Michel Noblecourt - Le Monde
Harlem Désir, o primeiro secretário do Partido Socialista (PS), participou na quarta-feira (22), em Leipzig, na Alemanha, de uma mesa-redonda sobre "a justiça social no centro da luta socialdemocrata hoje". Na quinta-feira (23), François Hollande pronunciou um discurso na ocasião do 150º aniversário do SPD, o Partido Socialdemocrata alemão.
O PS, que sempre teve relações meio conflituosas com seu primo alemão até onde é possível lembrar –por exemplo, na época de François Mitterrand e de Willy Brandt–, tem dificuldades em aceitar o fato de que o outro rompeu com o marxismo; teria ele se tornado socialdemocrata?
Durante sua coletiva de imprensa, na quinta-feira (16), François Hollande negou ter se convertido. "Sou socialista", afirmou o presidente da República. "Preciso dizer socialdemocrata? Seria melhor ser socialdemocrata? Por acaso dirigi durante anos o Partido Socialista, não o chamei de Partido Socialdemocrata". "Sou um socialista", ele proclamou resolutamente, "que quer prosperidade para a França". Mas quando um presidente socialista se exprime como um gestor socialdemocrata que quer acabar com o endividamento de seu país e vencer a briga da competitividade, a dúvida permanece.
Para Jean-Luc Mélenchon, não há dúvida: François Hollande não é nem mesmo socialdemocrata –o que já seria uma infâmia aos olhos do presidente da Frente de Esquerda-, e tampouco é um "social liberal". Ele é um liberal, uma vez que, em determinados domínios, esse chefe de Estado que o desespera "é de direita". Sem se demorar sobre o fato de Hollande ter negado "se assumir" como socialdemocrata, François Bayrou, o presidente do MoDem, considerou que ele havia afirmado uma "linha reformista", "a única possível para a nação".
E Hollande seria um socialdemocrata não assumido ou mascarado? Diferentemente da maioria parlamentar, que está longe de seguir essa linha, Jean-Marc Ayrault não hesita, como Pierre Mauroy antes dele, em alegar que pertence à socialdemocracia. No governo, diversos ministros -de Michel Sapin a Marisol Touraine, passando por Vincent Peillon ou Jean-Yves Le Drian– podem ser classificados nessa esfera, sem esquecer de Manuel Valls que, por considerar que a própria palavra "socialismo" se "apagou", sonhava em rebatizar o PS...
Mas a "fortaleza" de Bercy, o ministério das Finanças, ilustra esse mosaico de diferenças, ou até de antagonismos, dentro do governo. Em seu livro "Défaite interdite" ("Derrota proibida", Ed. Flammarion, 2011), Pierre Moscovici, que na época não descartava se candidatar à eleição presidencial caso Dominique Strauss-Kahn desistisse, conjurava o PS a "enfim fazer a escolha de uma socialdemocracia do século 21, moderna, ambientalista e europeia". Para o futuro ministro da Economia, era preciso então que o PS "finalmente fosse ele mesmo, que assumisse sua identidade socialdemocrata sem temor nem nostalgia, que ele se libertasse de seu 'superego marxista', sem renegar qualquer herança de Marx. Para ter sucesso, não há outro caminho além do reformismo, ambicioso e contínuo."
"meio de ir além da socialdemocracia sem renegá-la, incluindo no sistema econômico a sociedade inteira". "Será preciso retirar o velho ranço incrustado em nossas cabeças há décadas, que contaminou até o pensamento mais progressista. São nossos velhos sapatos, com os quais tanto caminhamos, nossas crenças obsoletas das quais devemos nos livrar." Entendem o que quero dizer?
Será que Hollande teria voltado a calçar furtivamente os "velhos sapatos" da socialdemocracia? Na França, a questão nem vem ao caso. Nas antigas terras europeias da socialdemocracia –na Alemanha e também no Benelux e na Escandinávia-, laços estreitos foram feitos entre os partidos socialdemocratas e os sindicatos, muitas vezes únicos. Existe também uma cultura da negociação social e da concessão, que permanecem afastadas das especificidades francesas, ainda que Hollande, ao reforçar a democracia social, se esforce nessa direção. Mas o sindicalismo francês, fraco e dividido, muitas vezes briguento, tem inveja de sua independência e não está disposto a servir de muleta para o PS.
Já que não pode ser socialdemocrata, Hollande é reformista. Em 2008, ele adotou uma declaração de princípios que faz do PS "um partido reformista". Em seu livro "Droit d'inventaire" ("Direito ao balanço", Ed. Seuil, 2009), ele observava que "o socialismo dançava conforme a música" e lhe designava a "obrigação" de "repensar regularmente os instrumentos, as políticas, os meios". Mas nos tempos turbulentos que o presidente tem atravessado, em que ele precisa da solidariedade de suas tropas, não é de bom tom se dizer reformista. É melhor ser "socialista".
