domingo, 1 de dezembro de 2013

Política frouxa
CELSO MING - O Estado de S.Paulo
Às vezes, fica a impressão de que o governo usa deliberadamente um discurso enganador para encobrir os resultados ruins das contas públicas. Outras vezes, a impressão é a de que o governo se autoengana, é surpreendido pelos fatos e depois fica derrapando em explicações. Não dá para saber o que é pior para a sua credibilidade, se é enganar ou ser enganado.
Em setembro apareceu um rombo de quase R$ 10 bilhões nas contas públicas. O secretário do Tesouro, Arno Augustin, o inventor da chamada contabilidade criativa que enfeitou os números finais de 2012, não teve então como esconder o estrago. Mas apressou-se em garantir que outubro seria diferente e, até lá, já não se falaria mais do que acontecera em setembro. Pois vieram as contas de outubro, com um superávit, sim, mas de apenas R$ 6,2 bilhões, o mais baixo registrado em meses de outubro desde 2002.
Na quinta-feira, o secretário Augustin fingiu que se esquecera do que anunciara 30 dias antes, mas reprisou as promessas, desta vez para novembro: "Vai ser um resultado histórico", supostamente para melhor.
É provável que seja mesmo, não porque o governo tenha sido mais responsável na administração das contas públicas em novembro, mas porque prevê receitas extraordinárias, tanto em bônus de assinatura da licitação das reservas de petróleo de Libra quanto do que a Receita Federal conseguir arrancar na operação espreme-empresa (Refis). Não se trata de conversão ao bom caminho. Estas são fontes extraordinárias de arrecadação; entram só uma vez e não refletem nenhuma correção de rumo na política fiscal.
Apesar desse reforço extra, fica ameaçado o cumprimento do compromisso do governo de entregar até mesmo um superávit primário (sobra de arrecadação para pagamento da dívida) de R$ 73 bilhões (1,5% do PIB), meta que, por sua vez, já havia sido rebaixada de R$ 108 bilhões (2,3% do PIB).
Independentemente da mistura de falta de sinceridade com frouxidão na administração, prevalece a pilotagem contraditória. De um lado, a turma do acelerador gasta o que tem e o que não tem para aumentar a demanda; de outro, o Banco Central puxa os juros para frear a demanda e compensar os efeitos inflacionários da política fiscal frouxa. É como o que ocorreu com o Boeing da TAM em 1996, cuja turbina esquerda acelerava para garantir a decolagem na pista de Congonhas, mas o outro motor estava em posição de reversão e freava a aeronave.
A principal consequência não são apenas avarias na credibilidade do governo; é o desastre anunciado, se a anomalia não for corrigida a tempo.
Acumulam-se os sinais de que a economia está desequilibrada. O consumo de bens e serviços segue mais forte do que a oferta. O rombo nas contas externas vai-se alargando. Para tentar combater a inflação, o governo represa os preços dos combustíveis e das tarifas públicas e, com isso, além de estropiar a capacidade de investimento da Petrobrás, obtém menos arrecadação.
Diante disso, o investidor faz o quê? Espera pra ver o que acontece e só deixa para arriscar seus investimentos quando as coisas estiverem mais claras.

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