segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Solução dos EUA para pagar dívidas logo após sua independência poderia inspirar Europa
Christian Reiermann - Der Spiegel
Kai Pfaffenbach/Reuters

Símbolo do euro iluminado é visto em frente ao prédio do Banco Central Europeu (BCE) em Frankfurt, na Alemanha
Símbolo do euro iluminado é visto em frente ao prédio do Banco Central Europeu (BCE) em Frankfurt, na Alemanha
Após a Guerra da Independência, os Estados Unidos se pareciam muito com a zona do euro, com alguns estados atolados em dívida. No final, seguindo uma proposta de Alexander Hamilton, o governo federal assumiu todas as dívidas, garantindo a credibilidade do país. Um novo relatório argumenta que este poderia ser um bom modelo para a Europa.
Quando os economistas alemães refletem sobre como salvar o euro, frequentemente se inspiram num homem que morreu depois de um duelo há 200 anos. Acadêmicos como Hans-Werner Sinn do Instituto de Pesquisa Econômica IFO em Munique, e Wolfgang Franz e seus colegas do Conselho Alemão de Especialistas em Economia, descobriram um novo modelo: o americano Alexander Hamilton, primeiro secretário de Tesouro do país, que foi morto a tiros pelo vice-presidente Aaron Burr em 1804.
Os acadêmicos observaram semelhanças surpreendentes entre os atuais problemas da eurozona e os dos primeiros anos dos Estados Unidos. Como a União Europeia hoje, no final do século 18, os Estados Unidos eram muito mais uma aliança de estados independentes do que uma instituição federal. Os problemas econômicos e políticos também eram semelhantes. Alguns estados, como a Carolina do Sul e Massachusetts, gemiam sob o peso das dívidas da Guerra de Independência, mas ninguém queria lhes emprestar mais dinheiro.
Outros estados, especialmente a Virgínia, tinham limpado as suas finanças mas se recusavam a ajudar seus parceiros menos afortunados. A disputa pelo dinheiro ameaçou destruir a jovem união de estados. Foi só Hamilton, recém-nomeado Secretário de Estado com cerca de 35 anos na época, que foi capaz de resolver a crise da dívida e salvar os Estados Unidos.
Mas será que a eurozona pode aprender algumas lições com os primeiros dias do capitalismo? Será que as ideias de um soldado da independência que adquiriu seu conhecimento de economia a partir de livros ainda são relevantes hoje? O presidente do IFO acredita que sim. Os primeiros anos dos Estados Unidos são um "precedente atraente para a Europa de hoje", e Hamilton foi uma espécie de "herói", concluiu um novo relatório do Grupo de Conselho Econômico Europeu (EEAG) que Sinn e seus coautores pretendem apresentar na semana que vem.
Um plano ousado
Na verdade, Hamilton, que serviu como ajudante do general George Washington na Guerra da Independência, criou um plano ousado em 1790. Ele estava determinado a impedir que um ou dos 13 estados deixasse de pagar suas dívidas, temendo que isso fosse prejudicar a credibilidade da jovem república.
Hamilton, que era advogado, aderiu a um credo na política e nos negócios: "as promessas devem ser cumpridas". Na sua opinião, isso também se aplicava ao pagamento de dívidas. Em sua vida privada, entretanto, o pai de oito filhos tinha problemas para cumprir com sua resolução. Ele esteve repetidamente interessado em mulheres com quem não era casado. Mas seu plano econômico funcionou. O governo federal assumiu todas as dívidas dos estados e os combinou num fundo que Hamilton chamava de "fundo de amortização" da dívida. Ele também introduziu deveres e impostos sobre itens de luxo, como sobre os destilados, especialmente o uísque.
Hamilton usou as receitas para pagar as dívidas de guerra, e ao fazer isso, conseguiu reduzir os custos dos juros altos do país para 4%. As baixas taxas de juros resultantes estimularam a economia, e a recuperação trouxe mais receitas para os cofres do governo. Dentro de alguns anos, Hamilton foi capaz de eliminar uma grande parte da montanha de dívida dos EUA.
Sinn e seus colegas acreditam que "a lógica de uma fonte de receita interna também se aplica à Europa moderna". Eles argumentam que a UE deveria receber as receitas do planejado imposto sobre transações financeiras. Mas isso não é tudo. "A longo prazo, e em analogia com o sistema de Hamilton, seria necessária uma profunda reforma da ordem fiscal, uma reforma que forneça receita à administração conjunta ou um imposto sobre valor agregado."
Um pacto de pagamento da dívida para a Europa?
O "fundo de amortização" de Hamilton levou o Conselho Alemão de Especialistas Econômicos a vislumbrar um "pacto de pagamento da dívida para a Europa". Segundo o plano, os estados-membros coletariam partes de seus passivos num fundo comum e pagariam a dívida juntos. Os especialistas em economia não tem nada além de elogios efusivos para as consequências do trabalho de Hamilton. "Ele contribuiu para garantir a credibilidade dos Estados Unidos, criando um grande mercado de títulos e tornando possível o refinanciamento das dívidas a taxas de juros baixas."
Ainda é questionável se os líderes das capitais da Europa que trabalham para salvar o euro vão querer aprender com Hamilton, porque seu fundo para a dívida era na verdade uma união monetária. Os títulos comuns com os quais são refinanciadas dívidas antigas são mais conhecidos hoje como eurobonds. Ambas são ideias que provocam reações alérgicas em algumas capitais, especialmente em Berlim. A chanceler Angela Merkel e o ministro das Finanças, Wolfgang Schäuble, ambos membros da União Democrática Cristã (CDU), de centro-direita, só estão dispostos a aceitar essas ideias se uma união política for instalada como um contrapeso à união monetária.
No entanto, a abordagem de Hamilton prova que fazer isso no sentido inverso não está necessariamente fadado ao fracasso. Para ele, a união fiscal e a união política eram sempre dois lados da mesma moeda. Ele só não via o seu plano como uma luta contra uma crise de dívida, mas também como um veículo para fortalecer a coesão das ex-colônias, desmantelando um poderoso governo central. Reduzir a dívida conjunta e restabelecer a credibilidade "para consolidar mais de perto a união de Estados", disse ele. Hamilton, cujo rosto aparece na nota de US$ 10 até hoje, provou estar certo. Os Estados Unidos ainda existem, e o presidente dos EUA, Barack Obama, recentemente nomeou o 75º sucessor de Hamilton.
Tradutor: Christopher Sultan e Eloise De Vylder

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