Testemunhamos em anos recentes renascimento do Estado-Nação como ator preponderante do mundo
Marcos Troyjo - FSP
Argumento central: conflitos pós-queda do Muro de Berlim seriam engendrados sobretudo por diferenças culturais. Percorremos em 500 anos a trajetória de confrontação entre príncipes, Estados-Nação, ideologias e, finalmente, civilizações.
A teoria do "choque" explicaria a guerra na ex-Iugoslávia, o 11 de Setembro e atentados em Madri (2004) e Londres (2005). Serviu de "fermento" à Guerra ao Terror e incursões dos EUA no Iraque e Afeganistão.
Desferiu duro golpe nos entusiastas da globalização. Demarcou limites ao otimismo de que economia de mercado e democracia representariam objetivos universais. Eclipsou, assim, a tese do "Fim da História", apresentada por Francis Fukuyama em 1989.
Talvez apenas "As Fontes da Conduta Soviética" supere o "Choque" em impacto histórico de um artigo sobre política mundial. Publicado em 1947 também na Foreign Affairs pelo ministro-conselheiro da embaixada dos EUA em Moscou, George Kennan (à época sob o pseudônimo "X"), o texto forneceu substrato intelectual para a doutrina da contenção e o início da Guerra Fria.
Examinar o mundo pela lente do choque civilizacional continua valendo? A própria classificação de Huntington sobre quais seriam as civilizações é bastante controversa (identifica a América Latina, por exemplo, como algo em separado da civilização ocidental).
Ademais, tanto o 11 de Setembro como a Grande Recessão de 2008 parecem ter surtido efeito "regressivo" na escala de Huntington.
Testemunhamos em anos recentes verdadeiro renascimento do Estado-Nação como ator preponderante da cena mundial.
Por pressão de seu público --nacional e interno--, alguns ocidentais como Reino Unido, Espanha e Alemanha mostraram-se mais reticentes a cerrar fileiras em torno da cruzada contra o terror.
Na dimensão geoeconômica, acordos de comércio e investimento em gestação, como a Parceria Transpacífico, congregam atores tão civilizacionalmente distintos quanto Chile, EUA e Coreia do Sul.
E um dos principais temas do noticiário atual, a espionagem de grandes proporções efetivada pelos EUA, volta-se não apenas a "adversários civilizacionais". Prolifera também sobre parceiros de interesses comuns.
É o caso do Brasil (que juntamente com os EUA formam as duas maiores democracias do continente). Do México, parceiro dos EUA no Nafta (Acordo de Livre Comércio da América do Norte). E de sócios dos EUA em alianças de defesa, como França e Alemanha no âmbito da Otan. Todos ampla e sofisticadamente bisbilhotados pelos EUA.
Por mais que nesses 20 anos o paradigma civilizacional tenha oferecido valiosos elementos à interpretação do pós-Guerra Fria, a confluência entre os interesses nacionais de cada país ainda é o principal gerador de cooperação e conflito no tabuleiro global.
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