Aliança para o atraso
O Estado de S.Paulo
O Canadá está "ansioso" para ampliar o comércio com o
Brasil, conforme disse o ministro das Relações Exteriores canadense,
John Baird. Mas Baird é realista: ele sabe que o Brasil deixou-se
amarrar ao atraso do Mercosul, cada vez mais dominado pelo protecionismo
argentino e contaminado pela ideologia bolivariana. Assim, o Canadá
soma-se a uma já extensa lista de países e blocos que tentam e não
conseguem fazer negócios com o Mercosul e, por tabela, com o Brasil. O
resultado disso é o isolamento brasileiro no momento em que as potências
econômicas dinamizam o comércio internacional com importantes acordos
bilaterais mundo afora.
A ficção em que o Mercosul foi transformado nos últimos tempos
prejudica em especial o Brasil, que nada ganha com a transformação de um
bloco econômico e de integração regional em um veículo político, por
meio do qual se exercita a hostilidade ao livre-comércio e ao chamado
"imperialismo americano". É somente a benevolência brasileira, aliás,
que sustenta o Mercosul, cuja relevância no comércio mundial decresce na
proporção em que aumentam as barreiras impostas principalmente pela
Argentina.
Conforme o jornal Valor (12/11), o chanceler canadense, no limite da
polidez diplomática, disse que é "difícil, muito difícil" chegar a um
acordo com o Mercosul, mas "não pelo Brasil" e, sim, "por causa de dois
ou três países" - uma referência óbvia à Argentina e à Venezuela.
A lista de obstáculos deverá crescer, pois Equador e Bolívia estão
prestes a incorporar-se ao Mercosul, o que deve acentuar ainda mais a
indisposição do bloco em facilitar transações comerciais e aproveitar os
negócios promissores que se oferecem neste momento.
A dificuldade do Canadá na negociação com o Mercosul é a mesma
enfrentada pela União Europeia para fechar acordo semelhante: a
resistência argentina. Essa situação exaspera parceiros como o Uruguai,
cujo presidente, José Mujica, recentemente disse que a "política
insular" praticada pela presidente Cristina Kirchner está "arruinando o
Mercosul".
Depois de fazer as contas, o Uruguai percebeu já há algum tempo que
permanecer atado aos compromissos do Mercosul e aos humores do
kirchnerismo lhe seria prejudicial. Por essa razão, o país - assim como
outro sócio-fundador do Mercosul, o Paraguai - movimenta-se para
integrar acordos internacionais fora do âmbito do bloco sul-americano.
Uruguai e Paraguai, por exemplo, estão participando da costura do
acordo sobre comércio internacional de serviços, lançado em 2012 pelos
Estados Unidos. Também integram, como observadores, a Aliança do
Pacífico, o promissor bloco formado por Chile, Peru, Colômbia e México.
Enquanto isso, no Brasil, a indústria passou a defender um acordo de
livre-comércio com os Estados Unidos, pois o Mercosul, dizem os
empresários, está isolando o País.
Na outra ponta, em que brilham o petismo, o kirchnerismo e o
bolivarianismo, forma-se uma aliança para o atraso. Impera nesse
concerto a ideia de que o Mercosul deve servir também a propósitos
políticos e ideológicos. Esse tom foi dado pelo presidente da Venezuela,
Nicolás Maduro, ao defender a ampliação do bloco para que nele caibam
todos os países alinhados ao bolivarianismo.
"O novo Mercosul está em fase de construção", disse Maduro, que ocupa
a presidência temporária do grupo. "Assim teremos um Mercosul integral,
que nos leve à pobreza zero e à cultura integrada de nossos países e
avance rumo à máxima felicidade de nossos povos." É, segundo suas
palavras, a "revisão da doutrina" do bloco. Basta observar a brutal
crise da Venezuela para dimensionar o potencial dessa revisão.
Assim, não se pode condenar o Uruguai e o Paraguai, por buscarem seus
interesses em outra freguesia, nem o Canadá, por pensar na Aliança para
o Pacífico, e não no Mercosul, quando se trata de investir na América
Latina. Não é à toa que, em suas duas décadas de existência, o bloco só
tenha conseguido fazer acordos comerciais com Israel, Palestina e Egito.
E toda vez que se fala em "relançar" o Mercosul, como sugere agora a
Venezuela, é sempre para pior.
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