quarta-feira, 1 de maio de 2013

François Hollande enfrenta críticas da própria esquerda francesa
Arnaud Viviant* - Le Monde
Patrick Kovarik/AFP
 O presidente francês, François Hollande, fala durante coletiva de imprensa no Palácio do Eliseu (sede do governo francês), em Paris (França)
O presidente francês, François Hollande, fala durante coletiva de imprensa no Palácio do Eliseu (sede do governo francês), em Paris (França)
Tentar definir o hollandismo é meio como querer responder à grande questão alquímica: quando o sangue vira chouriço? É verdade que para o sarkozysmo isso aconteceu muito rápido. Para uns, o sarkozysmo era um bonapartismo moderno; para outros, um thatcherismo moderado, um blairismo à moda francesa ou um gaullo-chiraquismo de inspiração claramente jacobina, se não os três coagulados. Com essa superioridade que os cães vivos têm sobre os leões mortos, dirão simplesmente que o sarkozysmo só foi mais um populismo.
"Ceticismo benevolente e inquieto"
De qualquer forma, a doutrina do ex-presidente da República tem sua página na Wikipédia.; o hollandismo ainda não, apesar do cientista político e economista Emmanuel Todd. Em uma entrevista publicada um mês antes das eleições presidenciais de 2012, foi ele quem cunhou o neologismo, ao prognosticar o advento de um "hollandismo revolucionário". Hoje, a expressão intriga. Hollandismo revolucionário: não parece uma forma rara e risível de oxímoro?
Uma amiga minha costuma dizer: "Hollandismo? Fácil. É um ceticismo benevolente e inquieto." Bonito. Em todo caso, é mais do que um bonapartismo de gravata torta, mais do que um molenguismo, mais do que um socialismo da oferta ou do que um papandreouismo, que, nos últimos tempos, vem sendo esmagado como um marshmallow rosa na boca de Jean-Luc Mélenchon.
No entanto, a intervenção solitária no Mali não parece com um impulso sarkozysta? E se o hollandismo fosse isso, também? Um sarkozysmo intermitente, um sarkozysmo subterrâneo no qual se pinçaria dependendo das circunstâncias, assim como em uma jazida de gás de xisto?
Um liberalismo de baixo consumo
Parece mais razoável ainda não acreditar no hollandismo. Como por encanto, François Hollande não tem mais sido visto como socialista nem segundo seus amigos, nem segundo seus inimigos, mas como socialdemocrata. Com seu ar importado, seus contornos de Floresta Negra, seus brilhos de fiordes, essa palavra se tornou o verdadeiro vetor das mais recentes rodas de conversa. Você fica bravo ou não dependendo de se você é poderoso ou miserável.
E o liberalismo? A bem da verdade, o liberalismo parece, tanto para o presidente como para os membros de seu governo, tão natural quanto o ar que respiram. No máximo precisam de tempos em tempos, para agradar a alguns ecologistas com quem fazem alianças, se preocupar com seu grau de poluição. Da mesma forma que colocamos lâmpadas de baixo consumo que produzem uma luz suja e deprimente, instalam um liberalismo de baixo consumo que será apelidado de "crise da dívida". Assim, todos os despoluentes do liberalismo ficam contentes. Depois só terão de nomear um deles, não o mais malvado, "enviado especial do presidente da República para a proteção do planeta", uma espécie de Superhomem volátil, com um escritório no Eliseu e sem salário, e pronto. Saem o liberalismo, o socialismo, o hollandismo. Todos os "ismos".
No lugar entram as "ões": lei da programação, inflação, inflexão, comissão. Nenhum projeto de lei sem sua comissão prévia. Esta tem o gosto e a cor da sociedade civil e da democracia direta, mas não é nem a sociedade civil, nem a democracia direta. É uma comissão.
Sim, talvez esteja em andamento uma hollandização da França. E o que seria a hollandização? Seria um Hollande sem o hollandismo: é o homem. É o estilo. Aparentemente não entendemos muito bem a célebre anáfora "Eu, presidente da República", pedaço de bravura mitômana que levou "Sarkô" a nocaute.
No entanto, seria preciso voltar a ouvir o que dizia essa anáfora, essa figura de estilo enorme evocada diversas vezes, como se fosse uma montanha mágica, contra as pretensões de seu adversário. Ela manifestava ambição. Como não confiar mais nela?
*Escritor e redator-chefe da revista "Charles".
Tradutor: Lana Lim

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