Reuters
30.set.2013 - O líder do partido PDL da Itália, Sílvio Berlusconi, carrega seu cachorro de estimação ao chegar em sua residência, em Roma. Os cinco ministros do conservador partido formalizaram nesta segunda-feira sua renúncia "irrevogável" do Executivo de coalizão presidido pelo social-democrata Enrico Letta
Todas as grandes crises são uma espécie de vírus mutante. São, em diferentes etapas, financeiras, econômicas e de dívida, e sempre acabam tendo perigosas reverberações políticas."O maior risco do euro é político", repetem há meses, à menor ocasião, o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso, e o do Eurogrupo, o holandês Jeroen Dijsselbloem.
"O pior cenário, depois de vários anos de recessão severa e com a lógica fadiga da cidadania causada pelos cortes, é uma crise política que pode vir pelo sul ou pela ascensão de partidos radicais em qualquer país", dizia na última sexta-feira um alto funcionário em Bruxelas.
A Itália, e em menor medida a Grécia, ameaçam transformar esse temor em crua realidade. Os mercados - a Bolsa e sobretudo as inevitáveis taxas de risco - medirão nesta segunda-feira (30) tanto a profundidade da crise em Roma como o medo do retorno da crise do euro, se é que alguma vez ela desapareceu.
A crise europeia já deixou vários efeitos políticos: provocou sonoros protestos nas ruas de praticamente toda a Europa, varreu uma vintena de governos de todas as cores (mas não conseguiu derrubar a chanceler Angela Merkel), inclusive deixou algumas vezes a democracia em um estranho limbo, com a ascensão de tecnocratas em Roma e Atenas.
Desta vez não é diferente: a crise política chega pelo lado mais frágil do euro, uma Itália em declínio que está há dois anos em recessão e preocupa pela saúde de seu setor financeiro e pela instabilidade política.
Apesar de tudo o que se relaciona com os extremistas do Aurora Dourada, é cada vez mais difícil que a Grécia surpreenda os mercados, acostumados a uma série de desastres em Atenas, que protagonizou dois resgates fracassados e tem um terceiro à vista.
O que realmente preocupa em Bruxelas é a Itália, a terceira economia do euro. Depois de apenas cinco meses, o governo de Enrico Letta não conseguiu evitar uma sombra de desconfiança por sua incapacidade para pôr em ordem suas contas públicas, mas sobretudo pelas possibilidades crescentes de um colapso na coalizão de governo, que finalmente derrubou Silvio Berlusconi.
A fagulha que fez Berlusconi explodir é eminentemente judicial: cresce a pressão para que o ex-primeiro-ministro seja julgado se for suspensa sua imunidade como senador. Mas ele disfarçou essa confusão com números: o governo de Letta é incapaz de cumprir o sacrossanto déficit de 3% do PIB por apenas 1,6 bilhões de euros.
Por isso, vê-se obrigado a implementar novos cortes e a elevar o IVA a partir de amanhã. Berlusconi se opõe com unhas e dentes a esse aumento de impostos, o que é aparentemente seu principal argumento para se demitir. "Berlusconi está tentando justificar assim sua loucura e irresponsabilidade", disse Letta.
O problema é que os mercados não costumam passar por cima da desintegração de um governo. A taxa de risco italiana melhorou ostensivamente há um ano depois das palavras mágicas do presidente do BCE, Mario Draghi.
"Farei tudo o que for necessário", disse em um momento de grande fragilidade na Espanha e na Itália - mas há semanas vêm aumentando as dificuldades de Letta para evitar uma crise de governo. Ninguém espera um terremoto, mas esse tumulto político trará consequências.
"As Bolsas estão no máximo e aí uma correção é certa. Mas a chave é a dívida italiana, que está bem posicionada há meses mas que pode sofrer agora porque com muito pouco volume pode haver problemas", explicam fontes financeiras em Washington.
A fragilidade econômica e sobretudo a instabilidade política são um caldo de cultivo excelente para um novo reforço da crise do euro, desta vez pelo lado italiano.
O ministro da Economia Fabrizio Saccomani apostava no domingo em uma reação morna do mercado. "É preciso estar alerta, mas é pouco provável uma sacudida importante. O que haverá é um exame da resistência de alguns países, como a Espanha, que mostravam sinais de melhora. A crise política na Itália é um perigo, mas ao mesmo tempo pode ser um bom momento para que outros países demonstrem que podem resistir porque fizeram a lição de casa", apontam fontes diplomáticas.
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
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