sábado, 30 de novembro de 2013

Irã, Síria, Obama e a base da nova diplomacia 
GILLES LAPOUGE - O Estado de S.Paulo 
O sistema geopolítico que governa o mundo entrou há alguns meses em uma nova era. Uma formidável comoção embaralhou as cartas de uma ponta a outra do planeta. Ela abalou posições que se julgavam consolidadas e inamovíveis na Europa (Ucrânia, Rússia), na China, mas, sobretudo, no Oriente Médio.
Não é correto pensar que esse imenso alvoroço deveu-se exclusivamente à vontade de um homem ou de uma potência. Muitos indícios sugerem, contudo, que o presidente americano, Barack Obama, foi um dos atores dessa metamorfose.
Duas ações decisivas tiveram lugar nos últimos meses. A primeira é a fadiga da insurreição dos "rebeldes" na Síria, cada vez mais isolados pelas tropas de Bashar Assad que a cada dia marcam novos pontos. A segunda, a assinatura do acordo em Genebra entre o grupo P5+1 (os cinco membros permanentes do conselho de Segurança da ONU mais a Alemanha) e o Irã.
Nos dois casos, Obama esteve nas manobras. Relembrando: há poucos meses, os EUA estavam resolvidos a punir o tirano Assad, fornecendo mísseis Tomahawk aos insurgentes com esse fim. Obama chegou a arrastar a França para a ideia dessa cruzada anti-Assad e o secretário de Estado John Kerry fez o papel de incendiário.
De repente, quando explodiu a crise sobre as armas químicas usadas na Síria, tudo mudou: a questão não era mais a deposição de Assad. Washington acertou a questão dos arsenais químicos sírios em estreita cooperação com o presidente russo, Vladimir Putin, sem falar com os europeus ocidentais, que ficaram decepcionados (François Hollande em especial).
A grande revolta democrática da rua síria, tão enaltecida nos dois últimos anos por todos os poetas líricos da Europa e da América, saiu das primeiras páginas. A mudança americana sobre a síria é explicável. A rebelião síria está cada vez mais contaminada por jihadistas cujo fanatismo e obscurantismo são de assustar. Mas parece haver uma outra razão. E ela deve ser buscada na outra grande virada diplomática: o acordo assinado em Genebra com o Irã. Este acerto era uma das obsessões de Obama desde sua primeira eleição.
Não foi um acaso que as duas surpresas diplomáticas deste ano se produziram quase ao mesmo momento. De fato, o acordo com o Irã não poderia ter sido assinado se, ao mesmo tempo, os EUA tivessem lançado ataques aéreos contra as posições de Assad na Síria. Nesse caso, Teerã, que apoia o regime sírio, teria imediatamente rompido a discussão com Obama.
Nesses dois âmbitos, observa-se um outro ponto em comum: o estilo solitário e quase arrogante com que Obama conduziu o caso. Na Síria, ele mudou subitamente de curso abandonando a ideia de ataques contra Assad e resolvendo o problema das armas químicas apenas com Putin. No caso do Irã, ele fez os aliados europeus acreditarem que eles estavam juntos na empreitada, mas, uma vez assinado o acordo de Genebra, Washington deixou filtrar a verdade: as discussões entre Teerã e Washington sobre o arsenal iraniano vinham ocorrendo havia meses sem que Obama julgasse útil informar outros países a esse respeito. 
TRADUÇÃO DE CELSO PACIORNIK

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