William Hong/Reuters
Criador de frangos cobre rosto enquanto se senta atrás de suas galinhas, que, de acordo com ele, não estão infectadas com o vírus H7N9, no município de Yuxin, na província de Zhejiang, na China
Em todos os mercados de Xangai, as barracas que vendem aves vivas foram obrigadas a fechar no último sábado (6). As dezenas de milhares de frangos e outras aves que estavam armazenados ali foram abatidas. Mas, no mercado de Jingchuan, no subúrbio ao sul da cidade mais populosa do país, uma barraca que vendia carne de porco também foi fechada.Era lá que há um mês trabalhava Wu Liangliang, 27, vindo da província vizinha de Jiangsu para ajudar a família de sua esposa. Depois de algumas semanas em Xangai, ele começou a ter febre alta. Levado à clínica local, e depois internado no Hospital do Povo número 5 no dia 1º de março, pois o tratamento inicial havia se mostrado ineficaz, ele foi submetido a um tratamento contra pneumonia, mas morreu no dia 10 de março.
A família teve de esperar até o fim do mês, três semanas depois, para descobrir a verdadeira causa do falecimento: o novo vírus H7N9 da gripe aviária. "Não fomos informados sobre a causa de sua morte. Nós descobrimos pelo noticiário na TV. O hospital não nos disse nada", relata ao "Le Monde" seu sogro, Wu Demao, que explica que seria inapropriado que ele mesmo ou a esposa da vítima falassem mais do que isso para um veículo da imprensa estrangeira.
Ninguém acredita no balanço oficial
Mas, agora, é a imprensa liberal chinesa que levanta a questão: será que as autoridades esperaram antes de reconhecer a propagação do vírus H7N9? O governo jura que adota a maior transparência, mas à sua maneira. Pelo menos dez pessoas foram detidas, algumas durante dez dias, por terem espalhado "rumores" sobre o vírus. E ninguém acredita no balanço oficial que na quarta-feira à noite atestava 33 infecções humanas (com 5 novos casos em 24 horas), das quais 10 levaram a óbito.
Um artigo, publicado na quarta-feira por um jornal relativamente independente, o "Nanfang Dushibao", ficou indisponível na internet. Ele se atreveu a levantar a seguinte questão: "Não teria havido menos infecções e mortes?", querendo dizer, se não houvessem passado três semanas entre o momento em que um laboratório confirmou a existência do vírus e aquele em que o Ministério da Saúde falou sobre ele publicamente.
Esse jornal do Cantão refez a cronologia. No dia 19 de fevereiro, um homem em estado febril de 87 anos, Sr. Li, foi internado em um hospital de Xangai. No dia 26 de fevereiro, os especialistas consideraram a possibilidade de um vírus desconhecido. O Sr. Li morreu no dia 4 de março e as primeiras observações em laboratório mostravam que se tratava de uma nova variedade, o H7N9.
A informação surgiu no Weibo, o Twitter chinês, no dia 7 de março, mas os posts logo foram apagados e, no dia seguinte, os jornais de Xangai desmentiram a existência de um novo vírus.
Foi no dia 10 de março que um segundo laboratório também concluiu que era o H7N9, mesmo dia em que Wu Liangliang morreu. Mas foi preciso esperar até o dia 22 de março para que amostras forem enviadas a um laboratório nacional.
O jornal ressalta que nesse intervalo de tempo foi encerrada em Pequim a sagrada sessão da Assembleia Nacional Popular, que nomeou o novo governo. No dia 30 de março, o laboratório nacional confirmou enfim a existência do H7N9, e, no dia seguinte, o Ministério da Saúde finalmente informou o público.
Pesquisadores interessados no vetor da infecção
Uma década depois da crise da SARS (Síndrome Respiratória Aguda Grave, espécia de pneumonia provocada pelo coronavirus), dissimulada por vários meses, a questão é saber se essa demora resulta de empecilhos administrativos ou de uma vontade deliberada de não alarmar Pequim durante um grande acontecimento político.
Desde então, um balanço diário tem sido publicado pela Comissão Nacional da Saúde e do Planejamento Familiar, e a Organização Mundial da Saúde destaca a transparência das autoridades chinesas.
Os pesquisadores agora estão interessados no vetor da infecção, sendo que as autoridades chinesas prometem uma vacina dentro de um prazo de sete meses. "É preciso determinar qual espécie em particular leva o vírus para os mercados, onde em seguida ele é transmitido para os frangos, as codornas, os pombos. É preciso ir até as fazendas. É um trabalho considerável, indispensável para conter a transmissão", explica o virologista Malik Peiris, diretor científico do Instituto Pasteur, ligado à Universidade de Hong Kong.
Indústria alimentícia é fortemente afetada
O estudo de amostras de DNA do vírus transmitido dá indícios de que o rearranjo gênico que originou o H7N9 o torna transmissível por aves domésticas e não pelos pássaros migratórios. Isso explicaria por que os casos continuam concentrados em Xangai e nas três províncias mais próximas, Jiangsu, Zhejiang e Anhui.
A indústria alimentícia está sendo fortemente afetada por essa crise que, para o vice-secretário-geral da Associação Nacional da Indústria de Aves, Qiu Baoqing, representa um "golpe devastador". Em um fast-food do bairro de Jing"an, em Xangai, os nuggets de frango estão em promoção a 20 yuans (cerca de R$6,50) por 20 pedaços. Liu Dong, um estudante, pergunta: "Não é caro, mas quem se arriscaria?"
Tradutor: Lana Lim
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