Jodi Rudoren - NYT
Durante mais de dois anos, os líderes israelenses vem insistindo que não têm nenhuma intenção de intervir na guerra civil que assola a vizinha Síria, apesar de terem prometido impedir que armas sofisticadas sejam transferidas para a milícia libanesa Hizbollah e dizerem que irão reagir a ataques intencionais a seu território.
Agora, após terem realizado alguns ataques aéreos a carregamentos de armas este mês e de, na terça-feira (21) passada, terem destruído uma posição do exército sírio, os israelenses estão se perguntando quais são suas opções, como se sentissem que ficou impossível evitar um envolvimento mais profundo no conflito.
Os discursos de ambos os lados já demonstram um tom mais exaltado. As autoridades sírias declararam que estão preparadas para um grande confronto com Israel e o comandante militar de Israel tem alertado os sírios sobre as terríveis consequências que uma ação síria traria.
"Claramente, essa política funcionou bem durante mais de dois anos para Israel, mas ela não está mais funcionando, pois a Síria, o Irã, o Hizbollah e a Rússia aumentaram suas apostas", disse Itamar Rabinovich, ex-negociador-chefe de Israel com a Síria, que também mencionou que a Rússia continua enviando armamentos sofisticados para os sírios, apesar dos protestos de norte-americanos e israelenses. "Eles criaram novas regras para o jogo, regras que Israel precisa entender. Nossa política está em formação. As respostas não são definitivas".
Vários altos funcionários do governo israelense, assim como uma dezena de especialistas em assuntos relacionados à Síria e às forças armadas de Israel, disseram, na última quarta-feira (22), que nenhuma nova política está sendo estudada em Jerusalém. Mas há uma crescente conscientização de que a continuidade da atual política provavelmente produzirá resultados diferentes a partir de agora.
Segundo os israelenses, há uma probabilidade muito maior de retaliação por parte do presidente sírio, Bashar Assad, na próxima vez que Israel atacar um comboio de armas, considerando-se as recentes declarações de Damasco. E isso poderia levar a uma reação mais belicosa por parte de Israel – e a uma escalada interminável do conflito.
"Eu acho que nós estamos sendo muito comedidos e muito cautelosos em uma situação muito volátil", disse uma autoridade israelense, que pediu para não ser identificada, pois não tem autorização para discutir o assunto publicamente. Outra autoridade, que também pediu para não ser identificada, afirmou: "Até agora não há nenhuma alteração", dando a entender que pode haver uma mudança na política israelense qualquer dia desses – ou a qualquer minuto.
Israel e a Síria permanecem em estado de guerra técnico, mas conseguiram manter uma calmaria cautelosa ao longo da linha de cessar-fogo, de 43 metros, que existe entre os dois países desde 1973, quando foi criada. Na terça-feira passada, a Síria reconheceu pela primeira vez que havia atacado intencionalmente um alvo israelense – um veículo militar. Autoridades sírias disseram que o jipe entrou em seu território, perto das Colinas de Golã, afirmação que Israel nega veementemente.
Na quarta-feira, analistas descartaram a possibilidade de Israel estabelecer uma nova zona tampão, de segurança, do lado sírio da linha – e não apenas porque isso seria visto como uma grande invasão do território sírio.
Os dois rios que ficam próximos à linha, na região sul das Colinas de Golã, representam dificuldades geográficas naturais à movimentação na região, disseram eles. E, em outras áreas, há várias posições-chave do exército sírio.
"Estabelecer uma zona tampão não funcionaria ali", disse Ehud Yaari, membro do Washington Institute for Near East Policy (Instituto Washington para a Política do Oriente Médio), lotado em Israel. "Se tentarmos criar uma zona tampão, ela imediatamente aumentaria a proximidade e o atrito com as principais forças militares sírias e seus acampamentos".
Outra ideia que está sendo discutida em Jerusalém é a possibilidade de Israel estabelecer uma espécie de "força por procuração" para combater dentro da Síria, ao armar ou apoiar moradores de aldeias próximas à linha de cessar-fogo, que talvez pudessem ser liderados pelos drusos, uma seita minoritária da Síria que também possui cerca de 20 mil membros vivendo em território controlado pelos israelenses.
Vários israelenses que acompanham de perto a situação na Síria disseram que as forças de segurança de Israel já vem trabalhando discretamente com os moradores das aldeias locais – que não apoiam nem o governo sírio nem os rebeldes –, fornecendo ajuda humanitária de forma moderada e mantendo seu serviço de inteligência em intensa atividade na região.
Mas eles disseram que qualquer intenção de armar esses moradores está praticamente descartada, e observaram que a principal liderança drusa na Síria tem se mantido firme em sua decisão de ficar fora do conflito até o momento.
