Reinaldo Azevedo - VEJA
José
Eduardo Cardozo tem de renunciar ao Ministério da Justiça. Se não o
fizer, a presidente Dilma Rousseff tem de demiti-lo. Se nem uma coisa
nem outra acontecerem, então é justo supor que um eventual segundo
mandato de Dilma Rousseff pode levar o Brasil a uma kirchnerização à
moda da casa. Não é a primeira vez que o ministro da Justiça dá mostras
de que se ocupa menos das necessidades do país do que das de seu
partido. Desta vez, no entanto, ele foi longe demais. Explico tudo
direitinho.
Como é de
conhecimento de todo mundo, há uma investigação em curso no Cade
(Conselho Administrativo de Defesa Econômica) sobre a formação de cartel
para o fornecimento de trens para a CPTM e para o metrô em São Paulo e
no Distrito Federal. De saída, diga-se o óbvio sobre esse caso e
qualquer outro: quem deve, feita a devida apuração e compradas as
culpas, que pague. A única coisa que não vale é corrupto erguer o braço
esquerdo como se fosse herói da resistência.
Se vocês
procurarem nos arquivos, encontrarão todas as estranhezas que eu vinha
apontando nesse caso. Desde o princípio, vazavam informações do Cade —
comandado por um militante do PT chamado Vinicius Carvalho — para a
imprensa dando conta de que executivos da CPTM e do Metrô, com a
anuência do governo de São Paulo, estariam envolvidos com o cartel, mas
esse mesmo governo nem sequer tinha acesso às informações; nem sabia do
que estava sendo acusado. Uma fórmula foi celebrizada pelo noticiário da
TV Globo: a formação de cartel aconteceu “nos governos Mário Covas,
Geraldo Alckmin e José Serra, todos do PSDB”.
A
investigação no Cade nasceu de um acordo de leniência assinado pela
Siemens, cujos termos também são desconhecidos. E qual a justificativa
para o governo de São Paulo não ter acesso às informações? Cinicamente, o
Cade, que é subordinado a Cardozo, alegava “sigilo”. Que sigilo é esse
que se faz de vazamentos? Adiante. Muito bem: o órgão apurava a formação
de cartel, mas não se falava, até então, de corrupção. Um inquérito
também foi aberto pela Polícia Federal.
Um certo Everton Rheinheimer
Na quinta-feira, a coisa mudou de figura. Noticiava o Estadão:
“Em
relatório entregue no dia 17 de abril ao Conselho Administrativo de
Defesa Econômica (Cade), o ex-diretor da Siemens Everton Rheinheimer
afirma dispor de ‘documentos que provam a existência de um forte esquema
de corrupção no Estado de São Paulo durante os governos (Mário) Covas,
(Geraldo) Alckmin e (José) Serra, e que tinha como objetivo principal o
abastecimento do caixa 2 do PSDB e do DEM”. O tal relatório foi anexado ao inquérito da PF.
Na
denúncia, Rheinheimer faz acusações contra quatro secretários do governo
do Estado de São Paulo, três do PSDB – Edson Aparecido (Casa Civil),
Jurandir Fernandes (Transportes Metropolitanos) e José Aníbal (Energia) e
um do DEM, Rodrigo Garcia (Desenvolvimento Econômico). Cita ainda como
próximos ao esquema o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), o
deputado federal Walter Feldman (Rede-PSB) e os deputado estaduais
Arnaldo Jardim (PPS-SP) e Campos Machado (PTB-SP).
As digitais de Cardozo
E o que é que veio à luz nesta sexta, conforme informou Alana Rizzo na Veja.com?
A denúncia do ex-diretor da Siemens não foi entregue ao Cade coisa
nenhuma. Era mentira! Quem a encaminhou à Polícia Federal foi o ministro
da Justiça, José Eduardo Cardozo. Ele próprio confirmou. Disse que o
texto chegou a seu gabinete pelas mãos do deputado estadual licenciado
Simão Pedro, secretário de Serviços de Fernando Haddad na Prefeitura de
São Paulo.
Ocorre
que, no dia 11 de junho, memorando assinado pelo do delegado Braulio
Cezar da Silva Galloni, coordenador-geral de Polícia Fazendária da PF de
Brasília dizia que o relatório havia chegado às suas mãos por
intermédio do Cade.
Operação partidária
O leitor pode estar se perguntando: “Mas
que mal há nisso?” Pois é. A questão é saber quem é e o que queria o
ex-diretor da Siemens. Reportagem do próprio Estadão, da quinta, informa
(em vermelho):
Everton Rheinheimer diz em seu texto que, “com
a ajuda de Simão Pedro, encontrou-se duas vezes com o presidente do
Cade, Vinícius Carvalho, para orientá-lo sobre aspectos importantes do
acordo de leniência a ser assinado entre o órgão e a Siemens”.
