domingo, 1 de setembro de 2013

Família Donadon frequenta noticiário político-policial bem antes da prisão de Natan
Irmã do deputado já foi condenada pela Justiça de Rondônia e teve os direitos políticos cassados por três anos
Chico de Gois - O Globo
Natan Donadon se defende na Câmara
Foto: Arquivo O Globo / Jorge William/28-8-2013
Natan Donadon se defende na Câmara - Arquivo O Globo / Jorge William/28-8-2013
BRASÍLIA - O deputado Natan Donadon, que entrou para a História ao ser o primeiro parlamentar condenado e preso, e também por ser o primeiro deputado-presidiário, vem de uma família que frequenta o noticiário político-policial de Rondônia desde a década de 1980. A família, proveniente do Paraná, chegou ao estado em 1973. Menos de uma década depois, o patriarca, Marcos, tornou-se o segundo prefeito de Colorado do Oeste, cidade localizada no chamado cone sul do estado que havia se tornado município em 1981 — antes de Marcos, o pai do senador Ivo Cassol (PP-RO), Reditário, havia administrado o povoado. Para ajudá-lo a gerir o município, Marcos Donadon cercou-se de gente de sua estrita confiança: seus filhos, que ganharam cargos de secretários na prefeitura.
O mais velho deles, Melkisedek, foi o primeiro a seguir os passos políticos do pai e, em 1992, elegeu-se prefeito da mesma cidade. Mas Colorado do Oeste era pequena demais para a ambição política do clã, e Melki, como é conhecido, mudou seu domicílio eleitoral para Vilhena, elegendo-se prefeito de lá em 1996 e reelegendo-se em 2000. Para garantir a extensão do poder, manteve como vice o primo Marlon, que lhe sucedeu na prefeitura em 2004.
Com um pé em Vilhena, a família não se descuidou de Colorado do Oeste. Uma das irmãs, Mirian, foi prefeita da cidade também, entre 2004 e 2008. Em julho de 2007, ela foi condenada pela Justiça local a pagar multa de R$ 174 mil porque o hospital municipal não tinha profissionais nem medicamentos e não podia fazer exames. Por outro lado, a Associação Marcos Donadon, que funcionava na cidade, em Vilhena e em Cerejeiras, estava sempre abastecida.
Prefeito e provedor da família
A instituição levava o nome do patriarca da família, mas quem lucrava eleitoralmente eram os filhos, principalmente o mais novo, que tinha o nome do pai e era deputado estadual. Nela, trabalhavam alguns dos parentes. Um dos cunhados dos Donadon era o administrador; a mulher de Marcos, que é dentista, também dava expediente lá. Como foi declarada de utilidade pública, a associação recebia recursos do SUS e do governo de Rondônia.
Em 2010, Mirian voltou a ser condenada pela Justiça de Rondônia e teve os direitos políticos cassados por três anos, além da penhora de seus bens e dos da associação. De acordo com a sentença, ela foi punida por fazer repasses irregulares para a instituição da família.
Quando prefeito de Vilhena, Melki foi um provedor para os seus: 13 parentes tinham cargo na administração. Ele tentou outros voos mais altos, mas nunca conseguiu. Em 1998, candidatou-se ao governo do estado, mas foi derrotado pelo senador Valdir Raupp (PMDB-RO). Em 2006 e em 2010, buscou uma vaga no Senado, mas também não conseguiu se eleger.
Em 2008, o clã perdeu o domínio da prefeitura de Vilhena para José Luiz Rover (PP), que foi reeleito em 2012. No entanto, a família elegeu o primo de Melki para a Câmara Municipal. Em julho deste ano, Angelo Mariano Donadon Júnior (PMDB) apresentou um projeto que era uma carta de boas intenções: proibia que a prefeitura contratasse parentes de políticos; justamente ele, cuja família sempre teve emprego público. O prefeito de Vilhena, no entanto, conseguiu lhe tirar a primazia do projeto, e um aliado de Rover apresentou matéria de idêntico teor, aprovando-a.
