartamento no segundo andar de uma residência da assistência social em um subúrbio de Volgogrado (a antiga Stalingrado), Duvanov relata: "Nesse dia detectei um veículo alemão com um bom aparelho de transmissão. Meu superior chegou a me avisar que duas ruas mais abaixo Paulus estava para se render. Fui para lá e o vi subir em seu carro.
Nesse momento, um de nossos rapazes apontou a arma contra ele, mas o comandante deteve seu gesto". Paulus salvou a vida; posteriormente, manifestaria sua rejeição ao regime nazista, deporia nos julgamentos de Nuremberg e, depois de viver um tempo na União Soviética, voltaria à Alemanha, instalando-se na República Democrática (o lado oriental).
A maior pena de Konstantin é que a cidade tenha mudado de nome em 1961, devido ao processo de desestalinização empreendido por Nikita Kruschev. "Seria preciso voltar a chamá-la Stalingrado. Foi Stalin quem ganhou a guerra, não Putin ou Medvedev." O veterano reconhece ter uma admiração sem limites pelo "czar vermelho", um "homem implacável" a quem as gerações jovens deveriam estar agradecidas.
Sobre a mesa da sala há uma carta de felicitações enviada pelo presidente Vladimir Putin por motivo do 70º aniversário do fim da batalha. O mandatário russo participará das cerimônias em Volgogrado neste sábado (2). Konstantin também estará presente.
"Putin é um digno herdeiro de Stalin, mas tem a alma suave demais", lamenta o idoso. "Em 1945 vencemos graças a nosso chefe. Para que as coisas funcionem bem, um só deve falar e os demais, escutar." Isso também vale para a entrevista: "Olhe nos meus olhos e não me interrompa", ordena à repórter.
Na pequena praça adjacente à Praça dos "Combatentes caídos no campo de honra", uma esquadra de varredores, com coletes cor de laranja fluorescente, defende a chama do monumento dos ataques da neve. Toda a cidade se prepara para a comemoração.
À mesa de um café não distante da praça, Boris Stijin, 22, parece indiferente aos preparativos. Rebatizar a cidade como Stalingrado não o entusiasma. Há tarefas mais urgentes: o reparo das estradas - "mais deterioradas em Volgogrado do que nas regiões vizinhas" -, a luta contra a corrupção.
Empregado em uma empresa de construção, ele ganha bem a vida e não partiria de Volgogrado por nada do mundo. "Nem tudo é perfeito, mas só nós podemos mudar o rumo das coisas", afirma. Ele constatou isso quando a empresa onde trabalha se viu assediada pelo fisco. Os patrões não se deixaram impressionar e recorreram ao tribunal de arbitragem, em vez de pagar um suborno ao fiscal de impostos.
"A Rússia precisa de mudanças fundamentais. O modelo paternalista está gasto; a infraestrutura industrial também. Aqui todos gostam de fachadas bonitas, mas atrás delas não há nada", lamenta o jovem. E depois se irrita: "A estabilidade, a justiça social... não estão falando sério. Nossos dirigentes querem regressar ao modelo czarista. Mas têm de escolher entre a modernização e o modelo arcaico".
Completamente reconstruído no estilo neoclássico stalinista pelos prisioneiros de guerra alemães, a cidade de um milhão de habitantes, mais bonita no centro antigo, forma uma faixa de terra de 100 quilômetros ao longo do Volga, a artéria femural da Rússia, largo como o mar. Uma única estrada atravessa o Volgogrado, quase sempre lotada.
No topo de Mamayev Kourgan, a alta colina em frente ao rio, o epicentro da batalha de Stalingrado, percebem-se as chaminés das fábricas. Quase nenhuma solta fumaça. A região, dotada pelo orçamento federal (70 das 83 regiões que formam a federação), não é muito dinâmica.
"A cidade perdeu seu brilho", estima Vadim Chabanov, 24 anos. Desempregado, ele sobrevive alugando seus serviços como operador de vídeo em festas de casamento. Sonha em abandonar a exígua moradia na qual vive com sua companheira, Maria, 22 anos, a mãe desta e uma avó doente, para ir morar em um apartamento mais cômodo, mas o elevador social parece não funcionar.
"A corrupção está em toda parte, desde o professor até o governador", coisa que o tira do juízo. Sua amiga Maria é estudante confirma que é preciso pagar 5 mil rublos para fazer um exame, o dobro para o diploma. "O resultado é que os estudantes pagam e não aprendem nada." A política não é seu forte. "Prefiro os esportes", explica o rapaz. A fraude nas eleições legislativas de dezembro de 2011 o preocupou. Mas depois, um vídeo que viu no YouTube o convenceu de que a denúncia de fraude eleitoral não passava de uma manipulação "orquestrada do exterior".
Agora Vadim sabe que "os restaurantes da rede McDonald's na Rússia têm refúgios antiaéreos, o que prova que a possibilidade de uma nova guerra mundial não desapareceu totalmente. Decepcionado, ele admite não ter "confiança em ninguém", pois na Rússia "os dirigentes são ilegítimos e a oposição está nas mãos de provocadores".
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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