domingo, 24 de fevereiro de 2013

"ASSASSINARAM O CAMARÃO/ASSIM COMEÇOU A TRAGÉDIA NO FUNDO DO MAR..."

Camarão nacional não é mais produto de exportação
Enchentes e doença derrubam produção e venda ao exterior fica zerada em 2012
Banco do Nordeste suspende crédito e atribui medida à alta inadimplência; criadores discordam
RENATA MOURA - FSP
A criação brasileira de camarão, com picos e vales nos últimos dez anos, começou este ano com restrições ao crédito e inadimplência recorde, após um 2012 difícil, com exportação inexistente.
A turbulência ocorre num momento em que a atividade, que já liderou as exportações de pescados do Brasil, sobrevive integralmente das vendas realizadas no país e tenta recuperar o fôlego.
O caminho para voltar aos anos dourados -uma década atrás- é longo. A produção caiu entre 15% e 20% -de 90 mil toneladas, em 2003, para algo em torno de 75 mil, em 2012. As exportações, nesse intervalo, se extinguiram.
No lado da produção, houve perdas devido a enchentes no Nordeste, em 2008 e 2009, que alagaram os tanques de criação. A região responde por 90% da produção.
A síndrome da mancha branca, causada por um vírus detectado em 2005 no Nordeste, também causou um baque nos viveiros.
"Hoje, essa síndrome [que não é transmitida ao ser humano] é a enfermidade de maior impacto. Principalmente porque pode atingir mortalidade de 90% da produção em dias", diz a pesquisadora Lissandra Souto Cavalli, do Instituto de Pesquisas Veterinárias Desidério Finamor, do Rio Grande do Sul.
Na Camanor (empresa do Rio Grande do Norte que foi a maior exportadora de camarão do país), a doença derrubou a produção em 80% desde 2011.
"A queda foi de 70 toneladas por mês para entre 10 e 15 toneladas", diz Werner Jost, dono da empresa.
Segundo Jost, a doença foi detectada há dez anos em Santa Catarina e há cinco no sul da Bahia. A partir de 2011 teriam surgido casos na Paraíba, no Rio Grande do Norte, em Pernambuco, em Sergipe e no norte baiano.
Em áreas não afetadas, a produção vem crescendo, e a perspectiva é de mais fôlego para este ano.
"O crescimento no Ceará será bem representativo, pois os produtores estão investindo na intensificação do cultivo. O mesmo vem acontecendo na Paraíba e no Piauí", diz Itamar Rocha, presidente da Associação Brasileira de Criadores de Camarão (ABCC).
CRÉDITO
O crédito, porém, está mais difícil. O Banco do Nordeste (BNB) suspendeu novos financiamentos ao setor. Uma taxa de inadimplência superior a 70% nas operações teria motivado a decisão. A taxa é 15 vezes a média geral da instituição, de 4,8%.
O BNB diz ter emprestado R$ 710 milhões ao setor nos últimos três anos. Desse valor, mais de 70% tem atraso de até dois anos no pagamento. Segundo o banco, 60% dos produtores estão inadimplentes.
O banco diz não ter explicação para o quadro nem previsão para retomar o crédito. Um diagnóstico da inadimplência do setor foi iniciado em janeiro e deve ser concluído no mês que vem.
A ABCC contesta as informações. "Os números são mentirosos, e a decisão do banco é política. Não existe a menor condição de haver essa taxa de inadimplência no setor", diz Rocha, da ABCC.

Produto argentino, mais barato, deve chegar ao país
Renata Moura - FSP
O Ministério da Pesca e Aquicultura aprovou trazer camarão da Argentina (congelado e pronto para o consumo). Há pelo menos dois anos, restaurantes brasileiros manifestam interesse nessa importação.
"A população aumentou, o consumo cresceu, e os restaurantes enfrentam dificuldades de fornecimento e preço", diz Alberto Lyra, diretor da Associação Nacional de Restaurantes.
O camarão argentino pode ser importado por US$ 4 o quilo, ante US$ 6 a US$ 7 do produto brasileiro. "O preço deve despencar com a concorrência", diz Werner Jost, dono da Camanor, do Rio Grande do Norte.
Para a Associação Brasileira de Criadores de Camarão (ABCC), a preocupação é outra. "Tememos o risco sanitário, de o camarão de fora trazer mais doenças", diz o presidente da ABCC, Itamar Rocha.
O governo federal afirma estar tomando as precauções necessárias. Ainda não há um acordo de importação assinado, segundo o Itamaraty, mas as negociações estão avançadas.
Os argentinos preveem a exportação, inicialmente, de 5.000 toneladas de camarão para o país. O último ano em que houve importação do crustáceo foi em 2009.
Segundo o Ministério da Pesca e Aquicultura, a espécie a ser trazida da Argentina provém "de pesca extrativa e diferente das espécies comuns do Brasil".

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