Shmuel Rosner *- IHT
Em meados de dezembro, um relatório do Instituto Nacional de Seguros e
do Birô Central de Estatísticas apontou que a taxa de pobreza de Israel
estava vergonhosamente alta: 23,5%. Ele mostrou que um quinto das
famílias --e um quinto dos aposentados-- em Israel é oficialmente pobre,
assim como um terço das crianças.
A desigualdade de renda de
Israel é uma das mais altas do mundo (atrás do Chile, México, Turquia e
dos Estados Unidos). Israel, como relatórios da Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico já indicaram mais de uma vez, de
alguma forma consegue ser uma "nação start-up", com alto crescimento
econômico; porém, ao mesmo tempo, permanece uma nação atrasada, com
muitas famílias extremamente pobres.
A publicação do relatório anual de pobreza provocou dois ou três dias de discussão acalorada. Aryeh Deri, o líder do Partido Shas, o chamou de uma "tempestade de pobreza". O Shas depende dos eleitores religiosos de baixa renda e o relatório foi uma oportunidade para um político manifestar seu ultraje. Mas a tempestade passou rapidamente.
Os israelenses já conhecem os números e a maioria já tem uma opinião formada a respeito. Muitos israelenses de classe média estão convencidos de que a culpa é dos próprios pobres --e a menos que eles façam alguma coisa a respeito, não há muito o que o Estado possa fazer por eles.
Dois segmentos da população de Israel se destacam como os mais pobres dos pobres: "os judeus ultraortodoxos" e os "árabes muçulmanos". As taxas de desemprego entre os judeus ultraortodoxos (a maioria homens ultraortodoxos) e árabes (a maioria mulheres árabes) são muito altas. Assim como as taxas de natalidade. O resultado: 59% dos ultraortodoxos são pobres. Igualmente, 58% dos árabes israelenses são pobres. Outros grupos com índices notadamente altos de pobreza são os idosos e os novos imigrantes --mas os números para esses dois grupos são muito menores, 23% e 17%, respectivamente.
A pobreza de Israel não deriva exclusivamente da falta de participação plena desses dois grupos em sua vida econômica. Mas a alta visibilidade entre os ultraortodoxos e árabes pobres influencia o debate público sem fim sobre como colocar um fim à pobreza.
Fomentar um senso de solidariedade social entre os israelenses de classe média em relação a esses grupos é difícil por vários motivos. Primeiro, os ultraortodoxos e árabes não se misturam muito com a maioria dos judeus israelenses (ambos os grupos não servem nas forças armadas e nem participam de outros serviços nacionais). Segundo, para ser franco, os israelenses sabem que os ultraortodoxos e os árabes estão desproporcionalmente representados na economia informal (para escapar dos impostos).
Finalmente, em grande parte eles são pobres por causa das escolhas que fazem --preferindo suas tradições em vez de participarem na economia israelense moderna. Colocando de modo simples, para os homens judeus ultraortodoxos, a escolha geralmente é estudar a Torá e ter muitos filhos (enquanto as mulheres precisam sustentar as famílias). Para os árabes muçulmanos, é manter as mulheres em casa e ter muitos filhos (enquanto os homens saem para trabalhar).
Todo país e toda sociedade tem um problema de solidariedade entre ricos e pobres. Mas em Israel, os rachas da sociedade ao longo das divisões étnicas e religiosas são exacerbados pela falta de confiança entre os grupos diferentes. Isso torna a pobreza em Israel muito mais problemática.
O judeu ultraortodoxo não é diferente apenas nos costumes; ele também tende a ter um número muito maior de filhos do que poderia criar convenientemente com uma renda baixa. O beduíno árabe não é diferente apenas étnica e religiosamente da maioria dos israelenses; ele também é mais pobre, em algumas áreas extremamente pobre. Judeus e árabes têm muitas questões que os separam; os rachas econômicos adicionam lenha à fogueira. Judeus seculares e ultraortodoxos têm questões que os dividem; a pobreza também adiciona lenha a essa fogueira.
Para que uma pessoa em boa situação financeira se importe mais com a pobreza de Israel, ela primeiro teria que ser convencida de que medidas necessárias foram tomadas para eliminar a pobreza por opção.
Apenas quando os homens ultraortodoxos e as mulheres árabes desempregados trabalharem e aqueles que atuam no mercado negro forem forçados a pagar impostos é que as classes média e alta estarão mais dispostas a pensar em uma redistribuição de renda. No momento, a maioria dos israelenses tem um bom motivo --ou uma boa desculpa-- para fazer objeção a qualquer tentativa de redistribuição que tire deles para dar para outros.
Há algumas boas notícias. Em consequência direta das políticas do governo, a taxa de emprego entre as populações tradicionalmente desempregadas está subindo rapidamente. Por outro lado, precisamente por causa dessa tendência, o percentual de famílias pobres com dois provedores também subirá (foi de 5% no último relatório). Os trabalhadores pouco qualificados estão finalmente ingressando na força de trabalho, mas naturalmente só podem conseguir trabalhos de baixa remuneração e não conseguem ganhar o suficiente para arcarem com suas despesas e subir acima da linha de pobreza. É claro, isso envia uma mensagem potencialmente devastadora para aqueles que ainda estão desempregados, a de que trabalhar não vale a pena.
Para que os israelenses de classe média se importem, a mensagem do Estado deveria ser bem diferente --uma que poderia ser chamada de crueldade compassiva. O Estado deveria dizer aos seus cidadãos: nós não nos importamos se o pobre por opção fique ainda mais pobre e receba ainda menos do Estado. Nós não nos importamos com as taxas de pobreza que todos levam em consideração, sem muita consideração pelas decisões pessoais e comunitárias e suas consequências. Mas asseguraremos que aqueles dispostos a trabalhar e pagar seus impostos sejam auxiliados apropriadamente, e o governo assegurará para que apenas eles sejam erguidos acima do nível de pobreza com recursos do governo.
