Uma história de amor, impostos e corrupção no Brasil
Simon Romero - NYT
Havia caixas de charutos cubanos, que custam cerca de US$ 500 cada
(aproximadamente R$ 1.000) em uma loja na Vila Nova Conceição, um dos
bairros mais exclusivos de São Paulo, e as garrafas de US$ 2.260 de Vega
Sicilia Único, um lendário tinto espanhol. Tinha também um Porsche
Cayenne, passeios de lancha para ilhas tropicais, saraus a noite toda
com acompanhantes de alto nível. O que era tudo isso?
O estilo de vida pouco provável de um auditor fiscal brasileiro.
Em um dos escândalos de corrupção mais picantes a cativar o Brasil em
anos, o governo municipal de São Paulo, a maior cidade do país, está
enfrentando revelações de um esquema em que, segundo os investigadores,
um grupo de auditores fiscais permitiu que empresas de construção
evadissem mais de US$ 200 milhões em impostos em troca de subornos.
"Sempre tivemos jantares maravilhosos, viagens excelentes de avião
particular para Angra dos Reis", disse Vanessa Alcântara, 27,
ex-companheira de um dos auditores acusados de aceitar propinas, em uma
entrevista à televisão, referindo-se à cidade à beira-mar entre o Rio de
Janeiro e São Paulo, que é um playground da elite do Brasil.
Os detalhes excitantes do escândalo estão emergindo como um
desdobramento de uma batalha de custódia entre Alcântara e Luis
Alexandre Cardoso de Magalhães, 41, um burocrata de baixo escalão de São
Paulo. Os brasileiros estão absorvendo suas confissões e acusações
mútuas, televisionadas nacionalmente, em um caso que mostra como a
corrupção política permanece enraizada apesar dos novos esforços para
enviar funcionários corruptos para a cadeia.
Até agora, o escândalo danificou a imagem do atual prefeito de São
Paulo, Fernando Haddad, e de seu antecessor, Gilberto Kassab. Os
investigadores dizem que a maioria dos subornos a Magalhães e seus
colegas foram pagos pelas construtoras durante os seis anos o mandato de
Kassab, de 2006 a 2012, para conseguir a aprovação de projetos
imobiliários.
Interceptações de telefonemas de Magalhães sugerem que ele conheceu
Alcântara em 2011 na casa noturna paulista Bamboa, frequentada por
prostitutas. Alcântara nega o relato, repetido por Magalhães no final de
semana na rede Globo de televisão, e alega que eles se conheceram
quando ela tentou vender-lhe um plano de telefone celular.
Mas quando se trata da vida luxuosa de ganhos ilícitos, o casal
separado parece concordar com um monte de coisas, oferecendo um
vislumbre notável na maneira como funcionários corruptos gastam o
dinheiro amealhado.
Magalhães, que optou por cooperar com os investigadores depois de sua
prisão, em outubro, descreveu como as empreiteiras entregavam
semanalmente em seu gabinete sacos de dinheiro, alguns contendo cerca de
US$ 30 mil em reais. O dinheiro era dividido entre quatro funcionários
do município, disse ele, que conta como queimava sua partilha, gastando
mais de US$ 4.500 por noite com prostitutas.
"Eu gastava porque o dinheiro entrava", disse ele. "Eu queria viver".
Em interceptações telefônicas e entrevistas em jornais, Alcântara disse
que ela e Magalhães, que tiveram um filho juntos, contavam o dinheiro
em sua sala de estar e que chegaram a encontrar mais de US$ 180 mil em
suas mãos. Os promotores estimam a sua fortuna em US$ 8 milhões, valor
difícil de conciliar com seu salário anual de cerca de US$ 82 mil.
Alcântara disse que usou parte do dinheiro para decorar seu
apartamento, a um custo de US$ 50 mil, e os jornais locais contam que
esbanjavam em suítes de US$ 2.200 por noite no Unique, um hotel de
designer, e refeições em churrascarias embaladas com garrafas de
Charmes-Chambertin Grand Cru, um vinho francês cobiçado de US$ 380.
A vida de luxo aparentemente terminou quando Alcântara ficou furiosa
com o que considerou uma pensão mensal reduzida oferecida por Magalhães
quando se separaram, levando-a a denunciá-lo aos promotores.
Como acontece frequentemente nos escândalos de corrupção no Brasil, é possível que surjam celebridades da intriga.
Uma aspirante a esse status é Nagila Coelho, 38, personal trainer que
hoje é companheira romântica de Magalhães. Ela está planejando lançar
sua linha própria de biquínis, de acordo com uma reportagem do jornal
brasileiro "Folha de São Paulo". Alcântara, por sua vez, está ponderando
uma incursão em outro reino: na política.
Ela disse que ainda não tinha se filiado a nenhum partido, mas que já
tem um lema: "Ser ladrão é fácil, eu vou ser honesta em meio a todos os
ladrões".
Tradução: Deborah Weinberg
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