quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Banco privado evita risco e preserva lucro
Itaú lucra R$ 4,02 bi no terceiro trimestre, auxiliado por crédito imobiliário, consignado e para grandes empresas
Estratégia, similar à de Bradesco e Santander, traz ganho menor ante competição de banco público e desaceleração
TONI SCIARRETTA E ANDERSON FIGO - FSP 
Financiamento imobiliário, consignado e empréstimos a grandes empresas. Essa é a nova cara do crédito nos bancos privados, tendência apontada ontem pelo Itaú, que teve lucro de R$ 4,02 bilhões no terceiro trimestre --17,9% superior ao do mesmo período de 2012.
Além do Itaú, o Bradesco e o Santander se voltaram para segmentos de menor risco de inadimplência em 2013, ano de desaceleração da economia, inflação persistente e de concorrência acirrada com as instituições públicas.
A estratégia implicou forte redução nas margens de lucro (esses segmentos trazem ganho menor aos bancos), que foi compensada por inadimplência e despesa menores com provisões para devedores duvidosos.
Aliado ao controle nos custos, que cresceram abaixo da inflação, e ao avanço da receita com serviços e tarifas, o resultado foram lucros ainda bilionários no período.
O Bradesco lucrou R$ 3,06 bilhões, 7,1% mais do que no terceiro trimestre de 2012. A exceção foi o Santander, que teve recuo de 6,8% nos ganhos, para R$ 1,41 bilhão.
"Mudamos o mix da carteira de crédito de maior risco para menor risco. Isso sustentou nossos resultados junto com o controle de custos e receita maior com os serviços prestados aos clientes", diz Rogério Calderon, diretor-executivo do Itaú.
Os bancos privados reduziram os empréstimos para veículos e se tornaram ainda mais seletivos nos financiamentos para pequenas empresas, ramos em que a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil avançaram.
No Itaú, por exemplo, o volume de financiamentos de veículos encolheu 20,9% em um ano, enquanto no Bradesco a redução foi de 7,4%.
O crédito para micro e pequenas empresas caiu 4,1% no Itaú e 1,2% no Santander. O Bradesco foi exceção, com expansão de 12% nesse ramo.
CONSERVADORISMO
Já o crédito imobiliário saltou 34,9% no Itaú, 33,1% no Bradesco e 31,9% no Santander na comparação com 2012. O crédito consignado teve expansão ainda maior: 64% no Itaú e de 52,5% no Bradesco.
A inadimplência, por sua vez, foi aos menores patamares desde 2008: 3,9% no Itaú, 3,6% no Bradesco e 4,5% no Santander. Isso permitiu aos bancos privados reduzir despesas com provisões para calote, de longe a de maior impacto nos empréstimos.
Juntos Itaú, Bradesco e Santander economizaram R$ 2,35 bilhões com provisões na comparação entre os terceiros trimestres de 2012 e 2013.
"Os bancos privados estão mais conservadores. Apesar de nada indicar um aumento do desemprego, os bancos estão preocupados com o endividamento das famílias e com a inflação, que corrói a renda", diz João Augusto Sales, analista da Lopes Filho.

Em lugar de propulsor, setor está se tornando um freio para a economia
Os financiamentos bons são priorizados e os de risco elevado não são renovados
ROBERTO LUIS TROSTER - FSP
Em 1558, Thomas Gresham, agente financeiro da rainha Elizabeth 1ª, disse que o "dinheiro ruim expulsa o bom"; frase que o tornou conhecido até os dias de hoje.
Observou que, se duas moedas têm valor legal idêntico, mas com conteúdos metálicos diferentes, aquelas com maior densidade de metal nobre seriam entesouradas. Algo parecido ao que está acontecendo com os bancos privados no Brasil.
A pressão política por juros bancários mais baixos, sem haver uma redução de custos (leia-se compulsórios draconianos, tributação distorcida e regulação anacrônica), induziu as instituições a uma escolha óbvia: se não se pode aumentar o preço, a alternativa é diminuir o risco.
Os números do setor ilustram o ponto.
Os balanços divulgados pelos bancos nos últimos dias e a nota à imprensa de operações de crédito publicada ontem pelo Banco Central mostram um crescimento maior no consignado, no crédito imobiliário e em empréstimos a grandes empresas em detrimento a operações com risco de morosidade maior.
Literalmente, os financiamentos bons são priorizados e os de risco elevado não são renovados.
O custo social dessa prática é alto, especialmente para o pequeno tomador. Em parte, os bancos públicos estão aliviando o problema, mas não o suficiente.
Uma em cada cinco famílias tem contas em atraso e R$ 1 em cada R$ 8 devidos no cheque especial ou no financiamento de automóveis está em mora.
É um absurdo numa economia que está em pleno emprego observar uma inadimplência tão elevada nas camadas sociais mais baixas.
Mais grave é como está afetando o país. O setor, que tem as condições de ser um propulsor da economia, está se tornando um freio.
A relação crédito/PIB dos bancos privados no Brasil deveria estar crescendo, uma vez que está bem aquém do potencial; entretanto, caiu nos últimos 12 meses de 27,85% para 27,41%. É um fato alarmante.
A realidade mostra, por um lado, que os bancos privados estão seguindo à risca práticas históricas para preservar sua solidez e rentabilidade. Por outro, mostra que a política bancária é inadequada. Urge sua reformulação.

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