sábado, 30 de novembro de 2013

Para PT, atual sistema eleitoral "favorece a corrupção"
Juan Arias - El Pais
23.nov.2013 - Luiz Tito/Agência A Tarde/Estadão Conteúdo
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva 
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva
O PT (Partido dos Trabalhadores), que há 12 anos governa o Brasil com êxitos que nem a oposição nega, aproveitará a abertura de seu quinto Congresso Nacional, que ocorrerá em Brasília no mês que vem, para buscar uma explicação para o aumento da corrupção política no país, com a qual ele mesmo acabou se contagiando.
O PT vai realizar pela primeira vez um Congresso Nacional com alguns de seus líderes históricos, fundadores e ex-presidentes na prisão, condenados por corrupção no escândalo do "mensalão".
Em 2003, o PT, que era o maior partido de esquerda da América Latina, nascido das cinzas da ditadura militar, chegou ao poder pela mão de seu fundador, o líder sindicalista histórico Lula.
O partido chegou empunhando a bandeira da ética, contra a corrupção que tanto havia fustigado na oposição, como esperança de renovação, disposto a fazer o país dar um salto tanto em seu aspecto econômico como no social, diminuindo o abismo das desigualdades, atávicas em um país que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso definia como "rico, mas desigual".
Depois de 12 anos de governo do PT, com suas luzes e sombras, seus dirigentes atuais vão lembrar no próximo congresso que hoje, depois deles, o Brasil é "mais rico e menos desigual". Seus responsáveis sabem, entretanto, que o congresso deve responder ao fato de que justamente o partido tenha participado da corrupção que eles haviam decidido combater.
E individualizaram a raiz dessa corrupção no atual "sistema político-eleitoral", do qual o PT também se sente vítima, segundo um documento básico preparado para o congresso por Marco Aurélio Garcia, assessor especial da Presidência da República para Assuntos Internacionais.
Segundo esse documento, o PT se sente "prisioneiro de um sistema eleitoral que favorece a corrupção" e que estaria na base do desvio ético que deu origem ao mensalão, e agora defende uma profunda reforma política.
O empreendimento é árduo, e o ex-presidente Lula, em seus oito anos de governo, nunca conseguiu realizá-lo. Havia inclusive chegado a pensar em criar uma assembleia constituinte exclusiva para a reforma política. Mas também não o conseguiu.
Quando explodiram os protestos de rua, em junho, a primeira coisa que fez a presidente Dilma Rousseff para responder aos mesmos foi oferecer um plebiscito constituinte para a reforma política, que teve de retirar ao ser considerado inconstitucional.
Essa reforma política, com efeito, para ser eficaz, não pode se limitar a uma simples reforma "eleitoral", que acabaria fortalecendo as dinâmicas atuais dos partidos. Deveria chegar à raiz.
Uma das anomalias do atual sistema político brasileiro é o fato de ser um sistema presidencialista, que teoricamente outorga grandes poderes, sobretudo de veto, mas no qual é impossível governar sem uma ampla coalizão dos mais de 30 partidos, na maioria sem ideologia própria, nascidos para se deixarem alugar pelo Executivo da vez.
Ao mesmo tempo, por não existir um primeiro-ministro que possa ser destituído em caso de crise grave, o sistema político tampouco prevê uma troca fácil do Executivo, já que a remoção de um presidente da República sempre representa um drama nacional.
Tudo isso aguça a burocratização da política, que acaba contagiando inclusive partidos nascidos como formações políticas de massas, dinâmicas, distantes das estruturas dos partidos tradicionais. É o caso do PT, que neste quinto congresso fará uma análise crítica por também se ter deixado arrastar pelo pecado da burocratização, com todas as tentações que isso representa.
O documento reconhece que o PT "não conseguiu infundir um novo ritmo à política", o que equivale a dizer que não conseguiu realizar uma das principais reformas previstas quando chegou ao poder.
O ex-presidente Lula, líder máximo do PT, já havia feito há algumas semanas uma autocrítica parecida. Reconheceu que o partido estava precisando de uma "grande reforma" e criticou o fato de que depois de tantos anos no poder tivesse perdido contato com os movimentos sociais, que sempre foram sua verdadeira força. E exortou os jovens militantes a recuperar o "gosto pela política" e até "pela rua".
O problema é que os jovens, incluindo os do PT, não querem mais um sistema político como o atual, que, como indica o documento em discussão, leva à corrupção. Querem partidos mais próximos das pessoas, mais livres e com maior diálogo com elas.
O problema de fundo é que o atual sistema político brasileiro foi acumulando uma série de privilégios e poderes, e deveriam ser os políticos que renunciassem a eles por meio de uma reforma política. Serão capazes de fazê-lo?
O ex-presidente da República José Sarney, aliado do governo, com 50 anos de vida ativa no Congresso, chegou a defender para o Brasil uma reforma política de fundo, com a passagem do atual regime presidencial para um regime parlamentar com um primeiro-ministro.
Ao mesmo tempo, qualquer outra maneira de fazer essa reforma que não passe pela política acabaria resvalando em aventuras antidemocráticas ou golpistas, como já advertia Lula, que se viu impotente para realizá-la.
E uma das grandes conquistas deste país é que já tem consolidadas instituições democráticas com independência de poderes, as únicas capazes de continuar gerando riqueza e diminuindo as desigualdades sociais.
Resta, portanto, a única via possível: que a reforma seja feita pelos políticos, mas com espírito "republicano". Quer dizer, pensando mais no interesse do país do que nos privilégios atuais de seus próprios partidos.
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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