domingo, 1 de dezembro de 2013

Manobra ajudou Odebrecht no Galeão
Antes do leilão, Congresso mudou lei para liberar fundo do FGTS a investir em aeroportos, com aval do governo
Medida deu fôlego para a empresa, da qual o fundo é sócio; governo diz que mudança tem alcance mais amplo 
JULIO WIZIACK/MARIANA BARBOSA - FSP
Um mês antes do leilão dos aeroportos do Galeão (RJ) e de Confins (MG), o governo liberou o FI-FGTS, fundo criado com recursos do trabalhador, para investir em aeroportos. A decisão abriu caminho para a Odebrecht TransPort, que tem o fundo como sócio, vencer a disputa pelo Galeão.
A liberação para o fundo atuar nesse setor ocorreu por uma manobra legislativa.
O deputado João Carlos Bacelar (PR-BA) inseriu artigo ampliando o alcance dos investimentos do FI-FGTS em uma lei, de outubro, que tratava da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento). A mudança foi sancionada pela presidente Dilma.
Até então, o FI-FGTS, criado em 2008 para investimentos em infraestrutura, só podia atuar em energia, rodovia, ferrovia, hidrovia, porto e saneamento.
O governo nega direcionamento e diz que a mudança poderia destravar investimentos em geral. Afirma que qualquer empresa do setor poderia recorrer ao FI-FGTS (leia texto abaixo).
Em 2010, o FI-FGTS adquiriu 30% da Odebrecht TransPort --a única entre as participantes dos leilões de aeroportos que tinha o fundo como sócia. Mesmo sem poder contar com recursos do fundo, a empresa disputou Guarulhos e Viracopos, em 2012. Mas foi derrotada com um lance conservador.
Acabou perdendo Guarulhos para a OAS, que tem como sócios os fundos de pensão de BB, Caixa e Petrobras.
Desta vez, a Odebrecht virou o jogo. Convenceu o governo a impor restrições para quem já administrava aeroportos a participar do leilão de Confins e Galeão --desagradando a OAS e os fundos de pensão-- e teve o FI-FGTS liberado por lei.
Manobra legislativa similar ocorreu antes do leilão de Guarulhos, em fevereiro de 2012. Mas deu errado, porque a presidente Dilma vetou.
No segundo leilão, o governo mudou de ideia para estimular a concorrência por Galeão e Confins. Resultado: cinco concorrentes para o Galeão e três para Confins. A Odebrecht levou o Galeão por R$ 19 bilhões, com ágio de 294%.
O segundo maior lance foi R$ 4,5 bilhões menor que o da Odebrecht. Ninguém teve fôlego financeiro para cobri-la.
Nos bastidores, concorrentes mostraram-se surpresos com o apetite da companhia. Causou estranheza o aval do FI-FGTS para uma proposta tão agressiva. Em outros leilões de infraestrutura em que o fundo participou, os lances foram mais cautelosos.
O fundo opera com recursos do FGTS e não pode correr riscos elevados.

PROTEÇÃO
Ao entrar em um negócio como sócio, o fundo impõe regras severas de proteção. No Galeão, em caso de eventual prejuízo, poderá sair da sociedade. Neste caso, sua participação vira dívida, a ser honrada pela Odebrecht.
No passado, a entrada do fundo em aeroportos foi vetada pelo conselho curador do FGTS. Em outubro, o conselho validou a mudança, às vésperas da aprovação da lei.
A decisão não foi unânime. Trabalhadores preferiam apostar em habitação e saneamento. "Investimento tem de trazer benefício social e gerar emprego", diz Cláudio da Silva Gomes, representante da CUT no Conselho Curador do FGTS e no FI-FGTS.

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