CELSO ARNALDO ARAÚJO
Os diferentes níveis de linguagem – basicamente, o culto, o coloquial, o técnico e o literário – são intransponíveis e incomunicáveis para quem só domina um deles. Dilma Rousseff, caso raro no fascinante território da fala humana, não domina nenhum dos quatro. Daí porque, na extrema ousadia de ultimamente citar ou transcrever Nelson Rodrigues, cujas sentenças lapidares têm um rigor léxico e sintático quase matemático, ela soe muito pior do que qualquer personagem do submundo da periferia da vida como ela é. O agora centenário Nelson não deve, porém, revirar-se no jazigo perpétuo 18340-A, quadra 43, do São João Batista, por ser interpretado de maneira tão imprópria por uma presidente da República.
Pois Dilma também já demonstrou, mais de uma vez, enorme dificuldade em reproduzir com fidelidade frásica a fala bruta de um matuto do sertão, ceifando na raiz a mais pura pérola de sabedoria de um dito popular ─ como ocorreu na já célebre alegoria, ouvida de um popular no nordeste, segundo a qual as mulheres são metade da população e mães da outra metade. Mesmo tentando resgatar o pensamento de um iletrado, é Dilma quem não tem as letras.
Mas aqui fala um dilmólogo de primeira hora: Dilma tem um diferencial competitivo no terreno da linguagem ─ ela é proficiente num quinto nível de linguagem, o dilmês, do qual é usuária única.
Nessa condição, como Nelson para ela, Dilma é irreproduzível. Um desafio a quem experimentar conjugar o dilmês: ouça um único parágrafo de Dilma em qualquer discurso, sobre qualquer tema, mas não anote nada. Depois, tente transcrever fielmente, palavra por palavra, no papel, o que acha que ouviu. O resultado final ─ sempre mais fluente que o original, porque mediado por um raciocínio comum ─ estará a anos-luz do dilmês legítimo. Para confirmar, volte a ouvir a fala presidencial, sem intermediários, comparando-a agora com o texto que pretendeu registrá-la. Convença-se então de que o dilmês é indescritível, intranscritível, por qualquer outra mente.
Daí porque o dilmês não se presta a transcrever nada do modo como foi dito por quem quer que seja ─ de Nelson Rodrigues a uma beneficiária do Bolsa Família no interior do Piauí. No universo da fala humana, o dilmês só responde e corresponde à mente de Dilma Rousseff.
Imagino Dilma reciclando duas das mais sintéticas e bem esculpidas frases de Nelson Rodrigues ─ ambas com apenas cinco palavras, um sujeito, um verbo, um artigo indefinido e um predicado:
“O brasileiro é um feriado”.
“O Marx é uma besta”.
Agora imagine o que Dilma faria, no discurso de inauguração de um dos estádios da Copa, com essas duas duplas de cinco palavrinhas cunhadas por seu novo guru de infância. Um esboço:
“Nelson Rodrigues, ele, um cronista famoso no que se refere à fama que ele teve como cronista, dizia que o brasileiro não falta ao trabalho nem no feriado porque ele próprio é um feriado”
“E aí, como falou lá atrás um dia esse homem muito engraçado, Nelson Rodrigues, eu queria dizer para vocês, que ele dizia, eu diria assim, que Marx se fazia de besta, mas era um homem que inspirava ideias”.
Ficou mais ou menos? Melhor que isso, só Dilma.
Os diferentes níveis de linguagem – basicamente, o culto, o coloquial, o técnico e o literário – são intransponíveis e incomunicáveis para quem só domina um deles. Dilma Rousseff, caso raro no fascinante território da fala humana, não domina nenhum dos quatro. Daí porque, na extrema ousadia de ultimamente citar ou transcrever Nelson Rodrigues, cujas sentenças lapidares têm um rigor léxico e sintático quase matemático, ela soe muito pior do que qualquer personagem do submundo da periferia da vida como ela é. O agora centenário Nelson não deve, porém, revirar-se no jazigo perpétuo 18340-A, quadra 43, do São João Batista, por ser interpretado de maneira tão imprópria por uma presidente da República.
Pois Dilma também já demonstrou, mais de uma vez, enorme dificuldade em reproduzir com fidelidade frásica a fala bruta de um matuto do sertão, ceifando na raiz a mais pura pérola de sabedoria de um dito popular ─ como ocorreu na já célebre alegoria, ouvida de um popular no nordeste, segundo a qual as mulheres são metade da população e mães da outra metade. Mesmo tentando resgatar o pensamento de um iletrado, é Dilma quem não tem as letras.
Mas aqui fala um dilmólogo de primeira hora: Dilma tem um diferencial competitivo no terreno da linguagem ─ ela é proficiente num quinto nível de linguagem, o dilmês, do qual é usuária única.
Nessa condição, como Nelson para ela, Dilma é irreproduzível. Um desafio a quem experimentar conjugar o dilmês: ouça um único parágrafo de Dilma em qualquer discurso, sobre qualquer tema, mas não anote nada. Depois, tente transcrever fielmente, palavra por palavra, no papel, o que acha que ouviu. O resultado final ─ sempre mais fluente que o original, porque mediado por um raciocínio comum ─ estará a anos-luz do dilmês legítimo. Para confirmar, volte a ouvir a fala presidencial, sem intermediários, comparando-a agora com o texto que pretendeu registrá-la. Convença-se então de que o dilmês é indescritível, intranscritível, por qualquer outra mente.
Daí porque o dilmês não se presta a transcrever nada do modo como foi dito por quem quer que seja ─ de Nelson Rodrigues a uma beneficiária do Bolsa Família no interior do Piauí. No universo da fala humana, o dilmês só responde e corresponde à mente de Dilma Rousseff.
Imagino Dilma reciclando duas das mais sintéticas e bem esculpidas frases de Nelson Rodrigues ─ ambas com apenas cinco palavras, um sujeito, um verbo, um artigo indefinido e um predicado:
“O brasileiro é um feriado”.
“O Marx é uma besta”.
Agora imagine o que Dilma faria, no discurso de inauguração de um dos estádios da Copa, com essas duas duplas de cinco palavrinhas cunhadas por seu novo guru de infância. Um esboço:
“Nelson Rodrigues, ele, um cronista famoso no que se refere à fama que ele teve como cronista, dizia que o brasileiro não falta ao trabalho nem no feriado porque ele próprio é um feriado”
“E aí, como falou lá atrás um dia esse homem muito engraçado, Nelson Rodrigues, eu queria dizer para vocês, que ele dizia, eu diria assim, que Marx se fazia de besta, mas era um homem que inspirava ideias”.
Ficou mais ou menos? Melhor que isso, só Dilma.
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