O Globo
Na sessão de quarta-feira passada, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados deu a um dos projetos examinados — que trata da união civil de pessoas do mesmo sexo — um insólito encaminhamento: propôs convocar os brasileiros a se manifestar em plebiscito.
Um pouco mais atrás, no auge das manifestações populares que cobravam mudanças generalizadas no país, a presidente Dilma Rousseff embrulhou na mesma receita sua resposta ao ronco das ruas, ao apresentar em cadeia nacional de rádio e televisão proposta de minirreforma política na qual o principal ingrediente era uma consulta plebiscitária (de resto, sobre temas que interessavam aos atuais condôminos do Palácio do Planalto e passavam ao largo de soluções realistas para os principais problemas mencionados nos protestos).
Não são procedimentos isolados, mas uma perigosa indicação de que correntes poderosas dentro do Legislativo e do Executivo brasileiros se deixaram contagiar por princípios da chamada “democracia plebiscitária” como opção do exercício de poder.
No Brasil, com as instituições fortalecidas pelo exercício de uma democracia que já se provou imune a aventuras, a ideia de plebiscitar temas tópicos ainda não passa de tentativa espasmódica de determinados setores.
Mas é preciso manter acesa a luz de alerta contra tais iniciativas, especialmente num momento em que o país reclama, sob consenso — inclusive nas ruas —, o esforço de uma reforma política. Nessas horas, costuma ser grande a tentação pelo aventureirismo.
O termo “democracia plebiscitária” contém um erro de princípio: a democracia é um valor absoluto, que se mede não por adjetivos, mas pelo respeito a princípios universalmente aceitos como inerentes a esse sistema, como garantia dos direitos humanos, pluralismo, respeito a minorias, alternância de poder etc.
Desde o fim do ciclo militar iniciado em 1964, o Brasil tem dado provas suficientes de maturidade institucional no trato de questões sensíveis, do que são exemplos o movimento pelo impeachment de Collor e o julgamento do mensalão do PT.
Foram momentos nos quais restou provado que o pacto social balizado pela Constituição de 1988 contém dispositivos suficientes contra demandas exóticas no exercício do poder. Sem dúvida, é preciso aperfeiçoar os mecanismos institucionais, mas no âmbito de uma reforma política discutida e aprovada nas instâncias apropriadas, e que leve o país a reformular, por exemplo, um sistema “convidativo à corrupção”, como sublinhou o ministro do STF Luís Roberto Barroso, durante o julgamento do mensalão.
Nenhum comentário:
Postar um comentário