Criadores de pombos também são vítimas do regime de Bashar al-Assad
Norimitsu Onishi - NYTEm uma passagem de fronteira não demarcada nesta aldeia localizada no sudoeste da Turquia, soldados interrogavam quatro homens sírios que tentavam entrar na Turquia em uma manhã recente. Depois de alguns minutos de discussão acalorada, três deles foram autorizados a entrar.
Pouco depois, enquanto caminhavam por uma estrada de terra exibindo sorrisos largos em seus rostos, os três homens que entraram na Turquia explicaram que o quarto homem, um parente que era um sério colecionador de pombos, assim como muitos homens sírios, recusou-se a abandonar suas aves na fronteira.
"Ele ama seus pombos", disse Ahmed Ahvani, 33, que havia fugido para
Turquia meses antes, mas retornou a sua cidade natal, Jisr al-Shughour,
cenário de combates consideráveis localizado a aproximadamente 25
quilômetros de distância, para trazer dois primos.
Os pombos, segundo Ahvani, não estavam à venda. "Ele os tem há 15 anos", disse Ahvani. "Os soldados disseram que ele não poderia trazer nenhum animal para a Turquia. Então ele disse que iria retornar para a Síria. Ele tem 40 anos e cria pombos desde os 3".
Um dos primos, Ibrahim Annus, 20, disse: "Peça para que ele escolha entre sua esposa e seus pombos – e ele certamente ficará com os pombos".
Os homens gargalharam. Eles disseram ter certeza de que seu parente iria entrar na Turquia por outro local.
Os colecionadores de pombos da Síria, ou hamemati, como são conhecidos, estão entre os mais fervorosos do mundo árabe. Eles não cruzam nem colocam seus pássaros em competições. Eles os trocam e vendem, mas, na maior parte dos casos, eles simplesmente os mantêm como preciosos animais de estimação. Por isso, não é nenhuma surpresa ver que alguns colecionadores têm feito grandes esforços para poder praticar seu hobby no exílio, especialmente porque ninguém espera que a guerra civil da Síria, que já dura dois anos e meio, acabe tão cedo.
Um viveiro colocado em cima de trailer em um campo de refugiados, uma revoada de pombos circulando por cima de um edifício em um bairro onde vivem sírios recém-chegados: esses são os sinais que denunciam os hamemati que residem na Turquia, no Líbano e na Jordânia, países que atualmente abrigam o maior número de refugiados sírios. Mesmo que os colecionadores ainda não tenham conseguido retomar seu hobby, qualquer sírio consegue identificar imediatamente os hamemati locais, que muitas vezes se reúnem e não se cansam de contar suas histórias sobre pombos.
Como a maioria dos refugiados sírios, os hamemati tendem a se opor ao
presidente Bashar Assad. Mas alguns expressam uma oposição mais visceral
ao governo sírio, pois acrescentam os pombos à longa lista de perdas
que eles dizem ter sofrido nas mãos de Assad e suas forças.
"Eles atiram nos pombos e nas pessoas por diversão", disse Taha Yasseen Atra, 29, refugiado em Wadi Khalid, no norte do Líbano. "Eu odeio Bashar com todas as minhas forças".
Em Ar Rastan, no norte da Síria, Atra, hamemati desde os 9 anos, disse ter acumulado cerca de 100 pombos antes da guerra. Mas, como sua casa ficava próxima de uma base militar, seus pombos se tornaram alvos dos atiradores de elite do governo. Ele costumava encontrar seus pombos mortos, um após o outro, sobre seu telhado ou nas ruas dos arredores de sua casa.
Ao deixar a Síria para se refugiar no Líbano com sua esposa e dois filhos, há um ano, sobravam apenas 20 pombos. E ele os libertou.
Seu único consolo é que os parentes, donos da casa onde ele agora está hospedado no Líbano, também são colecionadores de pombos. "Mas é claro que nada é capaz de substituir os pombos que eu tinha na Síria", disse Atra, enquanto sua esposa, que estava a seu lado, esboçava um ligeiro sorriso tolerante.
Khaled al-Sarhan, 28, um de seus parentes libaneses, disse que entendia a dor do hamemati sem pombos.
"Se eu não consigo ver os meus pombos todos os dias, eu não consigo dormir", diz ele.
Os pombos de Al-Sarhan têm atraído refugiados hamemati como Khaled al-Wahibi, 41, que disse ter colecionado pombos durante três décadas em Baba Amr, bairro da cidade de Homs onde foram registrados pesados combates. No ano passado, depois de os soldados destruírem sua casa, ele soltou os pombos sobreviventes de sua coleção e fugiu com sua família para o Líbano.
"Tenho saudades dos meus pombos como se eles fossem meus filhos", disse Al-Wahibi, que encontrou consolo ao visitar os pombos de Al-Sarhan.
Em um campo de refugiados localizado em Kilis, na Turquia, Abdullah al-Noeimi, 30, montou um pombal no topo de seu trailer. Ele perdeu todos os pombos que mantinha em sua casa em Latakia, na Síria, e só quis revelar que "o regime levou os meus pombos".
Depois de subir em uma escada bamba e frágil que ele mesmo confeccionou, Al-Noeimi soltou cerca de 25 pombos de sua gaiola. Os pássaros voaram por cima do local onde ele montou acampamento e todos retornaram para a gaiola. Segundo Al-Noeimi explicou, ele comprou os pombos em Kilis para que eles não voassem para muito longe.