No cenário estadual, Marcos Donadon, o filho, teve uma carreira duradoura como deputado. Sua primeira eleição para a Assembleia Legislativa ocorreu em 1994, quando tinha apenas 22 anos. A exemplo de Melkisedek, ele também abrigou a família. Foi Marcos quem nomeou Natan diretor financeiro da Assembleia quando era presidente do Legislativo rondoniense. Depois que Mirian deixou a prefeitura de Colorado do Oeste, ele conseguiu um lugar para ela na liderança do PMDB quando era o líder. Um cunhado, casado com sua irmã Ruth, foi um dos diretores na Assembleia quando ele a presidia — em 2010, ele foi preso por envolvimento nos mesmos desvios que teriam sido praticados por Marcos e por Natan.
O nome de Marcos foi envolvido em duas denúncias que ganharam destaque nacional: em gravação feita pelo então governador Ivo Cassol, em 2005, em que deputados estaduais cobravam R$ 50 mil mensais cada um para não importunar o governador; e na Operação Dominó, da Polícia Federal, em 2006, em que deputados se utilizavam de laranjas na folha de pagamento da Assembleia Legislativa.
Marcos, segundo a denúncia, valeu-se de 16 nomes, incluindo o da própria mãe, para sacar dinheiro. Em menos de um ano, teria movimentado R$ 695 mil. O esquema envolvia 23 dos 24 deputados estaduais. Desses, apenas cinco conseguiram se reeleger — entre eles, Marcos, cuja família mantinha, até junho deste ano, a associação que distribuía remédios, fazia atendimentos médico e dentário e rendia muitos votos.
Mas nenhuma dessas acusações lhe custou o mandato até ele ser condenado em 2010, junto com o irmão, à prisão. De acordo com o processo, quando presidente da Assembleia, Marcos, junto com Natan, forjou um contrato com a MPJ Marketing, Propaganda e Jornalismo que tinha como objetivo a execução de publicidade em geral, por um período de quatro meses — agosto a dezembro de 1995. Porém, mesmo tendo recebido R$ 8,4 milhões, a empresa nada fez. O dinheiro, conforme as investigações, foi desviado — em valores atualizados, chega a R$ 54 milhões, segundo cálculo do Ministério Público.
Natan foi, dos homens, o último a entrar na vida pública por meio de eleições. Ele se candidatou a deputado federal em 1998, no mesmo ano em que Melki tentou chegar ao governo, mas, como o irmão, não teve sorte. Na eleição seguinte, conseguiu ficar na suplência e assumiu a cadeira de Confúcio Moura, quando este foi eleito prefeito de Ariquemes, em 2004. De lá para cá, não perdeu mais qualquer eleição.
Marcos foi preso em junho deste ano, quando desembarcava no aeroporto de Porto Velho, proveniente de Vilhena. Natan foi detido dois dias depois do irmão, em 28 de junho. Marcos ainda não teve o mandato cassado pelos colegas da Assembleia Legislativa de Rondônia. O processo está parado por lá. Já Natan conseguiu manter seu mandato, embora o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), tenha mandado empossar o suplente, Amir Lando (PMDB).
A declaração de bens da família Donadon revela uma movimentação atípica do patrimônio. Natan, por exemplo, aparenta ser homem sem grande ostentação. Em 2006, declarou que seus bens somavam R$ 200 mil — R$ 100 mil dos quais emprestados à mulher, Rosângela. Em 2010, o patrimônio atingia R$ 649 mil, R$ 250 mil em dinheiro sob sua guarda. Melkisedek tem padrão diferente. Em 2008, quando tentou voltar à prefeitura de Vilhena, informou que não tinha nada em seu nome. Em 2010, a vida financeira deu um salto: ele tinha um patrimônio declarado de R$ 638,7 mil. Tinha até equipamento para instalação de uma PCH (pequena central elétrica). Em 2012, em mais uma tentativa, a soma dos bens caiu para R$ 157 mil — sendo R$ 152 mil em espécie. A reportagem tentou, em vão, entrar em contato com Melkisedek, com representantes da família e com o advogado de Natan Donadon.

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