terça-feira, 29 de outubro de 2013

Relatório comprova elo de banco japonês com gângsteres, mas reduz caso a "erro"
Hiroko Tabuchi - NYT                                         
Os vendedores de carros usados que pontilham os arredores solitários de Tóquio e outras cidades japonesas são um elo improvável entre um dos maiores bancos do Japão e os gângsteres da Yakuza do país. 
Na segunda-feira (28), a unidade bancária do Mizuho Financial Group divulgou os resultados de investigações internas traçando como esses vendedores, por meio de uma empresa afiliada ao Mizuho de financiamento ao consumidor, fizeram pelo menos US$ 2 milhões em pequenos empréstimos para compradores com elos com o crime organizado do Japão sem checar apropriadamente seus antecedentes. Os grupos criminosos usam os empréstimos para ajudar a financiar suas atividades. 
O Banco Mizuho, que comprou esses empréstimos reempacotados de sua afiliada, encontrou os empréstimos ligados aos gângsteres em seus livros em 2010, mas não informou às autoridades, segundo um relatório elaborado por advogados externos contratados pelo banco para investigar o caso. 
Mas os advogados disseram não ter encontrado nenhuma evidência de que representantes do Mizuho tentaram intencionalmente esconder os empréstimos dos investigadores. 
A direção do Mizuho simplesmente "falhou em avaliar a gravidade da colaboração com o crime organizado", disse Hideki Nakagomi, que chefiou o painel de advogados, na segunda-feira. Ele reconheceu que muitos diretores do banco disseram aos investigadores que "não se recordavam do que tinha acontecido". 
O Mizuho, com sede em Tóquio, anunciou na noite de segunda-feira que seu presidente, Yasuhiro Sato, manteria seu cargo, apesar de que ele e 53 outros executivos anteriores e atuais terão seu pagamento reduzido por até seis meses. Sato também é presidente do grupo controlador do banco, o Mizuho Financial Group. 
"Eu peço desculpas do fundo do meu coração", disse Sato em uma coletiva de imprensa, curvando-se diante das câmeras. "Eu levo muito a sério o fato de nos vermos envolvidos nesta situação." O presidente do conselho diretor do grupo, Takashi Tsukamoto, que exerce um papel principalmente consultivo no Mizuho, renunciará. 
O escândalo causou poucos danos às ações da empresa, que valorizaram 2,45% na segunda-feira, após a divulgação do relatório.
Os empréstimos suspeitos vieram à tona depois que o órgão regulador bancário japonês, a Agência de Serviços Financeiros, repreendeu o Mizuho no mês passado pela forma como lidou com os empréstimos. Os empréstimos ressaltam como os grupos do crime organizado continuam levantando dinheiro junto ao sistema financeiro daqui apesar dos esforços para impedi-los.

Esquemas ilícitos

Há muito se sabe que empréstimos para compra de carros usados fazem parte dos esquemas ilícitos para levantamento de fundos dos gângsteres. Em um método usado com frequência, membros da gangue conspiram com um vendedor para compra de um carro –como o Mercedes-Benz preto do tipo preferido pelos gângsteres daqui– por um valor muito mais alto do que o preço habitual, depois pedindo um empréstimo para carros usados para cobrir o preço inflacionado. O esquema dá aos gângsteres acesso a financiamento fácil; o carro pode ser vendido ou receber uma nova placa, de modo que pode ser usado para pedido de novos empréstimos, segundo reportagens da imprensa local. 
Membros do crime organizado não deveriam ter acesso a financiamento por grandes bancos como o Mizuho, em consequência de uma lei de 1991 que torna ilegal a lavagem de dinheiro. Desde então, as autoridades japonesas têm endurecido as regras, exigindo que os bancos chequem mais vigorosamente os clientes potenciais em busca de ligações com o crime organizado. O Mizuho disse que seus funcionários de empréstimos checam os pedidos usando um banco de dados nacional de membros conhecidos de grupos do crime organizado e seus associados. 
Mas os empréstimos para automóveis em questão, cerca de 230 transações totalizando aproximadamente US$ 2 milhões, foram feitos pela Orient Corp., uma financeira muito menor afiliada ao Mizuho, que realizava checagens de antecedentes menos rígidas de compradores potenciais, disse o relatório do painel externo. Na semana passada, uma investigação pelo jornal "Mainichi Shimbun" disse que os empréstimos para carros usados da Oriente, conhecida como Orico, costumavam ser aprovados em 15 minutos com checagem mínima de antecedentes, que era realizada por fax. 
O Mizuho comprava periodicamente esses empréstimos reempacotados da Orico sem checar rigidamente cada um, disse o relatório. Quando alguns empréstimos ligados a gângsteres vieram à tona durante uma inspeção interna rotineira, o Mizuho instruiu o Orico a não mais conceder empréstimos a esses gângsteres. Mas ele não suspendeu os empréstimos existentes e nem informou as autoridades.

Atitude do banco foi erro, não acobertamento, diz relatório

O banco disse inicialmente que o conhecimento do assunto chegou apenas aos funcionários de fiscalização do banco, mas reconheceu posteriormente que Sato e outros membros do conselho diretor do Mizuho estavam cientes. 
Mesmo assim, o relatório reduziu a reticência do banco a um erro, não a um acobertamento intencional. O Mizuho não foi multado, apesar dos reguladores terem sofrido pressão por especialistas e pela mídia para punir o banco com multas. Alguns legisladores chegaram a pedir que Sato depusesse no Parlamento. 
O Mizuho prometeu na segunda-feira reforçar a vigilância contra a realização de negócios com gângsteres, dizendo que compartilharia seus bancos de dados detalhados de clientes com afiliadas como a Orico. Outros bancos no Japão disseram que adotariam medidas semelhantes. 
Taro Aso, que comanda o Ministério das Finanças do Japão e o órgão regulador financeiro, disse que as autoridades estudariam os planos do Mizuho para melhorar sua governança –apresentadas ao ministério na segunda-feira– antes de decidir sobre sanções administrativas adicionais. 
"É um problema extremamente grande o painel externo ter apontado as relações com forças antissociais", disse Aso, usando um eufemismo para o crime organizado. "Nós temos que assegurar que esse tipo de coisa não aconteça. É a pior coisa que um banco pode fazer."

Tradutor: George El Khouri Andolfato

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