Em Hacipasa, assim como haviam previsto os três homens que tiveram permissão para entrar na Turquia, o parente deles, Mohammed Emir, havia encontrado outro caminho para entrar na Turquia. Ele apareceu no meio da aldeia menos de meia hora depois, carregando uma grande caixa branca contendo oito pombos. Ele estava um pouco ofegante e nervoso devido à descarga de adrenalina provocada por seu desvio forçado pela fronteira.
Tradutor: Cláudia Gonçalves
Os pombos, segundo Ahvani, não estavam à venda. "Ele os tem há 15 anos", disse Ahvani. "Os soldados disseram que ele não poderia trazer nenhum animal para a Turquia. Então ele disse que iria retornar para a Síria. Ele tem 40 anos e cria pombos desde os 3".
Um dos primos, Ibrahim Annus, 20, disse: "Peça para que ele escolha entre sua esposa e seus pombos – e ele certamente ficará com os pombos".
Os homens gargalharam. Eles disseram ter certeza de que seu parente iria entrar na Turquia por outro local.
Os colecionadores de pombos da Síria, ou hamemati, como são conhecidos, estão entre os mais fervorosos do mundo árabe. Eles não cruzam nem colocam seus pássaros em competições. Eles os trocam e vendem, mas, na maior parte dos casos, eles simplesmente os mantêm como preciosos animais de estimação. Por isso, não é nenhuma surpresa ver que alguns colecionadores têm feito grandes esforços para poder praticar seu hobby no exílio, especialmente porque ninguém espera que a guerra civil da Síria, que já dura dois anos e meio, acabe tão cedo.
Um viveiro colocado em cima de trailer em um campo de refugiados, uma revoada de pombos circulando por cima de um edifício em um bairro onde vivem sírios recém-chegados: esses são os sinais que denunciam os hamemati que residem na Turquia, no Líbano e na Jordânia, países que atualmente abrigam o maior número de refugiados sírios. Mesmo que os colecionadores ainda não tenham conseguido retomar seu hobby, qualquer sírio consegue identificar imediatamente os hamemati locais, que muitas vezes se reúnem e não se cansam de contar suas histórias sobre pombos.
"Eles atiram nos pombos e nas pessoas por diversão", disse Taha Yasseen Atra, 29, refugiado em Wadi Khalid, no norte do Líbano. "Eu odeio Bashar com todas as minhas forças".
Em Ar Rastan, no norte da Síria, Atra, hamemati desde os 9 anos, disse ter acumulado cerca de 100 pombos antes da guerra. Mas, como sua casa ficava próxima de uma base militar, seus pombos se tornaram alvos dos atiradores de elite do governo. Ele costumava encontrar seus pombos mortos, um após o outro, sobre seu telhado ou nas ruas dos arredores de sua casa.
Ao deixar a Síria para se refugiar no Líbano com sua esposa e dois filhos, há um ano, sobravam apenas 20 pombos. E ele os libertou.
Seu único consolo é que os parentes, donos da casa onde ele agora está hospedado no Líbano, também são colecionadores de pombos. "Mas é claro que nada é capaz de substituir os pombos que eu tinha na Síria", disse Atra, enquanto sua esposa, que estava a seu lado, esboçava um ligeiro sorriso tolerante.
Khaled al-Sarhan, 28, um de seus parentes libaneses, disse que entendia a dor do hamemati sem pombos.
"Se eu não consigo ver os meus pombos todos os dias, eu não consigo dormir", diz ele.
Os pombos de Al-Sarhan têm atraído refugiados hamemati como Khaled al-Wahibi, 41, que disse ter colecionado pombos durante três décadas em Baba Amr, bairro da cidade de Homs onde foram registrados pesados combates. No ano passado, depois de os soldados destruírem sua casa, ele soltou os pombos sobreviventes de sua coleção e fugiu com sua família para o Líbano.
"Tenho saudades dos meus pombos como se eles fossem meus filhos", disse Al-Wahibi, que encontrou consolo ao visitar os pombos de Al-Sarhan.
Em um campo de refugiados localizado em Kilis, na Turquia, Abdullah al-Noeimi, 30, montou um pombal no topo de seu trailer. Ele perdeu todos os pombos que mantinha em sua casa em Latakia, na Síria, e só quis revelar que "o regime levou os meus pombos".
Depois de subir em uma escada bamba e frágil que ele mesmo confeccionou, Al-Noeimi soltou cerca de 25 pombos de sua gaiola. Os pássaros voaram por cima do local onde ele montou acampamento e todos retornaram para a gaiola. Segundo Al-Noeimi explicou, ele comprou os pombos em Kilis para que eles não voassem para muito longe.
Em Hacipasa, assim como haviam previsto os três homens que tiveram permissão para entrar na Turquia, o parente deles, Mohammed Emir, havia encontrado outro caminho para entrar na Turquia. Ele apareceu no meio da aldeia menos de meia hora depois, carregando uma grande caixa branca contendo oito pombos. Ele estava um pouco ofegante e nervoso devido à descarga de adrenalina provocada por seu desvio forçado pela fronteira.
Tradutor: Cláudia Gonçalves
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