* Shmuel Rosner é o editor de política do "The Jewish Journal" e membro do Instituto de Políticas para o Povo Judeu.
Tradutor: George El Khouri Andolfato
A publicação do relatório anual de pobreza provocou dois ou três dias de discussão acalorada. Aryeh Deri, o líder do Partido Shas, o chamou de uma "tempestade de pobreza". O Shas depende dos eleitores religiosos de baixa renda e o relatório foi uma oportunidade para um político manifestar seu ultraje. Mas a tempestade passou rapidamente.
Os israelenses já conhecem os números e a maioria já tem uma opinião formada a respeito. Muitos israelenses de classe média estão convencidos de que a culpa é dos próprios pobres --e a menos que eles façam alguma coisa a respeito, não há muito o que o Estado possa fazer por eles.
Dois segmentos da população de Israel se destacam como os mais pobres dos pobres: "os judeus ultraortodoxos" e os "árabes muçulmanos". As taxas de desemprego entre os judeus ultraortodoxos (a maioria homens ultraortodoxos) e árabes (a maioria mulheres árabes) são muito altas. Assim como as taxas de natalidade. O resultado: 59% dos ultraortodoxos são pobres. Igualmente, 58% dos árabes israelenses são pobres. Outros grupos com índices notadamente altos de pobreza são os idosos e os novos imigrantes --mas os números para esses dois grupos são muito menores, 23% e 17%, respectivamente.
A pobreza de Israel não deriva exclusivamente da falta de participação plena desses dois grupos em sua vida econômica. Mas a alta visibilidade entre os ultraortodoxos e árabes pobres influencia o debate público sem fim sobre como colocar um fim à pobreza.
Fomentar um senso de solidariedade social entre os israelenses de classe média em relação a esses grupos é difícil por vários motivos. Primeiro, os ultraortodoxos e árabes não se misturam muito com a maioria dos judeus israelenses (ambos os grupos não servem nas forças armadas e nem participam de outros serviços nacionais). Segundo, para ser franco, os israelenses sabem que os ultraortodoxos e os árabes estão desproporcionalmente representados na economia informal (para escapar dos impostos).
Finalmente, em grande parte eles são pobres por causa das escolhas que fazem --preferindo suas tradições em vez de participarem na economia israelense moderna. Colocando de modo simples, para os homens judeus ultraortodoxos, a escolha geralmente é estudar a Torá e ter muitos filhos (enquanto as mulheres precisam sustentar as famílias). Para os árabes muçulmanos, é manter as mulheres em casa e ter muitos filhos (enquanto os homens saem para trabalhar).
Todo país e toda sociedade tem um problema de solidariedade entre ricos e pobres. Mas em Israel, os rachas da sociedade ao longo das divisões étnicas e religiosas são exacerbados pela falta de confiança entre os grupos diferentes. Isso torna a pobreza em Israel muito mais problemática.
O judeu ultraortodoxo não é diferente apenas nos costumes; ele também tende a ter um número muito maior de filhos do que poderia criar convenientemente com uma renda baixa. O beduíno árabe não é diferente apenas étnica e religiosamente da maioria dos israelenses; ele também é mais pobre, em algumas áreas extremamente pobre. Judeus e árabes têm muitas questões que os separam; os rachas econômicos adicionam lenha à fogueira. Judeus seculares e ultraortodoxos têm questões que os dividem; a pobreza também adiciona lenha a essa fogueira.
Para que uma pessoa em boa situação financeira se importe mais com a pobreza de Israel, ela primeiro teria que ser convencida de que medidas necessárias foram tomadas para eliminar a pobreza por opção.
Apenas quando os homens ultraortodoxos e as mulheres árabes desempregados trabalharem e aqueles que atuam no mercado negro forem forçados a pagar impostos é que as classes média e alta estarão mais dispostas a pensar em uma redistribuição de renda. No momento, a maioria dos israelenses tem um bom motivo --ou uma boa desculpa-- para fazer objeção a qualquer tentativa de redistribuição que tire deles para dar para outros.
Há algumas boas notícias. Em consequência direta das políticas do governo, a taxa de emprego entre as populações tradicionalmente desempregadas está subindo rapidamente. Por outro lado, precisamente por causa dessa tendência, o percentual de famílias pobres com dois provedores também subirá (foi de 5% no último relatório). Os trabalhadores pouco qualificados estão finalmente ingressando na força de trabalho, mas naturalmente só podem conseguir trabalhos de baixa remuneração e não conseguem ganhar o suficiente para arcarem com suas despesas e subir acima da linha de pobreza. É claro, isso envia uma mensagem potencialmente devastadora para aqueles que ainda estão desempregados, a de que trabalhar não vale a pena.
Para que os israelenses de classe média se importem, a mensagem do Estado deveria ser bem diferente --uma que poderia ser chamada de crueldade compassiva. O Estado deveria dizer aos seus cidadãos: nós não nos importamos se o pobre por opção fique ainda mais pobre e receba ainda menos do Estado. Nós não nos importamos com as taxas de pobreza que todos levam em consideração, sem muita consideração pelas decisões pessoais e comunitárias e suas consequências. Mas asseguraremos que aqueles dispostos a trabalhar e pagar seus impostos sejam auxiliados apropriadamente, e o governo assegurará para que apenas eles sejam erguidos acima do nível de pobreza com recursos do governo.
* Shmuel Rosner é o editor de política do "The Jewish Journal" e membro do Instituto de Políticas para o Povo Judeu.
Tradutor: George El Khouri Andolfato
Do blog:
Ser pobre em Israel é bem diferente de ser pobre no Brasil.
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