"É muito, mas muito prematuro" pensar em usar uma terceira parte para combater os sírios, afirmou Rabinovich, que atualmente é vice-presidente do Instituto de Estudos sobre Segurança Nacional. "Isso é o que se costuma fazer quando um governo entra em colapso e temos que lidar com a anarquia que surge nas fronteiras. Mas nós ainda não chegamos a esse ponto".
Mas, apesar de essas ideias não estarem sendo consideradas, há pouco consenso em Israel sobre o que o país poderá fazer em seguida. A maioria dos israelenses concorda que o cenário mudou, mesmo que apenas devido às novas ameaças acaloradas disparadas por todos os lados envolvidos. "Os sírios estão de mãos atadas devido a sua própria incapacidade", disse Yaari.
Para Assad, o envolvimento com Israel poderia desviar a atenção do massacre que ele está promovendo contra seu próprio povo, além de ajudá-lo a conseguir apoio interno e de todo o mundo árabe. Por outro lado, Assad estaria correndo o risco de sofrer sérias retaliações por parte de Israel, que poderia devastar suas forças militares e, possivelmente, alterar o equilíbrio de poder na luta travada pelo presidente sírio contra os rebeldes.
Para Israel, um maior envolvimento no conflito sírio poderia levar a um resultado indesejado: apressar a queda do governo Assad, deixando áreas próximas à linha de cessar-fogo nas mãos de grupos jihadistas radicais.
Esse envolvimento também poderia ter consequências diplomáticas desastrosas para a complicada relação de Israel com a Rússia. E, em Israel, muitos acreditam que o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu deseja conservar seus recursos militares e o apoio do público para enfrentar a permanente possibilidade de um ataque contra as instalações do programa nuclear iraniano.
"No passado, sempre que tentamos influenciar os problemas internos de um país vizinho, os resultados foram muito ruins", disse Giora Eiland, ex-conselheiro de segurança nacional de Israel, ao citar a manobra realizada por seu país no sul do Líbano em 1982, que levou a um período de duas décadas de ocupação e à criação do Hizbollah. "Às vezes, há uma tensão entre duas coisas. Primeiro, existe a questão de uma situação que pode afetar nossos principais interesses. Em segundo lugar, há a nossa incapacidade de fazer alguma coisa para mudar isso. Às vezes, a única coisa que podemos fazer é não fazer nada".
Tradutora: Cláudia Gonçalves
Agora, após terem realizado alguns ataques aéreos a carregamentos de armas este mês e de, na terça-feira (21) passada, terem destruído uma posição do exército sírio, os israelenses estão se perguntando quais são suas opções, como se sentissem que ficou impossível evitar um envolvimento mais profundo no conflito.
Os discursos de ambos os lados já demonstram um tom mais exaltado. As autoridades sírias declararam que estão preparadas para um grande confronto com Israel e o comandante militar de Israel tem alertado os sírios sobre as terríveis consequências que uma ação síria traria.
"Claramente, essa política funcionou bem durante mais de dois anos para Israel, mas ela não está mais funcionando, pois a Síria, o Irã, o Hizbollah e a Rússia aumentaram suas apostas", disse Itamar Rabinovich, ex-negociador-chefe de Israel com a Síria, que também mencionou que a Rússia continua enviando armamentos sofisticados para os sírios, apesar dos protestos de norte-americanos e israelenses. "Eles criaram novas regras para o jogo, regras que Israel precisa entender. Nossa política está em formação. As respostas não são definitivas".
Vários altos funcionários do governo israelense, assim como uma dezena de especialistas em assuntos relacionados à Síria e às forças armadas de Israel, disseram, na última quarta-feira (22), que nenhuma nova política está sendo estudada em Jerusalém. Mas há uma crescente conscientização de que a continuidade da atual política provavelmente produzirá resultados diferentes a partir de agora.
Segundo os israelenses, há uma probabilidade muito maior de retaliação por parte do presidente sírio, Bashar Assad, na próxima vez que Israel atacar um comboio de armas, considerando-se as recentes declarações de Damasco. E isso poderia levar a uma reação mais belicosa por parte de Israel – e a uma escalada interminável do conflito.
"Eu acho que nós estamos sendo muito comedidos e muito cautelosos em uma situação muito volátil", disse uma autoridade israelense, que pediu para não ser identificada, pois não tem autorização para discutir o assunto publicamente. Outra autoridade, que também pediu para não ser identificada, afirmou: "Até agora não há nenhuma alteração", dando a entender que pode haver uma mudança na política israelense qualquer dia desses – ou a qualquer minuto.
