segunda-feira, 27 de maio de 2013

Comunidades de imigrantes não se misturam em bairro onde soldado inglês sofreu ataque
Eric Albert - Le Monde      
AFP
A francesa Ingrid Loyau-Kennett, que desceu do ônibus para conversar com um dos suspeitos
A francesa Ingrid Loyau-Kennett, que desceu do ônibus para conversar com um dos suspeitos
Primeiro, o pior. Inebriada de raiva, uma mulher de 60 e poucos anos berra grosserias no pub, diante de uma grande taça de vinho branco, às duas horas da tarde. "Como eles se atrevem a atacar um de nossos soldados, um dos nossos? Precisava cortar fora o pinto desses muçulmanos desgraçados, fazê-los comerem e furar seus olhos."
Ainda que meio constrangidos, os outros clientes do Anglesea Arms não estão longe de concordar: o assassinato de um militar britânico por dois supostos terroristas islâmicos, a 200 metros de lá, no bairro de Woolwich, em Londres, na quarta-feira (22), só veio reforçar seus preconceitos.
Em seguida, o melhor. Ingrid Loyau-Kennet, de 49 anos, nascida em Orléans e residente de longa data do Reino Unido, passava por acaso perto da cena do crime na quarta-feira. Ela imediatamente desceu de seu ônibus com seu estojo de primeiros-socorros e foi conversar, com impressionante sangue frio, com um dos dois agressores que seguravam facas ensanguentadas na mão. "Vi que ele estava um pouco exaltado e pensei que seria melhor falar com ele", diz com simplicidade à ITV. Após alguns minutos de conversa, Loyau-Kennet subiu novamente em seu ônibus para continuar com seu trajeto… A imprensa britânica decidiu fazer dela uma de suas heroínas, sem destacar sua nacionalidade francesa.
O bairro de Woolwich oferece um concentrado do melhor e do pior da imigração londrina: um caldeirão surpreendente, onde as nacionalidades coabitam sem nenhum problema; mas também comunidades que convivem sem jamais se misturarem.
Pobreza e desemprego
Em volta da cena do crime, cercada pela polícia, moradores de todas as origens traziam flores espontaneamente na quinta-feira. Todos exprimiam o "choque" e a "raiva" que sentiam. O primeiro-ministro, David Cameron, que foi até o local, também enviou uma mensagem de união: "As pessoas que fizeram isso estão tentando nos dividir. Eles precisam saber que algo como isso só pode nos aproximar". Os representantes da comunidade muçulmana condenaram o ataque em unanimidade.
Porém, por trás do verniz de solidariedade, a realidade de Woolwich logo aparece. Quatro comunidades vivem lado a lado sobre um pano de fundo de pobreza e desemprego, apesar de obras "tapa-miséria" no centro da cidade. A primeira é militar: o enorme quartel da artilharia real, de onde saía o soldado assassinado, ocupa um imenso terreno cercado de arame farpado. Suas instalações hoje abrigam um centro de treinamento e soldados em trânsito, que raramente saem de uniforme.
O morador do bairro Stephen Glowers, de 56 anos, viu as outras três comunidades chegarem uma atrás da outra. "Primeiro fomos nós, os brancos de classes mais baixas, depois os imigrantes da Índia e do Paquistão, há 40 anos, e, por fim, os africanos, sobretudo somalis, 20 anos atrás." Ele, que está desempregado há muito tempo, descreve as tensões: "Há algumas semanas os jovens do subcontinente indiano brigaram com os africanos; houve facadas. Mas só saíram duas linhas nos jornais".
Atrás do pub, jovens somalis bancam os durões. Ali é território deles: os restaurantes, os cafés e o salão de cabeleireiro pertencem a seus amigos. Nas lojas, clientes antigos passam horas conversando diante de um prato de frango, recebendo o visitante estrangeiro com bastante desconfiança. "Esta noite, as lojas vão fechar às 17h porque o pessoal está com medo da EDL [English Defence League, movimento extremista anti-islâmico]", diz Abdi Ahmed, 40. O bairro continuava com os nervos à flor da pele 24 horas após o assassinato.
Tradutor: UOL

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