Mensaleiros e a lei: regalias e pedidos improváveis
Encarcerados na Papuda,
mensaleiros tentam atenuar suas penas com benefícios não aplicados a
tantos outros presos 'comuns' no país
Laryssa Borges - VEJA
Oito anos depois de o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmar
que se sentia “traído” por “práticas inaceitáveis” trazidas à tona pelo
escândalo do mensalão,
os principais condenados tentam a todo custo desqualificar o julgamento
que levou a antiga cúpula do PT ao banco dos réus. Na nova fase de
execução das sentenças pelo Supremo Tribunal Federal (STF), petistas
reclamam até do juiz que analisa questões acessórias do processo, como
autorizações para trabalho externo e transferência de condenados.
Do Complexo Penitenciário da Papuda, onde cumprem pena, os petistas
José Dirceu e Delúbio Soares tentam assumir o papel de vítima de uma
suposta "perseguição das elites". O ex-presidente do PT José Genoino,
que de punho erguido se apresentou à Polícia Federal em São Paulo, agora
suplica pelo benefício da prisão domiciliar. Em todos os casos alegam ser presos políticos condenados em um julgamento de exceção.
Para o jurista Guilherme de Souza Nucci, citado pelo ministro Ricardo
Lewandowski para absolver os réus, e pelo ministro Joaquim Barbosa para
condenar outros tantos, “não houve injustiça nenhuma” na pena imposta
aos mensaleiros.
“Li o acórdão do STF inteiro, mais de 8.000 páginas. Há provas mais
que suficientes para condenar todo mundo. Não houve injustiça nenhuma.
São provas de todos os tipos, mas principalmente provas indiciárias. Ao
contrário do que muitos dizem, a prova indiciária presta, sim, para
condenação. Ela é absolutamente válida”, disse ao site de VEJA. “No dia a
dia, réus sem nome nem sobrenome são condenados aos montes por indícios
porque prova direta está cada vez mais difícil. Quem vai cometer
corrupção documentada? Vai ter recibo de propina? Só se for doente
mental.”
Sem chances de reverter a maior parte das condenações – que se tornou
definitiva com o fim de parte do processo – os mensaleiros, sob custódia do Estado
desde o dia 15 de novembro, tentam agora se valer de benefícios
previstos em lei para tornar o cumprimento da pena mais leve, e com
privilégios não aplicados a tantos outros presos "comuns". Os
mensaleiros apresentaram pedidos de autorização para trabalhar e estudar
fora do presídio, querem ser abrigados em instituições perto de
familiares e, em casos específicos, ser agraciados com prisão domiciliar
– ou até com o perdão presidencial.
Paralelamente, insistem na tese de que têm direito a um novo
julgamento porque foram condenados diretamente na mais alta Corte do
país, em suposta violação ao princípio do duplo grau de jurisdição.
O julgamento ocorreu no Supremo porque três réus tinham direito a
foro privilegiado por serem parlamentares á época dos crimes. São eles:
Valdemar Costa Neto, Pedro Henry e João Paulo Cunha. Agora, parte dos 25
condenados falam até em apelar à Organização dos Estados Americanos (OEA).
“Os congressistas se deram, em 1988, o foro privilegiado na mais alta
Corte do Brasil. Eles se julgam tão especiais que querem ser julgados
pelo pleno do Supremo, no qual onze ministros, cuja tarefa primordial é
cuidar de temas constitucionais, são levados a julgar crimes comuns.
Ainda querem direito a outra instância? Duplo grau é recorrer para um
órgão superior. Eles já estão no ápice, já se deram o privilégio que
outros mortais não têm”, diz Nucci.
Trabalho - De acordo com Lei de Execução Penal, o
trabalho externo só é autorizado quando o condenado tiver cumprido, no
mínimo, um sexto da pena. Desde 2002, porém, o Superior Tribunal de
Justiça (STJ) tem autorizado em sucessivos processos o trabalho
independentemente deste tempo transcorrido. O Supremo, por sua vez, tem
decisões em sentido contrário, exigindo a comprovação de cumprimento
prévio de parte da sentença. No caso do mensalão, a possibilidade de
trabalho externo para condenados em regime semiaberto, como Dirceu e
Delúbio, está sob responsabilidade da Vara de Execuções Penais do DF.
Saudáveis - Especialista em direito processual penal
e juiz do Tribunal de Justiça de São Paulo, Nucci também questiona a
alegação de que mensaleiros com problemas de saúde, como Genoino e
Roberto Jefferson, teriam direito a prisão domiciliar. “Se um preso no
semiaberto tem problemas cardíacos, como José Genoino, não encontra
nenhum mecanismo na lei que lhe permita cumprir automaticamente a pena
em casa”, afirma. “Quantos réus não perecem nas cadeias por uma série de
problemas de saúde e ninguém fala nada? Por que os militantes que se
indignam com a prisão dos mensaleiros não falam dos pobres sem nome e
sem sobrenome, os que estão abandonados em cárceres superlotados?”, diz.
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