Campbell Robertson - NYT
Kendrick Brinson/The New York Times
James Davis enterrou a mulher, Patsy, no jardim de sua casa em Stevenson, no Alabama (EUA)
James Davis chegou à conclusão de que seu primeiro erro foi pedir permissão. Se um homem promete à sua mulher que a enterrará no jardim de casa, então deve cumprir.
Mas desde que Davis concedeu o desejo de sua mulher e a enterrou junto à varanda da frente, ele e a Prefeitura de Stevenson entraram numa contenda.
Da Câmara Municipal aos tribunais, o governo desta pequena cidade ferroviária no sul dos Apalaches tentou convencer Davis de que uma pessoa que mora numa cidade não pode simplesmente criar um cemitério em qualquer lugar que queira. No dia 11 de outubro, o Supremo Tribunal do Alabama confirmou a decisão de um juiz dizendo isso.
Mas Davis, 74, não está disposto a recuar.
"Eles estão esperando que eu morra", disse ele na semana passada, em pé na varanda da casa de madeira que ele construiu e olhando para o gramado, que além do túmulo tem uma casinha e uma placa grande demandando que sua mulher possa descansar em paz. "Eu não vou desenterrá-la."
Alabama, como a maioria dos Estados, não tem uma lei estadual contra enterrar alguém em propriedade privada, e sepulturas da família não são de todo raras no país. Sherry Bradley, vice-diretora de serviços ambientais do Departamento Estadual de Saúde Pública, disse que as pessoas perguntam sobre enterros privados várias vezes por semana.
"Você não acreditaria nos telefonemas que recebo", disse ela, citando uma mulher que queria realizar um "enterro Viking", colocando seu falecido marido num barco e ateando fogo a ele. ("A resposta para essa pergunta foi não", disse ela.)
Enquanto enterros particulares são permitidos em áreas rurais, as cidades muitas vezes têm leis que regem os enterros, às quais os Estados respeitam. Stevenson não tem uma lei como esta, embora Joshua Slocum, diretor da Aliança de Consumidores de Enterros, um grupo de vigilância sem fins lucrativos com sede em Vermont, disse que isso não é fora do comum. Muitas cidades não têm leis para os enterros porque a questão do enterro privado quase nunca vem à tona, disse ele.
"Normalmente as pessoas não pedem para ser enterradas dentro dos limites da cidade", disse Slocum.
Davis e sua esposa, Patsy, cresceram em Dayton, Tennessee. Eles se conheceram quando ela tinha sete anos e ele tinha 11. Ela era adolescente quando ele a convidou para acompanhá-lo num festival do morango.
"Saímos juntos pela primeira vez, e depois ficamos juntos até o final", disse ele.
Eles foram casados por 48 anos e tiveram cinco filhos.
Em seus últimos anos, Patsy Davis teve uma série de doenças dolorosas, entre elas uma artrite incapacitante, e James Davis se aposentou de seu trabalho como eletricista para cuidar dela. Eventualmente, os médicos disseram que estender sua vida só seria mais doloroso. Ela morreu em abril de 2009, e desde então ele tem dormido numa poltrona, por achar o quarto deprimente.
Pouco antes de morrer, diz James Davis, sua esposa expressou o desejo de ser enterrada no quintal da casa onde eles passaram três décadas juntos. Então ele se pôs a trabalhar, conseguindo uma aprovação do Departamento de Saúde do município e pressionando a Câmara Municipal para conseguir uma licença.
O conselho disse a Davis que ele não tinha preenchido a documentação necessária, e depois de duas reuniões, votou para negar o seu pedido, argumentando sobre o possível efeito disso para os valores da propriedade e sobre quem iria cuidar disso perpetuamente. (A lápide tem o nome de Davis ao lado de sua esposa, e ele planeja ser enterrado no quintal também.) Parker Edmiston, advogado da cidade, disse que estava preocupado com a ideia de abrir um precedente.
"Se você permitir isso ao Sr. Davis, você permitirá à Sra. Adams, ao Sr. Jones e todos os outros", disse Edmiston, acrescentando que este foi o litígio mais prolongado na cidade desde um caso há alguns anos relativo a suínos.
De acordo com documentos dos tribunais, Davis declarou aos membros do Conselho da Cidade que processaria o município e levaria o caso à Suprema Corte do estado se necessário. Mas em vez disso, ele simplesmente decidiu ignorá-los.
"Eu simplesmente peguei uma escavadeira e fui em frente", disse Davis, argumentando mais tarde que a falta de uma lei específica sobre os enterros significava que eles não tinham direito de impedi-lo.
Ele instalou um cofre, a funerária colocou sua esposa no caixão, e numa manhã de sábado, dez dias depois da votação do Conselho Municipal, Patsy Davis foi colocada para descansar diante de um grupo de familiares.
A cidade processou James Davis um mês depois.