O ex-diretor da Siemens revela
ainda sua intenção de obter emprego após a denúncia: “O acordo que
proponho não tem nenhum risco, mas envolve minha indicação para uma
diretoria executiva da Vale no médio prazo”.
O ex-diretor da Siemens pede ajuda “do partido”. “Uma
vez instalado o inquérito pelo Cade, os advogados das empresas terão
acesso aos autos e poderão identificar que eu sou o delator principal. A
pressão deles e de seus mandantes sobre mim será enorme e eu gostaria
de contar com o apoio do partido para poder resistir ao assédio.”
O presidente do Cade foi filiado ao PT por
13 anos e trabalhou na Assembleia para Simão Pedro, atual secretário da
gestão Fernando Haddad em São Paulo e um dos parlamentares que mais
investigaram o cartel de trens. Por omitir essas relações no currículo,
Carvalho sofreu advertência da Comissão de Ética da Presidência da
República.
Em nota divulgada nessa quarta-feira, 20, o
Cade informou que o acordo de leniência não é obra só de um executivo, e
sim de toda a Siemens. A Vale, uma das maiores mineradoras do mundo,
disse que o nome de Rheinheimer não consta de seus quadros.
Retomo
Entendeu, leitor? Desde o começo, o que se
tem é uma operação partidária para fazer uma bomba explodir no governo
de São Paulo. Observem que Vinícius Carvalho é, a um só tempo, chefão do
Cade, mas também aquele que passa instruções sobre como formular a
denúncia. Para voltar à fórmula consagrada pelas reportagem da TV Globo,
o objetivo é pegar “as gestões Covas, Alckmin e Serra, todos do PSDB”.
Tudo isso atende pelo nome de “Operação Alexandre Padilha”, que será
candidato ao governo de São Paulo pelo PT.
“Então
você está negando que tenha havido formação de cartel e safadeza,
Reinaldo?” Eu??? Não mesmo! Reitero: que se apure tudo e, comprovadas as
culpas, cana na turma! Quem defende corrupto em nota oficial é o
Direito Nacional do PT, não eu. Se houver ladrões nessa história, que
vão lá jogar dominó com José Dirceu e Delúbio Soares na Papuda.
INACEITÁVEL É QUE UM MINISTRO DA JUSTIÇA ENTRE NESSA OPERAÇÃO,
ENVOLVENDO-SE, INCLUSIVE, NUMA ESPÉCIE DE LAVAGEM DE DENÚNCIA.
Na origem
Esse troço todo está viciado desde a
origem. O primeiro a pedir investigações sobre formação de cartel foi
justamente Simão Pedro. Vinicius Carvalho, que está no Cade, vejam que
coincidência!, foi seu funcionário na Assembleia Legislativa, condição
que omitiu do seu currículo, pelo que foi advertido pela Comissão de
Ética Pública.
O tal
ex-diretor da Siemens, que se saiba, não entregou um só documento, uma
só prova, uma só evidência de envolvimento dos secretários, nada! A
denúncia nem está assinada. Mais uma vez: eu não estou pondo a mão no
fogo por ninguém. O fato é que uma investigação dessa natureza não pode
ser instrumentalizada a serviço de um partido. NOTA: nesta
sexta, Rheinheimer negou que seja o autor da denúncia.
Há uma
questão escandalosa nessa história toda desde a origem: quer dizer que a
Siemens, que tem negócios bilionários com entes federais, só recorreu a
métodos escusos no estado de São Paulo e no Distrito Federal (antes de
ser governado pelo PT)? Seu acordo de leniência, curiosamente, só atinge
gestões de adversários do petismo.
Politiqueiro
José Eduardo Cardozo atua de forma
dedicada e metódica contra São Paulo. No surto de violência que atingiu o
Estado em 2012, o ministro exerceu um papel lamentável,
desestabilizador, que acabou resultando da queda do secretário de
Segurança Pública. Nos protestos de junho, este senhor fez proselitismo
contra o governo e contra a Polícia Militar. Quando os manifestantes
botaram fogo no Itamaraty, não se ouviu a sua voz. Agora, as digitais do
ministro aparecem nessa história da Siemens — confirmando, de resto, o
que já se sabia. Diz ter encaminhado pessoalmente à Polícia Federal a
denúncia de um sujeito que atua, é visível, como esbirro do PT.
Cardozo
não tem a isenção e a seriedade necessárias para continuar à frente do
Ministério da Justiça. Estados democráticos exercem seu poder de
vigilância, investigação e polícia para manter a ordem e coibir os
faltosos. Estado policial é outra coisa: seleciona alvos e arma
conspiratas para destruir adversários.
Os
cretinos logo gritam: “Ah, não pode investigar tucanos?” Quando há
motivos, pode e deve. Que as investigações tenham curso e que se apure
tudo. Só que o Cade e o Ministério da Justiça não podem atuar como
polícia política do PT. É um absurdo que Carvalho continue a chefiar o
órgão. O Cade se transformou num órgão de chicana partidária, a serviço
da guerrilha eleitoral.
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