Pressão sobre policiais cresce, na Argentina e no continente
POR QUE NÃO PERMITIR QUE POLICIAIS TENHAM SEUS DIREITOS TRABALHISTAS RECONHECIDOS?
SABINA FREDERIC - FSP
Um rastro de protestos de policiais em 20 entre 23 províncias deixou
governantes e cidadãos argentinos em alerta recentemente. Ainda não se
dissipara a recordação de três outros aquartelamentos durante este ano e
do conflito intenso protagonizado pela gendarmaria em 2012.
Essa recorrência traz à tona um dos paradoxos das democracias na América
Latina. A escalada da insegurança fez aumentarem o peso e as dimensões
das instituições policiais na região. Além disso, cresceu a pressão
pública por mais eficiência e profissionalismo policial, com respeito
absoluto pelos direitos humanos dos cidadãos.
Enquanto isso, continuam a ser negados direitos como o da
sindicalização, sem que existam mecanismos que garantam condições de
bem-estar e remuneração.
O Brasil acumula cerca de 160 protestos policiais nos últimos dez anos.
Países como Honduras e Equador sofreram protestos policiais que
derivaram em conspirações contra o Estado de Direito.
A situação contrasta nitidamente com a da América do Norte e da União
Europeia, cujas polícias têm o direito de sindicalização sem greves e
costumam manifestar-se publicamente. Em nossa região, apenas o Uruguai
tem sindicato policial reconhecido.
A pergunta é: por que não permitir que policiais tenham seus direitos
trabalhistas reconhecidos? Nós, que há muitos anos realizamos trabalho
de campo etnográfico entre policiais, sabemos que o argumento contrário à
concessão de tais direitos vem da negação da condição de trabalhador
aos policiais, justificada por uma essência do "ser policial", que seria
alheia à dignidade do "trabalho".
Essa visão costuma rejeitar a pergunta de como as lógicas sociais,
políticas e jurídicas os atravessam e recusar a questão de como
clivagens geracionais, de gênero e de classe são alguns dos princípios
que regulam as tarefas que cabem à polícia.
Hoje, temos instituições policiais com alta proporção de jovens
socializados numa era de expansão dos direitos dos cidadãos e protestos
por sua ampliação. Por que eles deveriam evitar tomar a palavra ou
resistir a certas microextorsões que, na ausência de canais paralelos de
reivindicação, alimentam a cadeia de comando e o funcionamento crucial
das polícias?
Acreditamos que o debate sobre sua condução democrática deva começar com
a ampliação do olhar para essas outras realidades, cujo conhecimento é
necessário para qualquer reforma viável.
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