quarta-feira, 3 de abril de 2013

Banco Central Europeu lembra que não existe para preencher vazio político
Marie de Vergès - Le Monde
26.mar.13 - Yannis Behrakis/Reuters

Estudantes protestam contra a troika (Comissão Europeia, Banco Central Europeu  e FMI) em frente ao palácio presidencial em Nicósia, no ChipreEstudantes protestam contra a troika (Comissão Europeia, Banco Central Europeu e FMI) em frente ao palácio presidencial em Nicósia, no Chipre
Um verdadeiro alívio tomou conta dos escritórios da Eurotower em Frankfurt, na segunda-feira (25). Graças ao plano de resgate de Chipre confirmado de última hora pela zona do euro, o BCE (Banco Central Europeu) se viu dispensado de executar sua "ameaça": a de cortar, à meia-noite de segunda-feira, a torneira de liquidez destinada aos bancos cipriotas por falta de um acordo entre a ilha, a Europa e o FMI (Fundo Monetário Internacional).
"Era provavelmente a aposta certa, mas muito arriscada", considera em retrospecto Frederik Ducrozet, economista no Crédit Agricole. A ação da autoridade monetária teria precipitado a falência dos bancos cipriotas. E provavelmente contribuído para pressionar Nicósia para fora da zona do euro, correndo o risco de prejudicar seriamente a credibilidade de Mario Draghi.
O presidente do BCE não havia afirmado, no verão de 2012, que estava disposto a fazer "tudo que fosse necessário" para "preservar o euro"? Além disso, foi nessa promessa que os mercados financeiros encontraram há seis meses uma relativa serenidade e demonstraram um certo sangue frio ao longo da novela cipriota.
Ao repreender Nicósia através da voz de Jörg Asmussen, membro alemão do diretório, o BCE aumentou a pressão, a ponto de ser acusado por alguns de organizar o "bloqueio monetário" da ilha. Em Frankfurt, o BCE nega ter sido provocador ou demonstrado uma severidade em especial. E insiste que a mensagem era dirigida tanto a Chipre quanto ao Eurogrupo, a instância decisória que reúne os ministros das Finanças da zona do euro.
Há meses o Eurossistema fornece liquidez de emergência aos bancos cipriotas. No entanto, tal programa não pode servir para garantir a sobrevivência de estabelecimentos insolventes, o que evidentemente era o caso dos bancos da ilha. Portanto, estava fora de questão ir adiante sem que fosse decidida uma recapitalização do setor como parte de um plano de resgate.
"Chipre não teve escolha, mas não se pode esquecer que o BCE já havia ido incrivelmente longe" para sustentar o país, ressalta um ex-membro do diretório.
Foi esse o sentido do ultimato lançado pelo banco central: regras são regras, e a instituição não pretende desprezá-las. Uma mensagem que se mostra ainda mais forte pelo fato de que a guardiã do euro só ganhou poder desde o início da crise.

"Exemplo clássico"

Diante de uma Comissão Europeia que muitas vezes não é ouvida e de governos normalmente divididos, o BCE se impôs como a verdadeira instituição federal europeia. A única capaz de agir de forma rápida e incisiva para recuperar a confiança e evitar o naufrágio de certos países.
A prova mais vívida foi o anúncio, no verão de 2012, do programa OMT (Outright Monetary Transaction). Essa arma monetária lhe permitiu comprar títulos de dívidas de países em dificuldades e com a qual os mercados se deleitaram, a ponto de fazer do BCE o bombeiro da zona do euro.
Mas eis que o BCE se mostrou disposto a agir, contanto que permaneça no contexto de sua incumbência. Seu papel é garantir a liquidez, não resolver os problemas orçamentários, econômicos e bancários dos países. Ela não pretende preencher o vazio político.
"Enquanto houver boa fé dos dois lados, o BCE quer exercer seu papel", resume Gilles Moëc, economista do Deutsche Bank. "Mas ele quer acabar com essa ideia de que no final ele sempre termina cedendo. É preciso reavaliar seu limite de tolerância".
Segundo Moëc, o episódio cipriota se prestava bem a tal questionamento pelo fato de que a ex-"Pequena Suíça do Mediterrâneo" só representa 0,2% do PIB da zona do euro. Os riscos de contágio da crise pareciam limitados, portanto.
Mas a instituição continua alerta. As declarações do presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem, que chamou o resgate de Chipre de "exemplo clássico", reavivaram as preocupações e provam que o capítulo está bem longe de estar encerrado.
Membro da "troika" dos financiadores internacionais ao lado do FMI e da Comissão Europeia, encarregado da supervisão dos bancos da zona do euro a partir de 2014, o BCE não tem outra escolha senão continuar sendo um ator de primeiro plano na solução da crise.
Tradutor: Lana Lim

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