Davis travou a luta legal durante os próximos quatro anos, gastando milhares de dólares em taxas legais. Em determinado momento, ele até concorreu a prefeito, mas perdeu. Em 2012, um juiz do Tribunal do Circuito decidiu em favor da cidade e ordenou que Davis retirasse os restos mortais de sua esposa e os levasse a um "cemitério devidamente licenciado e aprovado". Mas o túmulo permaneceu intacto enquanto o caso passava pelo processo de apelação.
Os vizinhos, embora admitindo que é um pouco estranho, acostumaram-se ao túmulo no alto da rua.
"É a mulher dele", disse Margaret Garner, 56. "Ele tem o direito."
Mas pelo menos de acordo com os tribunais, ele não tem.
No fim de semana, depois de a negação do Supremo Tribunal ter atraído atenção nacional, ele foi contatado por dois irmãos gêmeos do Sul da Califórnia: um roteirista, o outro diretor de uma organização dedicada à produzir uma nova tradução da Bíblia.
Os irmãos incentivaram Davis a proteger o túmulo, transformando sua casa numa igreja, e criaram até um site divulgando a nova Igreja Stevenson Bible, "uma igreja orientada para a família e que crê na Bíblia: batismos, casamentos, cemitério no local". As missas foram programadas para cada manhã de domingo, às 10h, e Davis seria conhecido como pastor. Ele não comprou a ideia.
Na sexta-feira, Davis estava de volta ao tribunal, e enquanto alertava para "um incidente" caso a prefeitura entrasse em sua propriedade, sugeriu um acordo: ele desenterraria o caixão, cremaria os restos de sua mulher e colocaria a urna com as cinzas de volta no túmulo.
Em seus últimos dias, Patsy Davis havia dito que estava com medo da cremação, disse o marido. Mas muito tempo se passou desde então.
"Se ela visse como está agora, sei que não ligaria", disse ele.
Edmiston reconheceu que não havia nenhuma lei contra lápides ou a armazenamento de cinzas, mas insistiu que o caixão e o cofre deveriam ser removidos. Então se Davis cumprir totalmente a ordem da prefeitura, a aparência do jardim ficará exatamente como está agora, só que com uma urna e não um caixão debaixo da terra.
Isso pode levantar a questão de qual o motivo por toda a batalha. Mas Davis não têm dúvidas.
"Nunca houve um casal tão apaixonado quanto nós", disse ele. "Nós fomos feitos para ficarmos juntos."
Tradução: Eloise de Vylder
James Davis enterrou a mulher, Patsy, no jardim de sua casa em Stevenson, no Alabama (EUA)
James Davis chegou à conclusão de que seu primeiro erro foi pedir permissão. Se um homem promete à sua mulher que a enterrará no jardim de casa, então deve cumprir.
Mas desde que Davis concedeu o desejo de sua mulher e a enterrou junto à varanda da frente, ele e a Prefeitura de Stevenson entraram numa contenda.
Da Câmara Municipal aos tribunais, o governo desta pequena cidade ferroviária no sul dos Apalaches tentou convencer Davis de que uma pessoa que mora numa cidade não pode simplesmente criar um cemitério em qualquer lugar que queira. No dia 11 de outubro, o Supremo Tribunal do Alabama confirmou a decisão de um juiz dizendo isso.
Mas Davis, 74, não está disposto a recuar.
"Eles estão esperando que eu morra", disse ele na semana passada, em pé na varanda da casa de madeira que ele construiu e olhando para o gramado, que além do túmulo tem uma casinha e uma placa grande demandando que sua mulher possa descansar em paz. "Eu não vou desenterrá-la."
Alabama, como a maioria dos Estados, não tem uma lei estadual contra enterrar alguém em propriedade privada, e sepulturas da família não são de todo raras no país. Sherry Bradley, vice-diretora de serviços ambientais do Departamento Estadual de Saúde Pública, disse que as pessoas perguntam sobre enterros privados várias vezes por semana.
"Você não acreditaria nos telefonemas que recebo", disse ela, citando uma mulher que queria realizar um "enterro Viking", colocando seu falecido marido num barco e ateando fogo a ele. ("A resposta para essa pergunta foi não", disse ela.)
Enquanto enterros particulares são permitidos em áreas rurais, as cidades muitas vezes têm leis que regem os enterros, às quais os Estados respeitam. Stevenson não tem uma lei como esta, embora Joshua Slocum, diretor da Aliança de Consumidores de Enterros, um grupo de vigilância sem fins lucrativos com sede em Vermont, disse que isso não é fora do comum. Muitas cidades não têm leis para os enterros porque a questão do enterro privado quase nunca vem à tona, disse ele.
"Normalmente as pessoas não pedem para ser enterradas dentro dos limites da cidade", disse Slocum.
Davis e sua esposa, Patsy, cresceram em Dayton, Tennessee. Eles se conheceram quando ela tinha sete anos e ele tinha 11. Ela era adolescente quando ele a convidou para acompanhá-lo num festival do morango.
