sexta-feira, 12 de abril de 2013

Armadilha em águas turbulentas
Sébastien Hervieu - Le Monde
Divulgação / Playarte
Cena do filme "O Homem Mais Procurado do Mundo", de John Stockwell, sobre a caçada a Osama Bin Laden realizada por uma equipe da CIA em parceria com serviços especiais do exército norte-americano
Cena do filme "O Homem Mais Procurado do Mundo", de John Stockwell, sobre a caçada a Osama Bin Laden realizada por uma equipe da CIA em parceria com serviços especiais do exército norte-americano
Os americanos provavelmente não farão um filme sobre isso. A operação secreta efetuada na costa da África ocidental no dia 2 de abril não foi tão simbólica ou espetacular quanto a caçada da CIA a Osama Bin Laden ou a retirada de funcionários da embaixada dos Estados Unidos em Teerã em 1979. Mas, assim como nos recentes "Zero Dark Thirty" de Kathryn Bigelow e "Argo" de Ben Affleck, as autoridades americanas poderão se gabar de ter enganado seus inimigos.
Imagine a cena: José Américo Bubo Na Tchuto sobe a bordo de um barco ancorado em águas internacionais ao largo das ilhas de Cabo Verde. O ex-chefe da Marinha guineense pensava estar buscando uma carga de cocaína com traficantes vindos da América do Sul. Estes o receberam, mas se revelaram: eram membros da DEA, a agência antidrogas americana.
O comunicado da agência não detalha que cara fez o contra-almirante, preso no ato. Na companhia de dois cúmplices, ele compareceu perante um tribunal nova-iorquino na última sexta-feira (5). Ele pode pegar prisão perpétua. Outros quatro suspeitos também foram detidos durante operações conduzidas paralelamente.
Mas um bom filme hollywoodiano não começaria pelo fim. Ele primeiro retrataria os personagens. À direita, o lado do Bem, com o poderoso Bruce Willis lutando para proteger o povo americano dos danos da cocaína.
À esquerda, o lado do Mal encarnado por esse militar cujo currículo remonta à sua participação na luta pela independência de seu país, conquistada em 1974 das mãos dos portugueses. A nobre causa passou a ser somente uma lembrança distante.
Bubo Na Tchuto, que se tornou chefe da marinha em 2004, foi um dos homens que transformaram alguns anos atrás esse pequeno país em zona de trânsito para os narcotraficantes da América Latina, abrindo assim uma nova rota das drogas da África ocidental para a Europa, que as consome cada vez mais. Washington o colocou em 2010 na lista negra dos chefões do narcotráfico.
Agora sim, começa a trama. A armadilha começa a tomar forma no verão de 2012. Os agentes americanos se fazem passar por intermediários que vendem a droga em nome da FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), a guerrilha comunista colombiana. Uma parte dos sete suspeitos propõe comprar deles várias toneladas de mercadoria, que receberão em "cargas de uniformes militares", antes de armazená-la na costa guineense. Seu acesso é facilitado pelas várias ilhas ladeadas por mangues.
A intriga se complica. O caso não é somente de narcotráfico. Durante reuniões onde as conversas são gravadas, os suspeitos também aceitam entregar armas aos rebeldes colombianos com a ajuda de membros de alto escalão do exército guineense. Na agenda: "Mísseis solo-ar, fuzis de assalto, AK-47, lança-granadas" que "poderiam ser utilizados contra helicópteros americanos que operam na Colômbia". A armadilha vai se fechando.
Sobre o personagem principal, Bubo Na Tchuto, também. Será que as primeiras conversas permitiram que se fosse aos poucos entrando em contato com ele? Ou ele já fazia parte dos mandantes? O comunicado da agência americana não diz nada sobre isso. Além disso Bubo Na Tchuto propõe que se "utilize uma empresa da qual ele é dono para facilitar a saída de cocaína da Guiné-Bissau". Uma conversa fala em duas toneladas de cocaína. E qual seria a comissão dele? "Um milhão de dólares por tonelada".
Ele garante a seus interlocutores que é "o momento certo para conduzir a transação", pois "o governo da Guiné-Bissau está fraco, após um recente golpe de Estado" conduzido por militares em abril de 2012. Bubo Na Tchuto sabe do que está falando. Ele participou em 2008 e 2011 de duas tentativas de golpes contra o regime. Por causa dessa instabilidade crônica, a maioria dos 1,6 milhão de habitantes está vivendo na miséria.
Se, apesar de tudo, um cineasta americano quiser fazer um filme, ele já deverá pensar em uma sequência. De acordo com fontes policiais europeias citadas pelo jornalista especializado Christophe Champin, em seu blog RFI "Afrique drogue", Bubo Na Tchuto já foi "substituído" pelo atual chefe do estado-maior das forças armadas do país, Antonio Indjai, e pelo chefe da aeronáutica, Ibrahima Papa Camara. Este último também consta na lista negra americana.
Tradutor: Lana Lim

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