Israel e a Síria permanecem em estado de guerra técnico, mas conseguiram manter uma calmaria cautelosa ao longo da linha de cessar-fogo, de 43 metros, que existe entre os dois países desde 1973, quando foi criada. Na terça-feira passada, a Síria reconheceu pela primeira vez que havia atacado intencionalmente um alvo israelense – um veículo militar. Autoridades sírias disseram que o jipe entrou em seu território, perto das Colinas de Golã, afirmação que Israel nega veementemente.
Na quarta-feira, analistas descartaram a possibilidade de Israel estabelecer uma nova zona tampão, de segurança, do lado sírio da linha – e não apenas porque isso seria visto como uma grande invasão do território sírio.
Os dois rios que ficam próximos à linha, na região sul das Colinas de Golã, representam dificuldades geográficas naturais à movimentação na região, disseram eles. E, em outras áreas, há várias posições-chave do exército sírio.
"Estabelecer uma zona tampão não funcionaria ali", disse Ehud Yaari, membro do Washington Institute for Near East Policy (Instituto Washington para a Política do Oriente Médio), lotado em Israel. "Se tentarmos criar uma zona tampão, ela imediatamente aumentaria a proximidade e o atrito com as principais forças militares sírias e seus acampamentos".
Outra ideia que está sendo discutida em Jerusalém é a possibilidade de Israel estabelecer uma espécie de "força por procuração" para combater dentro da Síria, ao armar ou apoiar moradores de aldeias próximas à linha de cessar-fogo, que talvez pudessem ser liderados pelos drusos, uma seita minoritária da Síria que também possui cerca de 20 mil membros vivendo em território controlado pelos israelenses.
Vários israelenses que acompanham de perto a situação na Síria disseram que as forças de segurança de Israel já vem trabalhando discretamente com os moradores das aldeias locais – que não apoiam nem o governo sírio nem os rebeldes –, fornecendo ajuda humanitária de forma moderada e mantendo seu serviço de inteligência em intensa atividade na região.
Mas eles disseram que qualquer intenção de armar esses moradores está praticamente descartada, e observaram que a principal liderança drusa na Síria tem se mantido firme em sua decisão de ficar fora do conflito até o momento.
"É muito, mas muito prematuro" pensar em usar uma terceira parte para combater os sírios, afirmou Rabinovich, que atualmente é vice-presidente do Instituto de Estudos sobre Segurança Nacional. "Isso é o que se costuma fazer quando um governo entra em colapso e temos que lidar com a anarquia que surge nas fronteiras. Mas nós ainda não chegamos a esse ponto".
Mas, apesar de essas ideias não estarem sendo consideradas, há pouco consenso em Israel sobre o que o país poderá fazer em seguida. A maioria dos israelenses concorda que o cenário mudou, mesmo que apenas devido às novas ameaças acaloradas disparadas por todos os lados envolvidos. "Os sírios estão de mãos atadas devido a sua própria incapacidade", disse Yaari.
Para Assad, o envolvimento com Israel poderia desviar a atenção do massacre que ele está promovendo contra seu próprio povo, além de ajudá-lo a conseguir apoio interno e de todo o mundo árabe. Por outro lado, Assad estaria correndo o risco de sofrer sérias retaliações por parte de Israel, que poderia devastar suas forças militares e, possivelmente, alterar o equilíbrio de poder na luta travada pelo presidente sírio contra os rebeldes.
Para Israel, um maior envolvimento no conflito sírio poderia levar a um resultado indesejado: apressar a queda do governo Assad, deixando áreas próximas à linha de cessar-fogo nas mãos de grupos jihadistas radicais.
Esse envolvimento também poderia ter consequências diplomáticas desastrosas para a complicada relação de Israel com a Rússia. E, em Israel, muitos acreditam que o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu deseja conservar seus recursos militares e o apoio do público para enfrentar a permanente possibilidade de um ataque contra as instalações do programa nuclear iraniano.
"No passado, sempre que tentamos influenciar os problemas internos de um país vizinho, os resultados foram muito ruins", disse Giora Eiland, ex-conselheiro de segurança nacional de Israel, ao citar a manobra realizada por seu país no sul do Líbano em 1982, que levou a um período de duas décadas de ocupação e à criação do Hizbollah. "Às vezes, há uma tensão entre duas coisas. Primeiro, existe a questão de uma situação que pode afetar nossos principais interesses. Em segundo lugar, há a nossa incapacidade de fazer alguma coisa para mudar isso. Às vezes, a única coisa que podemos fazer é não fazer nada".
Tradutora: Cláudia Gonçalves
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