Tradutor: Lana Lim
Durante sua coletiva de imprensa, na quinta-feira (16), François Hollande negou ter se convertido. "Sou socialista", afirmou o presidente da República. "Preciso dizer socialdemocrata? Seria melhor ser socialdemocrata? Por acaso dirigi durante anos o Partido Socialista, não o chamei de Partido Socialdemocrata". "Sou um socialista", ele proclamou resolutamente, "que quer prosperidade para a França". Mas quando um presidente socialista se exprime como um gestor socialdemocrata que quer acabar com o endividamento de seu país e vencer a briga da competitividade, a dúvida permanece.
Para Jean-Luc Mélenchon, não há dúvida: François Hollande não é nem mesmo socialdemocrata –o que já seria uma infâmia aos olhos do presidente da Frente de Esquerda-, e tampouco é um "social liberal". Ele é um liberal, uma vez que, em determinados domínios, esse chefe de Estado que o desespera "é de direita". Sem se demorar sobre o fato de Hollande ter negado "se assumir" como socialdemocrata, François Bayrou, o presidente do MoDem, considerou que ele havia afirmado uma "linha reformista", "a única possível para a nação".
E Hollande seria um socialdemocrata não assumido ou mascarado? Diferentemente da maioria parlamentar, que está longe de seguir essa linha, Jean-Marc Ayrault não hesita, como Pierre Mauroy antes dele, em alegar que pertence à socialdemocracia. No governo, diversos ministros -de Michel Sapin a Marisol Touraine, passando por Vincent Peillon ou Jean-Yves Le Drian– podem ser classificados nessa esfera, sem esquecer de Manuel Valls que, por considerar que a própria palavra "socialismo" se "apagou", sonhava em rebatizar o PS...
Mas a "fortaleza" de Bercy, o ministério das Finanças, ilustra esse mosaico de diferenças, ou até de antagonismos, dentro do governo. Em seu livro "Défaite interdite" ("Derrota proibida", Ed. Flammarion, 2011), Pierre Moscovici, que na época não descartava se candidatar à eleição presidencial caso Dominique Strauss-Kahn desistisse, conjurava o PS a "enfim fazer a escolha de uma socialdemocracia do século 21, moderna, ambientalista e europeia". Para o futuro ministro da Economia, era preciso então que o PS "finalmente fosse ele mesmo, que assumisse sua identidade socialdemocrata sem temor nem nostalgia, que ele se libertasse de seu 'superego marxista', sem renegar qualquer herança de Marx. Para ter sucesso, não há outro caminho além do reformismo, ambicioso e contínuo."
"Sapatos velhos"
Já Arnaud Montebourg afirmava em alto e bom som, ao anunciar sua candidatura ao Palácio do Eliseu, que os "remédios administrativos da socialdemocracia, que podem ter funcionado no passado, estão ultrapassados". O futuro ministro da Indústria, que dizia ter "enfrentado durante dez anos o imobilismo de um partido que se agarrava às relíquias de um tempo passado", defendia em seu livro "Des idées et des rêves" ("Ideias e sonhos", Ed. Flammarion, 2010), o "capitalismo cooperativo" como"meio de ir além da socialdemocracia sem renegá-la, incluindo no sistema econômico a sociedade inteira". "Será preciso retirar o velho ranço incrustado em nossas cabeças há décadas, que contaminou até o pensamento mais progressista. São nossos velhos sapatos, com os quais tanto caminhamos, nossas crenças obsoletas das quais devemos nos livrar." Entendem o que quero dizer?
Será que Hollande teria voltado a calçar furtivamente os "velhos sapatos" da socialdemocracia? Na França, a questão nem vem ao caso. Nas antigas terras europeias da socialdemocracia –na Alemanha e também no Benelux e na Escandinávia-, laços estreitos foram feitos entre os partidos socialdemocratas e os sindicatos, muitas vezes únicos. Existe também uma cultura da negociação social e da concessão, que permanecem afastadas das especificidades francesas, ainda que Hollande, ao reforçar a democracia social, se esforce nessa direção. Mas o sindicalismo francês, fraco e dividido, muitas vezes briguento, tem inveja de sua independência e não está disposto a servir de muleta para o PS.
Já que não pode ser socialdemocrata, Hollande é reformista. Em 2008, ele adotou uma declaração de princípios que faz do PS "um partido reformista". Em seu livro "Droit d'inventaire" ("Direito ao balanço", Ed. Seuil, 2009), ele observava que "o socialismo dançava conforme a música" e lhe designava a "obrigação" de "repensar regularmente os instrumentos, as políticas, os meios". Mas nos tempos turbulentos que o presidente tem atravessado, em que ele precisa da solidariedade de suas tropas, não é de bom tom se dizer reformista. É melhor ser "socialista".
Tradutor: Lana Lim
Nenhum comentário:
Postar um comentário