Luta por privilégios
Merval Pereira - O Globo
Quanto mais se debatem dentro da prisão, em busca de
privilégios que já são evidentes no dia a dia da cadeia, Dirceu e
Genoino vão produzindo fatos que apenas aumentam a visibilidade de suas
condenações e expõem à opinião pública a tentativa de desmoralizar a
Justiça e fugir de suas responsabilidades penais.
O caso que parecia
mais simples, e acabou se transformando em uma complicação para o
próprio condenado e também para o ministro Joaquim Barbosa é o de
Genoino, que alega doença grave para pedir prisão domiciliar. O petista
fez uma cirurgia em julho e colocou uma prótese na aorta, procedimento
sem dúvida arriscado, mas que, ao que tudo indica, teve êxito absoluto.
Parentes
e amigos chegaram a falar em “risco de morte” se permanecesse na
Papuda, mas duas juntas médicas deram pareceres contrários à necessidade
da prisão domiciliar. Primeiro uma indicada pela Universidade de
Brasília a pedido do presidente do Supremo, ministro Joaquim Barbosa,
definiu que seu caso não era para prisão domiciliar.
Em seguida,
outra junta médica, esta da Câmara dos Deputados, deu o mesmo
diagnóstico. Os médicos da UNB concluíram que Genoino apresenta
“excelente condição clínica atual, sem expectativa em qualquer prazo
futuro de eventual insucesso cirúrgico ou complicação”. O petista é
“portador de cardiopatia que não se caracteriza como grave”, o que
permite que ele seja tratado normalmente no sistema prisional.
Os
blogs chapa-branca, muitos financiados pelo governo petista, tentaram,
como sempre fazem, desacreditar os médicos brasilienses, chegando ao
cúmulo de atribuírem o laudo a tendências políticas antipetistas. A
nomeação de uma junta distinta pela Câmara chegou a entusiasmar os
apoiadores do PT, que viam na sua escolha uma posição independente dos
deputados em relação a Joaquim Barbosa.
Mas o laudo médico da Junta
designada pela Câmara também concluiu que o deputado licenciado José
Genoino não é portador de cardiopatia grave. O petista queria antecipar
sua aposentadoria por invalidez para escapar da abertura de um processo
de cassação, mas os médicos disseram que até o momento não é possível
atestar a sua incapacidade definitiva.
Eles prorrogaram a licença
médica por mais 90 dias e disseram que queriam “evitar o pior, rotular
uma pessoa como inválida, que não pode trabalhar. Nessa doença há grande
chance de melhora”. O que para um cidadão comum seria um laudo
bem-vindo, para Genoino é um empecilho a que se aposente antecipadamente
e cumpra a prisão em regime domiciliar.
O caso de José Dirceu é
mais patético. Depois de tentar reviver na prisão os tempos heroicos de
preso político, orientando os companheiros de cela nas discussões
políticas e dando conselhos de como se comportar, acabou sendo
contratado para trabalhar de gerente num hotel de Brasília.
O salário
de R$ 20 mil, embora risível diante dos ganhos com sua consultoria,
mesmo assim colocam Dirceu em posição de elite, ainda mais se comparado
com o salário em torno de R$ 2 mil dos companheiros de trabalho. O
proprietário do hotel, empresário Paulo Masci de Abreu, é também dono de
uma empresa de comunicação que possui várias rádios no Estado de São
Paulo na rede CBS (Comunicações Brasil Sat).
Há informações de que a
relação com Dirceu vem do tempo em que o ex-ministro trabalhava com
consultoria e teria ajudado o empresário a negociar com o governo
concessões de mídia, entre as quais a da ex-TV Excelsior, que dependeria
de uma aprovação da presidente Dilma
Embora, como preso em regime
semi-aberto, Dirceu tivesse que trabalhar, segundo o artigo 35 do Código
Penal “durante o período diurno, em colônia agrícola, industrial ou
estabelecimento similar”, o “trabalho externo é admissível”. Um
privilégio que poucos conseguem.
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