"Saímos juntos pela primeira vez, e depois ficamos juntos até o final", disse ele.
Eles foram casados por 48 anos e tiveram cinco filhos.
Em seus últimos anos, Patsy Davis teve uma série de doenças dolorosas, entre elas uma artrite incapacitante, e James Davis se aposentou de seu trabalho como eletricista para cuidar dela. Eventualmente, os médicos disseram que estender sua vida só seria mais doloroso. Ela morreu em abril de 2009, e desde então ele tem dormido numa poltrona, por achar o quarto deprimente.
Pouco antes de morrer, diz James Davis, sua esposa expressou o desejo de ser enterrada no quintal da casa onde eles passaram três décadas juntos. Então ele se pôs a trabalhar, conseguindo uma aprovação do Departamento de Saúde do município e pressionando a Câmara Municipal para conseguir uma licença.
O conselho disse a Davis que ele não tinha preenchido a documentação necessária, e depois de duas reuniões, votou para negar o seu pedido, argumentando sobre o possível efeito disso para os valores da propriedade e sobre quem iria cuidar disso perpetuamente. (A lápide tem o nome de Davis ao lado de sua esposa, e ele planeja ser enterrado no quintal também.) Parker Edmiston, advogado da cidade, disse que estava preocupado com a ideia de abrir um precedente.
"Se você permitir isso ao Sr. Davis, você permitirá à Sra. Adams, ao Sr. Jones e todos os outros", disse Edmiston, acrescentando que este foi o litígio mais prolongado na cidade desde um caso há alguns anos relativo a suínos.
De acordo com documentos dos tribunais, Davis declarou aos membros do Conselho da Cidade que processaria o município e levaria o caso à Suprema Corte do estado se necessário. Mas em vez disso, ele simplesmente decidiu ignorá-los.
"Eu simplesmente peguei uma escavadeira e fui em frente", disse Davis, argumentando mais tarde que a falta de uma lei específica sobre os enterros significava que eles não tinham direito de impedi-lo.
Ele instalou um cofre, a funerária colocou sua esposa no caixão, e numa manhã de sábado, dez dias depois da votação do Conselho Municipal, Patsy Davis foi colocada para descansar diante de um grupo de familiares.
A cidade processou James Davis um mês depois.
Davis travou a luta legal durante os próximos quatro anos, gastando milhares de dólares em taxas legais. Em determinado momento, ele até concorreu a prefeito, mas perdeu. Em 2012, um juiz do Tribunal do Circuito decidiu em favor da cidade e ordenou que Davis retirasse os restos mortais de sua esposa e os levasse a um "cemitério devidamente licenciado e aprovado". Mas o túmulo permaneceu intacto enquanto o caso passava pelo processo de apelação.
Os vizinhos, embora admitindo que é um pouco estranho, acostumaram-se ao túmulo no alto da rua.
"É a mulher dele", disse Margaret Garner, 56. "Ele tem o direito."
Mas pelo menos de acordo com os tribunais, ele não tem.
No fim de semana, depois de a negação do Supremo Tribunal ter atraído atenção nacional, ele foi contatado por dois irmãos gêmeos do Sul da Califórnia: um roteirista, o outro diretor de uma organização dedicada à produzir uma nova tradução da Bíblia.
Os irmãos incentivaram Davis a proteger o túmulo, transformando sua casa numa igreja, e criaram até um site divulgando a nova Igreja Stevenson Bible, "uma igreja orientada para a família e que crê na Bíblia: batismos, casamentos, cemitério no local". As missas foram programadas para cada manhã de domingo, às 10h, e Davis seria conhecido como pastor. Ele não comprou a ideia.
Na sexta-feira, Davis estava de volta ao tribunal, e enquanto alertava para "um incidente" caso a prefeitura entrasse em sua propriedade, sugeriu um acordo: ele desenterraria o caixão, cremaria os restos de sua mulher e colocaria a urna com as cinzas de volta no túmulo.
Em seus últimos dias, Patsy Davis havia dito que estava com medo da cremação, disse o marido. Mas muito tempo se passou desde então.
"Se ela visse como está agora, sei que não ligaria", disse ele.
Edmiston reconheceu que não havia nenhuma lei contra lápides ou a armazenamento de cinzas, mas insistiu que o caixão e o cofre deveriam ser removidos. Então se Davis cumprir totalmente a ordem da prefeitura, a aparência do jardim ficará exatamente como está agora, só que com uma urna e não um caixão debaixo da terra.
Isso pode levantar a questão de qual o motivo por toda a batalha. Mas Davis não têm dúvidas.
"Nunca houve um casal tão apaixonado quanto nós", disse ele. "Nós fomos feitos para ficarmos juntos."
Tradução: Eloise de Vylder
Nenhum comentário:
Postar um comentário